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Demóstenes não tinha apenas relação pessoal com Cachoeira e quebrou o decoro, diz autor de representação

Do UOL, em Brasília e São Paulo

11/07/2012 12h30Atualizada em 11/07/2012 13h10

O senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) afirmou durante a sessão desta quarta-feira (11), que pode cassar o mandato do senador Demóstenes Torres, que a investigação da Polícia Federal comprovou que o parlamentar tinha mais do que uma relação pessoal com o contraventor Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira.

Demóstenes pode ser cassado por quebra de decoro parlamentar em decorrência do relacionamento com Cachoeira, preso no fim de fevereiro e apontado pela Polícia Federal como chefe de um esquema de corrupção que envolvia políticos, policiais e empresários. 

O processo contra o parlamentar goiano é resultado de uma representação do PSOL, feita por Rodrigues, analisada e aprovada por unanimidade no Conselho de Ética e que também ganhou o atestado de legalidade na CCJ. Entre as acusações que pesam contra ele, estão ter recebido dinheiro e ter favorecido os interesses de Cachoeira enquanto exercia seu mandato como senador. Se for cassado, o ex-líder do DEM ficará inelegível até 2027 (oito anos após o fim da legislatura para o qual foi eleito), quando terá 66 anos.

“Podemos inferir que o representado não mantinha com Cachoeira apenas relações pessoais. Tinha relação de defesa dos interesses da organização criminosa. Muitas são as provas, não só de uma, mas de várias atitudes de quebra de decoro parlamentar”, afirmou Randolfe.

"É evidente a atuação do senador junto, ao lado do senhor Cachoeira. Um dos agentes públicos que mais dialogava com o senhor Cachoeira foi o representado [Demóstenes]. Houve sua atuação para proteger um esquema de contravenção, colocando em risco a vida de agentes públicos", completou.

"Perdão é algo que só pode ser concedido por Deus. A nós, homens públicos, se trata de cumprir com o nosso dever quando é chamado. O povo brasileiro, o povo dos nossos Estados, nos encaminhou para cá para cumprir um serviço. Este é o momento em que esse serviço deve ser cumprido com dedicação e sem medo."

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Rodrigues disse que os parlamentares devem dar o exemplo e que não se pode entender que decoro parlamentar seja um "favor" que se faz à população. "Temos que ser exemplo e fazer exemplo", disse.

"Decoro parlamentar, conduta moral não é um alerta. Não é um favor que fazermos à população. É um comportamento exigido a quem se dispõe à função republicana", disse o senador que acusou Demóstenes de ludibriar os demais parlamentares ao discursar em plenário negando as acusações.

Rodrigues lembrou a declaração feita por Demóstenes em seu depoimento no Conselho de Ética de que Cachoeira pagava suas contas de celular. Nesse depoimento, Demóstenes minimizou a gravidade dos pagamentos e disse que eram apenas R$ 40 ou R$ 50 ao mês.

"A conduta não se mede pelo valor, seja R$ 50 ou um centavo. O senador deve atender ao princípio de não receber, de não obter favores", disse Randolfe Rodrigues.

Para se defender, desde o dia 2 de julho, Demóstenes Torres tem falado na tribuna do plenário do Senado para expor seus argumentos, enfatizando sobretudo que o processo contra ele baseou-se em escutas ilegais, que os trechos de conversas grampeadas divulgadas foram “editadas” e que, ele não se beneficiou com a amizade com Cachoeira nem ajudou em projetos de interesse do bicheiro.

Na história do Senado, até hoje, apenas um senador teve o mandato cassado pelo plenário, Luiz Estêvão (PMDB-DF), em junho de 2000, por ter mentido aos colegas sobre seu envolvimento dele no escândalo de superfaturamento das obras do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo.

A última vez que os senadores votaram uma cassação em plenário foi em 2007, quando o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), foi liberado da acusação de quebra de decoro por ter utilizado recursos da construtora Mendes Júnior para pagar despesas pessoais, como aluguel e pensão alimentícia à jornalista Mônica Veloso, com quem tem uma filha. (Com Agência Brasil)

