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"Catador faz mais do que ministro do Meio Ambiente", desabafa carroceiro

Sérgio Bispo, catador de material reciclável (cooperativa do Glicério)  -
Sérgio Bispo, catador de material reciclável (cooperativa do Glicério)

Lígia Hipólito

do BOL, em São Paulo

19/06/2012 10h00

Sérgio Bispo, catador de material reciclável, trabalha cerca de 12 horas por dia. Durante a manhã, ele articula assembleias e cumpre a rotina administrativa da cooperativa do Glicério, um grupo de 40 catadores que tem sede embaixo do Viaduto do Glicério, “no furacão da cidade de São Paulo”, como Bispo faz questão de dizer.

Ciente da importância de seu ofício, Bispo vai participar da Rio +20, conferência da ONU sobre o desenvolvimento sustentável, para discutir o avanço desse tipo de trabalho na cadeia de reaproveitamento de resíduos nos centros urbanos.

Iniciativas "verdes" como a de catadores e de outros agentes ambientais têm um importante papel na construção da sustentabilidade. A limpeza das vias, a reciclagem e o reaproveitamento de materiais contribuem para que uma cidade como São Paulo, por exemplo, que produz 170 mil toneladas de resíduos por dia, "não se afunde no próprio lixo", como costuma dizer Bispo. Os catadores, aliás, são responsáveis por 90% de tudo o que é reciclado na capital paulista, segundo números do projeto “Pimp My Carroça”, uma iniciativa que busca trazer visibilidade aos carroceiros.

A história de Bispo

Lígia Hipólito/BOL
"Quando eu estava dentro da barriga da minha mãe, eu já comecei a catar", lembra Bispo sobre a infância difícil no lixão de Canabrava, região metropolitana de Salvador (BA). Em 1989, quando tinha 25 anos, o catador rumou da Bahia de todos os santos para a capital paulista. A viagem durou 80 dias: a pé e de carona com a mulher e os dois filhos. Mais tarde, Bispo conheceria os companheiros de profissão – que já se concentravam na região do Glicério. A cooperativa foi criada em 2006 e, hoje, coleta mais de 150 toneladas de resíduos recicláveis por mês.

Na rotina de Bispo, o período da tarde é dedicado a recolher material em empresas conveniadas com a cooperativa na capital paulista. Dividindo o asfalto com veículos motorizados, o carrinho conquista seu espaço e diz a que veio (em mensagem grafitada na placa traseira): “Um catador faz mais do que um ministro do Meio Ambiente”. Ao final do dia de trabalho, a caçamba retorna cheia  para o depósito. “Chego a carregar até 500 kg sobre as rodinhas”, contou Bispo. A coleta mensal da cooperativa chega a 150 toneladas por mês.

A catança é separada nas cadeias produtivas: papel (celulose), plástico, vidro, metal ferroso e não ferroso e óleo. “A partir do momento que separamos esse material, ele vai para as indústrias – que fazem a logística de reciclagem”, explicou o catador, que calcula um ganho médio mensal entre R$ 700 e R$ 900 para cada cooperado.

Líder da cooperativa, Bispo fez questão de ressaltar algumas aspirações do grupo: “A nossa ideia é avançar na tecnologia social, ter carrinho elétrico, caminhão, triturador. Mas, para ter tudo isso, precisamos do apoio e reconhecimento da Prefeitura de São Paulo. Hoje estamos embaixo do viaduto, não temos a permissão do uso da área, ainda assim, pagamos impostos. Se tivermos esse apoio do poder público, poderemos captar recursos e passar de 40 para 120 catadores com uma coleta de 500 toneladas de material reciclável por mês”. Em nota, a Autoridade Municipal de Limpeza Urbana (Amlurb) informa que aguarda a documentação necessária da cooperativa do Glicério para a formalização do convênio com a Prefeitura. Com a assinatura da parceria, toda a infraestrutura utilizada pela cooperativa será custeada pela Amlurb.

Varrição das vias públicas em São Paulo

  • Lígia Hipólito/BOL

    Agentes ambientais cuidam da varrição em São Paulo

Antes conhecidos como garis, os agentes ambientais também fazem parte das chamadas atividades "verdes", pois são responsáveis pelo serviço de varrição em São Paulo. De acordo com a Amlurb (Autoridade Municipal de Limpeza Urbana de São Paulo), esses profissionais coletam cerca de 250 toneladas de lixo por dia na cidade.

Valdiney de Assunção Costa, fiscal da varrição, explica que os agentes fazem a limpeza de calçadas, sarjetas, pontos de ônibus e papeleiras. “A rotina de trabalho deles vai das 6h até as 14h20. O lixo recolhido é ensacado e colocado nos pontos de apoio. O caminhão da coleta recolhe e leva para aterros sanitários”, relatou.

Os agentes contam ainda com a ajuda das ‘lagostinhas’, que são minivarredeiras mecânicas pilotadas por um profissional treinado especificamente para a função.  “Essas máquinas são uma inovação no processo de varrição de calçadões e ciclovias”, complementou Eugênia Gaspar, gerente da empresa Inova, responsável pela limpeza da zona oeste de São Paulo.

Reciclagem do óleo comercial e doméstico

  • Lígia Hipólito/BOL

    Reciclagem de óleo de fritura

Muitas vezes jogado ralo abaixo, o óleo de fritura é um material precioso para a ONG Trevo. Atuando desde 1992 na região da Grande São Paulo, a organização recicla o material coletado em grandes churrascarias, redes de fast food, bares noturnos e outros clientes do ramo alimentício para a confecção do biodisel.

O óleo doméstico também é reciclado pela iniciativa, mas ainda de maneira pouco expressiva. De acordo com Roberto Costacoi, fundador e presidente da ONG Trevo, o reaproveitamento atinge apenas 5% do total produzido. “Esse número deve ser revertido com a distribuição de displays em lugares estratégicos como padarias, redes de supermercado e shoppings onde a dona de casa pode levar o óleo para ser reciclado”, disse Roberto.

A ONG já possui ecopontos disponíveis em alguns locais da capital paulista como o Santana Park Shopping, na zona norte de São Paulo; o Shopping Continental, na zona oeste; a Padaria Cepam, na zona leste, e todas as agências da Sabesp  (mais informações sobre os ecopontos podem ser obtidas no site).

Roberto explica que os condomínios residenciais também podem ter uma bomba de recolhimento por uma taxa de R$ 50 reais. Assim que os displays estiverem cheios, a ONG pode ser acionada para o recolhimento.

Arte com material descartado pela sociedade

  • Lígia Hipólito/BOL

    Rosi Ribeiro, artista plástica

O desemprego levou a artista plástica Rosi Ribeiro à situação de catadora na cidade de Osasco, na Grande São Paulo. A experiência, que durou dois anos, fez com que ela aprendesse a extrair arte do que era considerado lixo pela sociedade.  

“O difícil pra mim era ter que diferenciar o que eu catava para ter um ganho imediato e separar algumas coisas para fazer arte, porque eu adoro. Assim que eu comecei a trabalhar com a arte voltada ao reaproveitamento, resolvi estudar um pouco de gestão ambiental  para entender o que eu poderia fazer com aquilo que é descartado pelas pessoas e montei um ateliê. Hoje não abro mão dessa função que eu acho fantástica”, contou.

Munida de criatividade, tinta e alguns adereços, Rosi transforma radicalmente as peças que encontra. A partir de um carretel de construção, ela faz uma mesa; com caixas de frutas, constrói prateleiras; e, aos poucos, todo entulho ganha a forma de belas peças de decoração.