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Manifestações de domingo podem aumentar pressão pelo impeachment de Dilma

Organizadores programaram protestos contra o governo em mais de 400 municípios do país. A avenida Paulista (foto) deve concentrar lideranças políticas - Jorge Araújo/Folhapress
Organizadores programaram protestos contra o governo em mais de 400 municípios do país. A avenida Paulista (foto) deve concentrar lideranças políticas Imagem: Jorge Araújo/Folhapress

Guilherme Azevedo

Do UOL, em São Paulo

12/03/2016 06h00

As manifestações deste domingo (13) contra o governo Dilma Rousseff (PT) podem fortalecer o processo de impeachment se reunirem milhões de pessoas nas ruas do país, de acordo com cientistas políticos ouvidos pelo UOL.

Balanço desta sexta-feira (11) do movimento Vem Pra Rua, um dos organizadores dos protestos, contabiliza manifestações programadas contra Dilma em mais de 400 municípios brasileiros em todos os Estados, no Distrito Federal e também em 23 cidades de 13 países, entre eles Estados Unidos, Portugal, Espanha, Reino Unido, Suécia e Alemanha.

O termômetro das redes sociais dos últimos dias sugere a recuperação do ímpeto da mobilização contra o governo, impulsionada pelas denúncias progressivas da Operação Lava envolvendo a própria presidente e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, depois de os protestos terem amainado ao longo do último ano, desde as grandes aglomerações de um ano atrás, de 15 de março de 2015.

Dilma com Lula - Ricardo Stuckert/Instituto Lula - Ricardo Stuckert/Instituto Lula
Dilma e o PT enfrentam agora o teste das ruas
Imagem: Ricardo Stuckert/Instituto Lula

 

O evento no Facebook criado para a manifestação na avenida Paulista, em São Paulo, marcada para as 15h do domingo, por exemplo, contava nesta sexta com a adesão de 362 mil pessoas, 105 mil interessadas e 6 milhões convidadas. O protesto da Paulista deve convergir como ponto de encontro das principais lideranças políticas de oposição ao governo Dilma (leia abaixo).

"A oposição não deverá levar milhares ou milhões às ruas, dado que sua ineficácia e divisão é patente", duvida Roberto Romano, professor de ética e política da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas). "Mas se por acaso as massas ultrapassarem a casa dos milhões, os políticos serão levados a prosseguir o processo de cassação." O cientista político sublinha que, desde as manifestações pelo impeachment de Dilma do ano passado, "o governo se enfraqueceu, mas a oposição não se fortaleceu".

Segundo ele, o pêndulo entre os dois setores depende, agora, do grau de intensidade das manifestações de ambos os lados, dos que exigem o impeachment e dos que lutam contra tal fim. "Quando os rumos de um Estado dependem do número de manifestantes, de um lado ou de outro, o próprio Estado mostra plena fragilidade", analisa.

Protestos também podem atingir Cunha

Malco Camargos, professor de ciência política da PUC-MG (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais) também avalia que os protestos, se grandes, "pressionam, sim, o governo, que já vem fragilizado", e podem antecipar, ou forçar, também a saída do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Câmara, isto é, da condução do processo para cassar o mandato de Dilma. "O impeachment conduzido por alguém investigado tem muito menos legitimidade do que o conduzido por alguém que esteja no exercício livre do mandato, sem ameaças", opina. "O processo precisa avançar da forma mais isenta, e isso é impossível de acontecer com Cunha."

Eduardo Cunha e o impeachment - Luis Macedo/Câmara dos Deputados - Luis Macedo/Câmara dos Deputados
Pressões pelo impeachment podem alcançar Cunha
Imagem: Luis Macedo/Câmara dos Deputados

 

O cientista político acredita que grande parte dos possíveis manifestantes é "uma manada que age por critérios pontuais" e, por isso, as últimas notícias são capazes de inflar as manifestações do domingo. "A delação premiada do senador Delcídio Amaral (PT-MS), a ação na casa do Lula, a Operação Lava Jato conduzem ao lugar de que o problema do país é de um único partido, o que motiva as pessoas a voltarem às ruas com o desejo de tirar o PT."

Para José Álvaro Moisés, professor titular do departamento de ciência política da USP (Universidade de São Paulo), o contexto é grave: "O governo Dilma está sitiado".

