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Entrevista de Sean Penn com 'El Chapo' prejudica presidente do México

Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Imagem: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Nacha Cattan

11/01/2016 17h22

Poucas coisas deram certo para o acuado presidente do México, Enrique Peña Nieto, depois que ele transmitiu ao mundo pelo Twitter na sexta-feira (8) que suas forças de segurança máxima tinham recapturado o traficante de drogas mais procurado do mundo.

Em vez de servir como o tão necessário estímulo que parecia ser, o episódio degringolou em mais um possível constrangimento para o presidente, cuja popularidade sofreu com uma sequência de escândalos e com uma economia engasgada. No sábado (9), poucas horas depois do tiroteio que levou à prisão de Joaquín "El Chapo" Guzmán, o ator Sean Penn disse ter entrevistado secretamente o traficante de drogas nas montanhas da região norte do México meses antes. Essa revelação gerou críticas ao modo como o governo lidou com essa caçada humana e suscitou dúvidas sobre a possibilidade de grandes falhas do serviço de inteligência.

O México informou a Guzmán (10) no domingo que está tomando medidas para extraditá-lo para os EUA, uma decisão que, embora diminua o risco de que ele escape da prisão pela terceira vez, também contradiz as promessas anteriores de mantê-lo no México como uma questão de soberania nacional. Nessa decisão está implícita a dúvida de que o governo mexicano consiga de fato mantê-lo preso, disse Andrew Selee, vice-presidente executivo do Woodrow Wilson International Center for Scholars.

"Não é uma 'missão cumprida'", disse Vanda Felbab-Brown, membro sênior da Brookings Institution em Washington, citando as palavras que Peña Nieto utilizou quando anunciou a notícia na sexta-feira. "É apenas um estilhaço dos enormes problemas da violência criminosa no México".

Mais de 150 mil pessoas foram assassinadas no México desde que o país começou sua guerra contra os cartéis de drogas em dezembro de 2006 e cerca de 26 mil estão desaparecidas, de acordo com as Nações Unidas.

O encontro entre Penn e Guzmán em outubro representa um "problema grave", disse Felbab-Brown, se o México só soube dele depois de o ator ter entrado no país. Autoridades de segurança disseram à mídia que o encontro ajudou a levá-las à zona rural do Estado de Durango em outubro, onde atacaram Guzmán, embora não tenham conseguido capturá-lo. Não está claro se as autoridades sabiam do encontro com antecedência.

Penn está sendo investigado pela entrevista realizada para a revista Rolling Stone e Kate del Castillo, a atriz mexicana que, segundo Penn, ajudou a organizar o encontro, também está sendo investigada. Penn conversou com Guzmán durante sete horas e realizou outras entrevistas depois por telefone e por vídeo, de acordo com seu artigo publicado no sábado pela Rolling Stone.

Pedido de extradição

O fraco sistema de justiça mexicano será testado novamente à medida que o processo de extradição prometido pelo governo for realizado, de acordo com Mike Vigil, diretor internacional de operações do Departamento Antidrogas dos EUA (DEA, na sigla em inglês) aposentado. O advogado de Guzmán agora tem três dias para apelar a extradição e 20 dias para fornecer argumentos justificativos.

O processo de extradição enfrenta riscos, como extensos procedimentos jurídicos em que medidas judiciais provocam anos de atrasos, disse Vigil. Os tribunais mexicanos também poderiam ser suscetíveis a intimidações tanto de Guzmán quanto das autoridades federais, disse ele.

Guzmán foi preso pela primeira vez na Guatemala, em 1993, e extraditado para o México. Ele fugiu de uma prisão de segurança máxima no Estado de Jalisco em 2001, foi recapturado em fevereiro de 2014 e escapou da prisão El Altiplano, perto da Cidade do México, em julho. Depois da dramática captura na sexta-feira, após horas de perseguição por oficiais da Marinha, ele foi levado novamente à prisão El Altiplano, onde a segurança foi reforçada para evitar outra fuga.

"O governo mexicano se tornou muito bom em perseguir líderes de organizações criminosas", disse Andrew Selee, vice-presidente executivo do Woodrow Wilson Center. "O problema é que o restante do sistema de justiça criminal não evoluiu do mesmo modo".