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Justiça torna réus PM e ex-PM acusados da morte do jovem Guilherme

Guilherme Silva Guedes, morto na Vila Clara - Reprodução/ Facebook
Guilherme Silva Guedes, morto na Vila Clara Imagem: Reprodução/ Facebook

Marcelo Oliveira

Do UOL, em São Paulo

21/08/2020 20h13

Resumo da notícia

  • Justiça de SP tornou réus sargento e ex-soldado, ambos da PM
  • Ambos foram acusados de matar e torturar adolescente negro
  • Justiça também decretou a prisão preventiva de ambos
  • Defesa de Adriano alega inocência e diz que ele apresentará um álibi

A Justiça de São Paulo recebeu a denúncia do Ministério Público e tornou réus o sargento da PM Adriano Fernandes de Campos e o ex-PM Gilberto Eric Rodrigues, acusados de assassinar o adolescente negro Guilherme Silva Guedes, 15, em junho deste ano, na zona sul da capital.

O juiz Claudio Juliano Filho, da 1ª Vara do Júri, decretou a prisão preventiva de ambos, solicitada pelo Ministério Público. O sargento Adriano estava preso, temporariamente, desde 17 de junho. O ex-PM Gilberto está foragido desde 2015, quando fugiu do presídio Romão Gomes, da Polícia Militar. Ele estava preso desde 2013, acusado de participar de uma chacina.

A denúncia foi recebida no dia 14 de agosto, mesmo dia em que o MP denunciou e pediu a prisão preventiva dos acusados. O processo tramita em segredo de Justiça, mas o UOL obteve a confirmação com o MP e a defesa do réu Adriano.

Defesa diz que sargento tem álibi

O advogado Mauro Ribas, defensor de Adriano, afirma que seu cliente é inocente. "Ele não cometeu esse crime", afirmou.

Segundo o defensor, que atua no caso com o advogado Renato Soares Nascimento, seu cliente tem um álibi que será apresentado em juízo.

Após a apresentação da defesa prévia, será agendada uma audiência de instrução e, posteriormente, o depoimento do sargento Adriano, que até agora não deu sua versão para o caso e manteve-se calado nos depoimentos ao DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), da Polícia Civil.

"Em juízo ele falará", disse o advogado, que não quis falar qual seria o álibi de Adriano.

Sobre o vídeo no qual Adriano e Gilberto foram reconhecidos (veja abaixo) como os homens que sequestraram Guilherme antes de terem torturado e matado o jovem, o advogado não comentou. "No interrogatório, na Justiça, ele prestará todas as informações", disse.

A defesa de Gilberto Eric não foi localizada.

Após a fase de instrução, a Justiça decidirá se Adriano e Gilberto irão a júri popular. Não há previsão para o julgamento de ambos.

Sequestro, tortura e morte

Guilherme foi sequestrado, torturado e morto em 14 de junho deste ano na Vila Clara, zona sul de São Paulo.

O sequestro de Guilherme foi flagrado por uma câmera de segurança do bairro e ambos os autores foram identificados pela Polícia Civil. A família da vítima, com a ajuda de vizinhos, encontrou essa filmagem.

O sargento Adriano é dono da empresa Campos Forte Portaria, contratada para fazer a zeladoria, mas que prestava de fato serviços de segurança em um terreno da Sabesp, administrado pela empresa Globalsan, localizado no mesmo quarteirão onde o jovem morava. A Sabesp alega que o terreno é da Globalsan, mas todos os moradores do bairro conhecem o local como "o terreno da Sabesp".

Gilberto era funcionário de Adriano na Campos Forte e usava o codinome de Roberto na empresa, forma também como era conhecido pelo bairro.

O sargento PM Adriano Fernandes de Campos e o ex-PM Gilberto Eric Rodrigues, réus pelo assassinato do jovem negro Guilherme Guedes - Reprodução - Reprodução
O sargento PM Adriano Fernandes de Campos e o ex-PM Gilberto Eric Rodrigues, réus pelo assassinato do jovem negro Guilherme Guedes
Imagem: Reprodução

O terreno era usado como passagem para acessar a área de um supermercado onde moradores do bairro recolhiam alimentos descartados próximo ao vencimento. O movimento aumentou no local em virtude da pandemia de covid-19. O sargento, afirmam os investigadores, alegava que o terreno era alvo de furtos, nunca reportados à polícia.

Na denúncia, o promotor do caso, Neudival Mascarenhas Filho, diz que a invasão ao terreno da empresa motivou o assassinato. "O crime foi cometido por motivo torpe, pois agiram os denunciados para se vingar dos invasores, sequestrando e matando o primeiro garoto que viram pela frente, para que servisse de exemplo", escreveu.

Para o promotor, os dois denunciados cometeram homicídio qualificado por motivo torpe, emprego de meio cruel e recurso que impossibilitou a defesa da vítima.

MP: "Crime foi extremamente cruel"

Ao UOL, o promotor explicou que o MP optou por qualificar o homicídio, com emprego de meio cruel, pois não teria elementos suficientes para denunciar os dois acusados pelo crime de tortura.

"O meio cruel da denúncia equivale à tortura. A tortura prevista em lei fala em violência para obtenção de confissão, mas não temos elementos de que esse era o objetivo dos autores. O policial preso não colaborou", disse.

"Mas o crime foi extremamente cruel. Houve um disparo não letal na boca da vítima, que atingiu os lábios de Guilherme", afirmou o promotor.

O UOL apurou que o sargento Adriano tentou ocultar os rastros que o ligavam o crime. Depois de sequestrar Guilherme ao lado da casa onde ele morava, o garoto foi levado até o carro do sequestrador e o policial deixou o celular no terreno do qual era segurança. "Ele não queria correr o risco de ser rastreado", disse uma fonte ligada ao caso.

Família pede Justiça e prisão

Na tarde de 14 de agosto, a família de Guilherme e representantes da Rede de Proteção e Resistência contra o Genocídio estiveram reunidos com o promotor do caso e com o promotor Arthur Lemos, secretário especial de políticas criminais do MP paulista, e pediram por Justiça.

A mãe de Guilherme, Joyce Silva, disse que para isso é fundamental a prisão do ex-PM Gilberto, que segue foragido. "Que seja feita a Justiça e que o policial fugitivo seja localizado. Ele é acusado de vários homicídios, segundo a polícia, como que ele trabalhava com um PM da ativa como segurança?", questionou.

A família e a Rede de Proteção representaram ao MP pela abertura de um inquérito civil público para apurar a responsabilidade civil da Sabesp e da Globalsan na morte de Guilherme.