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"Vamos continuar a ver protestos populistas na Alemanha", diz especialista

Rodrigo Alvares

Do UOL, em São Paulo

07/05/2015 06h00

Para o professor de história moderna da Universidade Livre de Berlim Paul Nolte, o sentimento de obrigação moral e responsabilidade em relação às atrocidades cometidas pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial ainda desempenha um papel importante no imaginário dos alemães. Entretanto, ele acredita que a geração com menos de 20 anos esteja mais "relaxada" agora, uma vez que não tem de enfrentar os pais e avós com uma biografia nazista.

Nolte, cujo campo de atuação é política alemã, norte-americana e comparativa da história social dos séculos 18 a 20, também destacou o papel da mídia alemã. "Na maioria dos casos, a mídia tenta evitar uma atitude de pura nostalgia e, pelo menos implicitamente, levanta debates sobre a Segunda Guerra Mundial, por exemplo, no que diz respeito à ligação íntima entre a guerra e o Holocausto", afirma.

E em relação ao futuro, ele acredita que protestos populistas vão continuar a ocorrer na Alemanha nos próximos anos, como resultado da sensação de incerteza em um mundo em rápida mudança com a globalização, imigração e crises sociais

Leia abaixo a entrevista completa:
 
UOL - Como é a relação dos alemães mais jovens nas discussões atuais sobre o nazismo e o legado da Segunda Guerra Mundial?
Paul Nolte - O interesse entre os alemães mais jovens no passado nazista permanece forte, mas mudou ao longo dos anos e décadas. O sentimento de obrigação moral e responsabilidade ainda desempenha um papel importante, mas parece mais "relaxado", porque a geração mais jovem agora não tem de enfrentar os pais (ou na maioria dos casos, até mesmo avós) com uma biografia nazista.

UOL - As TVs públicas da Alemanha costumam passar filmes e documentários sobre a Segunda Guerra Mundial quase todas as noites. Como a mídia alemã apresenta questões relacionadas ao nazismo e à xenofobia?
Nolte - De fato, a atenção dos meios de comunicação é profunda, mas há uma grande variedade de produtos --alguns, um pouco mais educativos, outros mais divertidos. Na maioria dos casos, a mídia tenta evitar uma atitude de pura nostalgia e, pelo menos implicitamente, levanta debates sobre a Segunda Guerra Mundial, por exemplo, no que diz respeito à ligação íntima entre a guerra e o Holocausto. No entanto, por causa das mudanças mais gerais na mídia, especialmente com o advento da internet, a atenção do público raramente se concentra em uma única produção televisiva. Questões atuais de neonazismo e xenofobia, por exemplo, no contexto do Pegida (Patriotas Europeus contra a Islamização do Ocidente, na sigla em alemão), são cobertos extensivamente. Mas isso é em grande parte separado da memória de 1939-1945, embora um acordo moral invisível às vezes conecte os dois.

UOL - Como as gerações mais velhas lidam com os mais jovens quando se trata de discutir o que eles viveram durante e depois da guerra?
Nolte - Como eu disse antes, os intensos conflitos geracionais são principalmente uma questão do passado. Hoje, apenas algumas pessoas muito velhas ainda podem contar histórias da guerra e suas conseqüências imediatas, e o interesse em ouvi-los é grande.

UOL - Existe um consenso na sociedade alemã sobre a luta contra o racismo e a xenofobia ou podemos ver movimentos como o Pegida ter mais destaque?
Nolte - Ambas são realidades, embora o movimento Pegida esteja, estou convencido, no pico de sua popularidade, nós provavelmente vamos continuar a ver protestos populistas na Alemanha nos próximos anos, como resultado da sensação de incerteza em um mundo em rápida mudança com a globalização, imigração e crises sociais. No entanto, há um forte consenso, especialmente entre as elites políticas, a classe média e os meios de comunicação, contra o racismo e a xenofobia, e um apoio vibrante para refugiados na sociedade civil alemã.