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Déficit na previdência aflige os EUA, que testam saídas para aposentadorias

Ajustes para a seguridade social dos EUA é um desafio para o Congresso norte-americano - Getty Images/iStockphoto
Ajustes para a seguridade social dos EUA é um desafio para o Congresso norte-americano Imagem: Getty Images/iStockphoto

Paula Span

10/12/2018 04h01

Há muito tempo ouvimos avisos de que o programa de Segurança Social, do qual dependem 52 milhões de americanos para sua aposentadoria, poderia um dia ficar sem dinheiro.

Analistas dizem que isso não vai acontecer – mesmo que seja apenas porque os idosos são uma força de voto poderosa –, mas este ano o sistema chegou a um patamar preocupante: a Administração da Seguridade Social informou que os benefícios de aposentadoria pagos mensalmente excediam as receitas fiscais e os juros que financiam o programa.

Isso exigiu o primeiro acesso ao Fundo de Reserva da Segurança Social em 35 anos. Até 2034, estimou a agência, ela terá esgotado essas reservas, e suas receitas cobrirão apenas cerca de quatro quintos dos benefícios devidos.

"Há um problema, mas não uma crise", disse Andrew Eschtruth, pesquisador do Centro de Pesquisa de Aposentadoria no Boston College. "Os legisladores já enfrentaram isso antes, e o programa sempre pagou os benefícios totais."

Fazer ajustes para manter a solvência da Segurança Social, por mais crucial que seja, representa apenas uma das questões enfrentadas pelo Congresso. Este poderia também corrigir aspectos desatualizados de um programa que atende quase 90 por cento dos americanos com mais de 65 anos.

"É um bom momento para recuar e tentar melhorar a eficácia da Segurança Social", disse Richard Johnson, do Urban Institute, autor de um novo relatório sobre o aumento da idade de aposentadoria do programa.

As correções podem incluir alterações destinadas a trazer mais dinheiro e a pagar menos. Um imposto mais elevado sobre a folha de pagamentos ou o aumento do nível de rendimentos sujeitos a impostos da seguridade social (em primeiro de janeiro, eles incorreriam nos primeiros US$ 132.900, o que já é um aumento) reforçaria as receitas.

As medidas para poupar dinheiro podem incluir a redução dos benefícios para aqueles com salários maiores e o número de anos que os trabalhadores devem recolher benefícios, com o aumento da idade de aposentadoria. Normalmente, essas mudanças começam a ser adotadas para os trabalhadores mais novos, não para os que já estão recebendo a aposentadoria ou que estão prestes a se qualificar para os benefícios.

O quadro demográfico subjacente a essas opções é evidente. Com os baby boomers (pessoas nascidas entre o fim da Segunda Guerra Mundial e a metade da década de 1960) se aposentando, o sistema precisa cuidar de mais beneficiários. Maiores expectativas de vida – cerca de cinco anos a mais ao longo das últimas décadas – e melhores condições de saúde significam que "as pessoas podem certamente trabalhar mais do que podiam em 1960", disse Johnson.

A Segurança Social permite agora que os trabalhadores reivindiquem benefícios aos 62 anos, embora possam receber mais se esperarem até a idade mínima de aposentadoria (66 a 67), ou além. O pagamento médio mensal este ano foi de US$ 1.347,46.

Trabalhar mais e reivindicar benefícios mais tarde – tendências já vistas – compensam de várias maneiras, indo além da Segurança Social em si. "É bom para as pessoas, é bom para as receitas fiscais do governo e poderia incentivar o crescimento econômico", disse Johnson.

Mas, como aponta seu relatório, viver mais tempo nem sempre significa que as pessoas podem trabalhar mais. Os profissionais de maior renda podem optar por permanecer trabalhando, disse ele, mas "os problemas de saúde se concentram entre os trabalhadores menos graduados, que estão ficando cada vez mais para trás" economicamente. Além disso, mesmo aqueles que poderiam trabalhar descobrem às vezes que "os empregadores não parecem ansiosos para contratar pessoas de 62 anos de idade".

Aos 60 e poucos anos, como mostrou sua análise de dados nacionais, um quarto de graduados no ensino médio e 37 por cento daqueles sem esse diploma relatam limitações de trabalho relativas à sua saúde. Muitos dizem que suas funções exigem um esforço físico substancial.

