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Americanos podem receber uma indenização maior em acidente da Germanwings

Familiares de vítima lamentam perto da área onde o avião caiu, nos Alpes franceses - Christophe Ena/AP
Familiares de vítima lamentam perto da área onde o avião caiu, nos Alpes franceses Imagem: Christophe Ena/AP

Jad Mouawad e Nicola Clark*

31/03/2015 06h00

As extraordinárias circunstâncias que levaram à queda do jato da Germanwings na semana passada, quando aparentemente o piloto derrubou o avião, matando todas as pessoas a bordo, significa que as seguradoras da companhia aérea poderão ter de pagar centenas de milhões de dólares para as famílias das vítimas, segundo peritos judiciais.

Mas, apesar de a companhia aérea ser responsável pelos atos de seu piloto, nem todos os parentes terão direito à mesma indenização. As famílias das três vítimas norte-americanas, por exemplo, deverão receber da companhia um pagamento maior do que outros passageiros, porque os tribunais nos Estados Unidos geralmente concedem indenizações maiores que os tribunais europeus.

Sob a Convenção de Montréal de 1999, um tratado internacional que rege a responsabilidade pelos aviões, as companhias aéreas são responsáveis em casos de morte ou ferimento acidental em voos internacionais e devem pagar às famílias até US$ 170 mil por vítima. A definição de um acidente é ampla e inclui qualquer evento incomum e inesperado que cause uma queda mortal.

Mas como o piloto causou a queda intencionalmente, segundo a promotoria francesa, os parentes também poderão pedir uma indenização maior à empresa, segundo advogados especializados em aviação.

"É triste, é trágico, mas extremamente simples", disse Robert Alpert Sr., um veterano advogado de aviação que tratou de casos envolvendo mais de 40 acidentes. "A companhia e sua seguradora devem fazer os pagamentos rapidamente às famílias. Particularmente diante do fato de que eles parecem ter descuidado da monitoração do bem-estar físico e mental desse piloto". 

As autoridades disseram que Andreas Lubitz, o copiloto que estava no controle do Airbus A320 que despencou nos Alpes franceses na terça-feira passada (24), tinha uma doença mental, mas manteve o diagnóstico escondido de seu empregador. Ele e as outras 149 pessoas a bordo do avião morreram quando ele se chocou com uma montanha.

James Healy-Pratt, um sócio e diretor do departamento de aviação da firma Stewarts Law, em Londres, calculou que as indenizações totais da companhia aérea às famílias dos passageiros serão de aproximadamente US$ 350 milhões.

"Seria um suicídio comercial para a Germanwings tentar discutir sua responsabilidade para com as famílias", disse Healy-Pratt. "Estou surpreso de que a Lufthansa tenha sido tão defensiva até agora. Espero que o bom senso prevaleça em breve". 

Hans Joachim Schöttes, um porta-voz da Germanwings, disse durante o fim de semana que as famílias das vítimas começarão a receber pagamentos iniciais nos próximos dias. A Germanwings, propriedade da Lufthansa, disse que reservou 50 mil euros para cada família, para cobrir despesas imediatas. A Lufthansa disse que vai honrar suas responsabilidades junto às famílias.

Quanto cada família receberá no final deve variar. As dos passageiros com filhos ou dependentes teriam direito a um pagamento maior do que aquelas de passageiros idosos ou que não têm parentes dependentes.

Quanto a onde as famílias podem pedir indenização, existem várias opções: o país da companhia aérea; o país onde o voo deveria pousar; o país em que a passagem foi comprada; o país de destino final; ou o país de residência do passageiro.

Os passageiros a bordo do avião da Germanwings, que voava de Barcelona, na Espanha, para Düsseldorf, na Alemanha, vinham de mais de 16 países, incluindo 71 passageiros da Alemanha e 48 da Espanha.

A Convenção de Montréal não impõe limites à indenização, deixando que os tribunais nacionais decidam quanto dinheiro é adequado pela perda de um parente (a convenção, entretanto, não permite que sejam concedidos danos punitivos).

As abordagens nacionais variam muito. Alguns países não permitem indenização em casos de homicídio doloso. Os tribunais dos EUA, por outro lado, em geral são extremamente favoráveis às famílias.

Uma companhia aérea pode evitar pagar às famílias mais que uma soma mínima se puder provar que de modo algum foi culpada pela queda do avião. Na prática, esse critério é quase impossível de cumprir em um acidente. "Neste caso, é claro, será impossível para a companhia provar que foi totalmente isenta de erro", disse Mike Danko, advogado de um queixoso da Califórnia.

"A companhia deverá pagar uma indenização plena ilimitada porque deixou de fazer tudo para evitar essa tragédia", disse Healy-Pratt.

O principal executivo da Lufthansa disse que Lubitz estava capacitado a voar. Entretanto, as autoridades alemãs descobriram que ele não revelou todo o seu histórico médico, apesar de uma política da empresa que exige a notificação de condições que possam afetar a capacidade de pilotar.

Ele também procurou tratamento para problemas de visão que podem ter ameaçado sua capacidade de continuar trabalhando como piloto, disseram no sábado (28) duas autoridades informadas sobre a investigação.

"Não há uma exigência de que eles deveriam conhecê-lo melhor, mas ele era seu agente, e a companhia aérea é responsável por seus atos", disse Kevin P. Durkin, sócio da Clifford Law Offices em Chicago e ex-presidente da seção de aviação da entidade que representa os advogados dos EUA.

Nos EUA, as famílias podem esperar indenizações de mais de US$ 10 milhões, dependendo das circunstâncias específicas da pessoa, idade, profissão e renda, segundo Danko, que representou as famílias das vítimas da queda do Concorde da Air France em 2000 e do voo 587 da American Airlines que caiu em Nova York em novembro de 2001.

Mas um tribunal federal da Califórnia, depois da queda do voo 447 da Air France, remeteu o caso de duas famílias americanas à França, onde a maioria dos casos foi julgada, disse Danko.

Ainda assim, a maioria dos casos é resolvida fora do tribunal. Por esse motivo, Danko diz que as companhias geralmente examinam onde os passageiros poderiam processá-la e oferecem uma indenização equivalente à que um tribunal desse local poderia conceder.

Isto explica por que os europeus receberiam menos, disse Kenneth R. Feinberg, advogado especialista em indenização de vítimas, já que "a ideia de que você receberá centenas de milhares ou milhões de dólares é estranha ao modo como a Europa indeniza".

Os tribunais da Alemanha, por exemplo, aprovam pagamentos que cobrem o custo do enterro das vítimas ou ajuda psicológica para seus parentes, assim como pensão alimentícia à esposa e aos filhos. Mas os pagamentos totais geralmente são uma fração do que as famílias americanas podem receber.

Healy-Pratt disse que os acordos em desastres aéreos são em média de US$ 4,5 milhões para um caso americano, 1,6 milhão para um caso britânico, 1,4 milhão para um caso espanhol e 1,3 milhão para um caso alemão.

Segundo especialistas, quaisquer que sejam as conclusões sobre a queda da semana passada, a cobertura do seguro deveria facilmente incluir as potenciais indenizações. A Germanwings é segurada por um grupo de seguradoras lideradas pela Allianz.

"Uma das partes mais difíceis do meu trabalho é explicar às famílias britânicas que suas indenizações valem muito menos que as das famílias norte-americanas, e para as famílias alemãs que as delas valem menos que as das espanholas", disse Healy-Pratt. "Afinal, a maioria dos passageiros sofreu experiências semelhantes durante os longos minutos finais do voo 9525". 

(*Hilary Stout colaborou na reportagem)