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Terreno de Marcos Valério invade rua, e Prefeitura de BH "legaliza" manobra em mapa

Cerca de 100 metros da rua Golda Meir foram incorporados ilegalmente a propriedade de Marcos Valério - Google Street View
Cerca de 100 metros da rua Golda Meir foram incorporados ilegalmente a propriedade de Marcos Valério Imagem: Google Street View

Vinícius Segalla

Do UOL, em São Paulo

21/09/2012 23h31

Um trecho de 100 metros de uma rua na região da Pampulha, área nobre de Belo Horizonte (MG), foi incorporada ilegalmente a uma propriedade privada e retirada do mapa oficial da cidade publicado pela prefeitura junto à Lei de Reforma e Uso do Solo, em julho de 2010. A propriedade pertence ao publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza, réu do mensalão e já condenado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) por corrupção ativa, peculato (desvio de recursos públicos) e lavagem de dinheiro. 

O terreno em questão abriga um centro de hipismo de Valério, adquirido pelo publicitário no fim da década de 1990. De acordo com o advogado de Valério, Marcelo Leonardo, a ocupação ilegal da rua já havia acontecido quando ele comprou a propriedade.

No local onde deveria estar a rua Golda Meir, um muro foi erguido, interrompendo a via, e nos 100 metros seguintes foram construídas arquibancadas para a hípica.

  • Divulgação/Arte UOL

    Mapa oficial de BH publicado pela prefeitura mostra trecho da rua Golda Meir em 2000; em julho de 2010, o trecho não aparece mais

Em janeiro de 2010, a Prefeitura de Belo Horizonte notificou o dono da hípica para desobstruir o logradouro público, conforme foi publicado no Diário Oficial de Belo Horizonte no dia 7 de janeiro:

TERMO DE NOTIFICAÇÃO – GERFPAV-P:

Desocupar logradouro público e demolir obra com estrutura metálica e alvenaria construída ao longo da Rua Golda Meir, entre a Avenida Antonio Francisco Lisboa e Rua Alberto Deodato, por infringir o artigo 182 do Decreto 11601/04 e artigo 98 a 102 da Lei 10406/02 do Código Civil Brasileiro. O não-atendimento, no prazo de 15 (quinze) dias aos termos desta notificação sujeitará o infrator às seguintes penalidades: Demolição e apreensão dos materiais pelo município conforme artigo 182 do Decreto 11601/04 e artigos 98 a 102 do Código Civil Brasileiro.

1) Infrator: Marcos Valério Fernandes de Souza
CPF/CNPJ: 403.760.956-87
Notificação n°: 931382A
Data: 07/01/2010

Como se lê, Valério tinha 15 dias, em janeiro de 2010, para devolver a posse do logradouro público ao poder municipal, ou a prefeitura demoliria as construções ali existentes. Nada disso ocorreu.

No dia 19 de março do mesmo ano, uma nova notificação foi publicada no Diário Oficial, de conteúdo semelhante, dando mais 15 dias ao publicitário para devolver o terreno ilegalmente ocupado. Novamente, nada aconteceu.

Até a publicação da última notificação, o referido trecho da rua Golda Meir constava nos dados cartográficos da Prefeitura de Belo Horizonte. Após a reforma da Lei de Uso e Ocupação do Solo, em julho de 2010, o trecho da rua desapareceu dos mapas da prefeitura e da própria legislação urbana. 

O caso permaneceu sem alterações até a última quarta-feira (19), quando um morador do bairro da Pampulha, que tem seu nome mantido sob sigilo, levou a denúncia de apropriação indébita ao Ministério Público. No dia 20, a denúncia foi distribuída à Promotoria de Defesa de Patrimônio Público. Na próxima segunda-feira (24), de acordo com o promotor Leonardo Duque Barbabela, que recebeu a denúncia, o MP abrirá investigação sobre o caso.

Nesta sexta-feira, o UOL procurou a Prefeitura de Belo Horizonte para entender o motivo do "desaparecimento" da rua Golda Meir dos mapas da prefeitura. Em nota, a assessoria de comunicação da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos afirmou que a prefeitura não cedeu o terreno, e que o proprietário da hípica invadiu-o ilegalmente, conforme se lê abaixo:

A Prefeitura esclarece que não houve cessão de logradouro público ao proprietário do imóvel localizado na rua Golda Meir, bairro Bandeirantes, região Pampulha. Também não houve alteração da Lei de Uso e Ocupação do Solo do município, modificando o traçado da via.

O que aconteceu foi invasão do logradouro público, motivo pelo qual o infrator já foi notificado e multado duas vezes pelo município. A ação fiscal está em andamento e um novo auto de infração será emitido.

Caso o proprietário não tome nenhuma providência, a administração municipal fará a remoção da parte da construção que invade a rua.  

Depois de receber a mensagem, o UOL questionou a prefeitura sobre o motivo da rua ter sido retirada do mapa oficial da Lei de Uso e Ocupação do Solo. Também foi perguntado por que o terreno não tinha sido ainda retomado, bem como por que as instalações construídas na via pública ainda não haviam sido demolidas, conforme afirmou que faria a prefeitura há mais de dois anos. Em resposta, a prefeitura afirmou que não comentaria mais o caso.

Já o advogado de Marcos Valério, Marcelo Leonardo, afirmou que seu cliente já comprou o terreno com a ocupação ilegal e que estava impedido de fazer qualquer alteração no local quando recebeu as notificações da prefeitura, em 2010. "Valério adquiriu a propriedade no fim da década de 1990, nas condições que se encontra hoje. Ele não alterou nada no local, já que tem seus bens bloqueados pela Justiça desde 2006", alegou.