Saiba quais são as acusações contra Demóstenes

ACUSAÇÃOO QUE DIZ A DEFESA DE DEMÓSTENES
Atuar em favor de empresas, inclusive as de Cachoeira, em órgãos públicosEle confirma. "Quanto à Anvisa e a atuação da Vitapan, eu atuei em favor de todas as empresas do Estado de Goiás, todas que me procuraram. A Vitapan, que era de propriedade do Sr. Carlos Cachoeira, me procurou, sim, e fui lá"
Usar o cargo para negociar um projeto de R$ 8 milhões em favor da Delta Construções, de acordo com gravações telefônicas e relatório do Ministério Público Federal obtidos pela Folha de S.PauloEm seu memorial, Demóstenes ironiza o fato de ter sido considerado “sócio oculto” da Delta e utiliza reportagem na qual o ex-presidente da Delta, Fernando Cavendish, negou que conhecesse o senador
Contratar a sobrinha de Cachoeira como funcionária fantasma. O político teria dito ao contraventor que teria que demitir dois servidores e depois recontratá-los para escapar das denúncias de desvio de dinheiroDe acordo com Demóstenes, a servidora Kenya Vanessa Ribeiro foi admitida em 6 de maio de 2008 e exonerada em 22 de maio de 2009. Ela atuava na cidade Anápolis, onde ele não tinha escritório político. Segundo o parlamentar, a exoneração foi feita como “ação preventiva”, ele disse que decidiu demiti-la assim como outros servidores. Em depoimento ao Conselho de Ética, ele disse que a contratou pela qualificação e não por ter parentesco com o empresário
Ter recebido R$ 20 mil de Gleyb Ferreira da Cruz, integrante da do grupo de CachoeiraDemóstenes diz tratar-se de "factoide criado e devidamente derrubado"
Ter recebido R$ 1 milhão, segundo diálogo gravado com Geovani Pereira da Silva, suposto contador do grupo do contraventorEm seu memorial, disse que abriu seu sigilo bancário e demonstrou a "sandice" da acusação. Em plenário, já havia negado o fato e disse que vivia de salário. Ele também negou caixa dois em sua campanha
Ter pedido a Cachoeira R$ 3 mil para que fosse efetuado o pagamento de um taxi aéreoNega o pedido e disse que o perito que contratou identificou “uma diferença nítida entre o que estava na escuta e o que constou da degravação divulgada”
Ter recebido 30% do valor recebido por Cachoeira na exploração do jogo ilegal. Segundo a representação do PSOL, o dinheiro, avaliado em R$ 50 milhões, seria usado na campanha dele ao governo de Goiás, via caixa doisNega e diz que o advogado que deu origem à reportagem sobre o fato também negou as informações. Demóstenes cita os depoimentos dos delegados da Polícia Federal Matheus Rodrigues e Raul Alexandre Marques de Sousa, e relatório do Procurador Geral da República, Roberto Gurgel. Todos, segundo ele, afirmam que ele nunca fez parte do jogo ilegal
Trecho de gravação da Polícia Federal de conversa entre ele e Cachoeira trata de um projeto em tramitação na qual o senador parece estar alertando que a proposta poderia “pegar” o bicheiroEle nega o teor da conversa. Em seu memorial, ele afirma que no contexto que o diálogo ocorreu, Cachoeira era um conhecido ex-empresário do jogo e "não se sabia que ele era líder de uma organização criminosa do jogo ilegal"
Receber presentes de Cachoeira, entre eles uma geladeira, um fogão e aparelho de telefone Nextel, que teve as contas pagas pelo contraventorEle confirma. “É claro que agora, depois que os fatos ocorreram, as pessoas olhando para trás podem dizer: ele não deveria ter aceitado o Nextel. Mas, sinceramente, tomar este fato como base para dizer que há quebra de decoro e cassar um mandato de um senador, no meu ponto de vista, é muito", defendeu Kakay em mais de uma ocasião. O senador afirma não saber que os rádios Nextel eram utilizados também por integrantes do grupo de Cachoeira
Os relatores Humberto Costa e Pedro Taques avaliaram que o parlamentar utilizou o mandato em favor de CachoeiraEle nega e diz que trabalhou apenas em favor das empresas e dos interesses do seu Estado, Goiás. Demóstenes disse ainda que nada cobrou nem recebeu para isso. Em seu memorial de defesa, ele diz que o relator"teceu uma série de considerações, quase sempre com base em meras suposições"."Tal afirmação é, contudo, um acinte! É uma inverdade"
Em seu relatório, Humberto Costa aponta Demóstenes como atuante na defesa da legalização dos jogos de azarEle nega que tenha feito qualquer movimentação para acelerar a tramitação de um projeto sobre o tema no Congresso
Somadas as denúncias, a representação e os relatórios do caso avaliaram que relação com Cachoeira teria extrapolado a amizade e incluído negócios com o contraventorEm discurso em plenário no último dia 2 de julho, ele negou:"Apenas admiti em pronunciamento aqui na tribuna, no dia 6 de março passado, que fui amigo de Carlinhos Cachoeira e conversava frequentemente por telefone, mas nunca tive negócios legais ou ilegais com ele. Eu não tenho nem sociedade nem nada a ver com os delitos investigados pelas operações Vegas e Monte Carlo”
O senador Humberto Costa diz que Demóstenes mentiu aos colegas em seu discurso em 6 de março deste ano em plenário sobre a extensão da relação com Cachoeira e que só isso seria suficiente para se configurar quebra de decoroDemóstenes defendeu em discurso nesta segunda-feira (9) que que a Constituição assegura liberdade para o parlamentar falar o que quiser da tribuna – ainda que não seja algo verdadeiro. “Se o parlamentar mentir, é um problema dele com sua consciência e sua audiência, não com o decoro. Aliás, nada do que o parlamentar diz da tribuna pode ser quebra de decoro". Ele relembrou ainda o caso de Luiz Estevão: “Criou-se esse mito por causa do precedente utilizado para cassar um senador no ano 2000. A diferença é que eu não menti”, completou

Veja a cronologia sobre as denúncias envolvendo Demóstenes Torres