O relatório do Urban Institute sugere elevar a idade de aposentadoria precoce para 65 e a idade de aposentadoria completa para 70, mas com salvaguardas para aqueles que não podem trabalhar, talvez por intermédio de outros programas.

A agência poderia fornecer uma rede de segurança ao aumentar os benefícios para quem tem uma renda muito baixa. Poderia expandir seu programa de Renda Suplementar de Segurança, reestruturando a forma como seu seguro-invalidez funciona, ou fornecendo benefícios parciais para os trabalhadores que não estão totalmente impossibilitados de voltar ao trabalho.

Enquanto alguns think tanks (centros e institutos de pesquisa independentes, voltados para a produção e disseminação de conhecimento e ideias) e equipes do Congresso exploram maneiras de fortalecer financeiramente a Segurança Social, outros examinam disposições ultrapassadas que penalizam os beneficiários, principalmente as mulheres.

O Senador Bob Casey, democrata da Pensilvânia, apresentou legislação destinada a ajudar viúvas, viúvos e divorciados a se qualificarem para pagamentos mais elevados e a receberem benefícios mais cedo caso tenham algum tipo de invalidez.

"Esse projeto de lei melhoraria os rendimentos daqueles que estão mais propensos a viver na pobreza, a maioria dos quais são mulheres", disse em uma declaração Casey, membro do Comitê Especial do Senado sobre o Envelhecimento.

Por falar em mulheres e seguridade social, outra medida garantiria um crédito de trabalho para aquelas que temporariamente deixam o emprego porque precisam cuidar de algum familiar.

Na década de 1930, quando a Lei de Segurança Social foi aprovada e depois alterada, os formuladores de políticas presumiram que as mulheres permaneciam em casa enquanto os homens trabalhavam. Os benefícios do cônjuge e dos sobreviventes representavam uma tentativa de manter a esposa (e os filhos menores), que não tinham um histórico profissional.

"Grandes mudanças demográficas ao longo de 80 anos levaram a menos mulheres se qualificando para os benefícios de cônjuge", disse Eschtruth, coautor de um recente levantamento internacional de créditos de cuidadores.

Os pesquisadores descobriram que 23 por cento dos dólares da Segurança Social iam para os benefícios do cônjuge e da viúva em 1960, em comparação com apenas 11 por cento em 2016. Isso em parte se deve a uma proporção crescente de mulheres que já não se casam, ou têm casamentos que não duram 10 anos, o limite para se qualificar aos benefícios em caso de divórcio.

Isso também reflete o fato de que, como as mulheres chegaram em grandes números à força de trabalho, podem se qualificar para a aposentadoria com base em suas próprias histórias de trabalho. Mas, porque ganham menos e têm maior propensão a passar anos não compensados como cuidadoras, seus benefícios podem ser prejudicados.

"Em que medida a sociedade coloca um valor de mercado no cuidado com familiares?", perguntou Eschtruth. A resposta, no momento, é que isso não existe, pelo menos nos Estados Unidos.

A maioria dos outros países industrializados credita alguns anos de cuidados ao calcular os benefícios de aposentadoria, mostrou a pesquisa do Boston College. No Reino Unido e na Alemanha, esses créditos cobrem os cuidados com idosos e crianças.

A legislação introduzida no ano passado pelo senador Chris Murphy, democrata de Connecticut, incorporaria esses cuidados no cálculo de benefícios futuros de uma pessoa. Para se qualificar, seria preciso ter 80 horas de cuidados por mês com um "pai, cônjuge, parceiro doméstico, irmão, criança, tia ou tio" que precisassem de assistência nas atividades diárias. Os cuidadores receberiam um salário modesto por até cinco anos.

Infelizmente, nenhuma dessas mudanças parece iminente.

A última vez que o Congresso fez grandes alterações na seguridade social, em 1983, "não houve mudança até que surgiu o risco de o pagamento dos benefícios não ser efetuado", disse Johnson. Isso também pode ocorrer desta vez, pelo menos depois da eleição presidencial.

"Qualquer tipo de mudança vai ser dolorosa para alguém, por isso há uma grande chance de o Congresso deixar tudo para depois."