Topo

Prestes a valer, Lei Anticorrupção ainda patina em 18 Estados

Bruno Lupion

Do UOL, em Brasília

21/01/2014 06h00

A partir da próxima semana, empresas que subornarem agentes públicos ou fraudarem licitações poderão ser multadas em até 20% do seu faturamento bruto anual. A penalidade, salgada, está na Lei 12.846, a Lei Anticorrupção, aprovada após os protestos de junho de 2013. Ao jogar luz sobre os corruptores, a norma tenta mudar a percepção de que no Brasil só os corruptos aparecem. 

O dispositivo entra em vigor no dia 29 e terá aplicação semelhante à da Lei de Acesso à Informação, sancionada em 2011: o governo federal, por meio da CGU (Controladoria-Geral da União), orienta seus ministérios e demais órgãos. E cada Estado e município regulamenta a lei de maneira própria.

O governo federal afirma estar pronto para aplicar a lei imediatamente, mas a maioria dos Estados ainda engatinha no assunto. Levantamento do UOL aponta que dez das 27 unidades federativas não sabem como vão processar as denúncias de corrupção e oito ainda discutem projetos sobre o tema. Três Estados devem regulamentar a lei nos próximos dias, um já a regulamentou –Tocantins– e cinco não responderam (tabela abaixo).

A lei estabelece duas estratégias para coibir a corrupção empresarial. No front repressivo, aplica multas pesadas às companhias que oferecem ou pagam propina a servidores e fraudam licitações e as obriga a publicar a sentença em veículos de comunicação. No front investigativo, oferece benefícios para as empresas que admitem os ilícitos e colaboram com delações ou provas –por meio dos acordos de leniência, que reduzem a multa em até dois terços.

A punição é administrativa, aplicada diretamente pelos governos, sem passar pelo congestionado Poder Judiciário.

Para ter efeitos significativos em todo o país, é importante que os Estados regulamentem a nova lei, afirma o secretário-executivo da CGU, Carlos Higino. Em entrevista ao UOL, ele diz que o governo federal não pode obrigá-los a regulamentar o dispositivo, mas quem não fizer isso afugentará investidores. “As empresas têm que ter clareza do que vai acontecer em casos de corrupção”, diz.

Regulamentação da Lei 12.846 nos Estados

UFTem projeto?Andamento
ACNãoAguarda decreto federal
ALNãoAguarda decreto federal
AMNãoSem previsão
APSimRegulamenta em fevereiro
CENãoAguarda decreto federal
DFSimDiscute projeto
ESSimDiscute projeto
GONãoAnálise inicial
MANãoAguarda decreto federal
MGSimDiscute projeto
MSSimDiscute projeto
PASimDiscute projeto
PESimDiscute projeto
PINãoAnálise inicial
PRSimRegulamenta nos próximos dias
RJSimDiscute projeto
RNNãoAnálise inicial
RSSimRegulamenta até 29 de janeiro
SCNãoAguarda decreto federal
SENãoAguarda decreto federal
SPSimDiscute projeto
TO-Já regulamentou
  • Não responderam: BA, MT, PB, RO e RR

Pioneiro

O Estado do Tocantins é o único Estado que já regulamentou a Lei Anticorrupção, em 13 de dezembro do ano passado. Lá, todas as secretarias estaduais e a Controladoria-Geral poderão instaurar processos, mas só a Controladoria terá o poder para assumir os casos mais relevantes e promover acordos de leniência.

Amapá, Paraná e Rio Grande do Sul responderam ao UOL que devem regulamentar a lei nas próximas semanas. Espírito Santo, Distrito Federal, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Pará, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo discutem projetos nesse sentido.

Nas demais unidades federativas, paira uma interrogação. “Os Estados ainda estão meio perdidos com essa lei”, resume o controlador-geral do Piauí, Darcy Siqueira Albuquerque Júnior. “O governo criou uma lei e os Estados têm que cumprir, mas como é que regulamenta? Tem que discutir, levar as propostas para os governantes”, diz.

Os Estados enviaram representantes a uma reunião em Brasília nesta segunda-feira (20) para tirar dúvidas. O encontro foi convocado pela CGU e pelo Conaci (Conselho Nacional de Controle Interno), que representa as Controladorias estaduais.

Ética empresarial

As companhias enquadradas na Lei Anticorrupção que tiverem estruturas internas de “compliance” (controle ético e de obediência às leis) poderão ter suas multas reduzidas. A norma, porém, não define quais critérios as empresas devem seguir para receber esse benefício.

O presidente do Conaci, Gustavo Ungaro, corregedor-geral do Estado de São Paulo, cobra do governo federal a edição de um decreto para suprir essa lacuna. “O decreto federal é fundamental, pois deve fixar os parâmetros de avaliação dos mecanismos e procedimentos internos de integridade e auditoria”, diz.

Higino, da CGU, garante que o governo federal pretende regulamentar o tema antes que a lei entre em vigor. Esse decreto também detalharia os acordos de leniência e o procedimento para receber denúncias.

Para o advogado Giovanni Falcetta, especialista no tema, a Lei Anticorrupção estimulará as companhias brasileiras a adotarem estruturas de “compliance”. Isso, somado à previsão dos acordos de leniência, diz ele, mudará a cultura empresarial do país. “As companhias vão ficar com o pé atrás, pois as punições poderão afetar seriamente a sua atividade”, diz.