Ele aponta problemas da presidente com o próprio PT e com Lula, que, segundo Moisés, esteve por trás da mudança de três ministros (Joaquim Levy, da Fazenda, que deixou o governo; Aloizio Mercadante, que deixou a Casa Civil e retornou para a pasta da Educação; e José Eduardo Cardozo, que saiu da Justiça e foi colocado na Advocacia-Geral da União).

Há também, diz o professor, problema com o PMDB, que tem segmento forte que quer se afastar, e ainda denúncias que aumentam de qualidade e de quantidade, em comparação com um ano atrás.

"O governo Dilma se especializou em dar tiros no próprio pé. Nunca vi um governo capaz de tantas trapalhadas. Não consegue nem empossar o ministro da Justiça, que é promotor (Wellington César terá de optar por um cargo ou outro, decidiu o STF esta semana). A situação é péssima, e Dilma está sozinha", observa o cientista político.

Daí a avaliação de que o processo de impedimento ganha uma nova atualidade, se a oposição conseguir levar milhões de pessoas às ruas. "O dia 13 vai demonstrar se há mais ou menos apoio popular. Se as manifestações forem pequenas, o processo perde força; se forem grandes, reatualiza o processo."

Sobrevalorização das manifestações

Francisco Fonseca, professor de ciência política da PUC-SP e da FGV-SP (Fundação Getulio Vargas de São Paulo), discorda de seus colegas e minimiza as possíveis repercussões de manifestações consistentes. "Não podemos sobrevalorizá-las, porque são sempre de um grupo muito específico, da classe média." São diferentes, compara o professor, das que pediram o impeachment do presidente Fernando Collor de Mello ao longo de 1992, que iam de cima a baixo da sociedade e representavam segmentos amplos.

Caras-pintadas protestam contra Collor, em 1992 - Eder Chiodetto / Folhapress - 18.09.1992 - Eder Chiodetto / Folhapress - 18.09.1992
Caras-pintadas protestam contra Collor, em 1992
Imagem: Eder Chiodetto / Folhapress - 18.09.1992

Fonseca lembra que há um ano as manifestações contra Dilma vêm diminuindo de tamanho vigorosamente e, mesmo que voltem agora a crescer, "devem mostrar que continuam no mesmo espectro específico da classe média branca com ensino superior, renda acima de dez salários-mínimos e forte apoio da mídia". O temor dele com os protestos de domingo é o de escalada da intolerância e da violência. "Dependendo do que acontecer, o Brasil pode virar uma Venezuela. E isso deve ser atribuído a instituições falhas", diagnostica.

Para o estudioso, o problema é do sistema político brasileiro, que foi contaminado pelo financiamento privado e pelo caixa dois. "Todos os estímulos do nosso sistema político são voltados para a corrupção. E isso não é de um governo. Foi assim no governo Itamar Franco, no governo FHC, no governo Lula e agora no governo Dilma. São esquemas que se mantêm de governo para governo", sublinha.

A consequência da falência do sistema, segundo Roberto Romano, da Unicamp, se mostra no divórcio cada vez mais profundo entre cidadania e seus supostos representantes, os políticos, com consequências nefastas: a descrença nas próprias instituições e o risco de apoio da população a saídas não democráticas. "O deboche dos políticos chegou ao ponto de ser insustentável. E tal atitude se espalha pelos governistas e oposicionistas", lamenta.

Segundo Romano, a população sabe que a simples saída da atual presidente pouco mudará no relacionamento do Estado, que continuará autoritário, pouco democrático, truculento e movido à base da corrupção. "Tal fato não se deve a um ou dois partidos, mas a todos." A questão é séria, e para ela alerta sem rodeios o cientista político Francisco Fonseca: "Estado opaco pode levar a um golpe".

"Coxinhas e petralhas têm ambos razão"

"Je suis coxinha" - Vilmar Bannach/Futura Press/Futura Press/Estadão Conteúdo - Vilmar Bannach/Futura Press/Futura Press/Estadão Conteúdo
Manifestante contra Dilma, em protesto de abril de 2015, em SP
Imagem: Vilmar Bannach/Futura Press/Futura Press/Estadão Conteúdo

 

Malco Camargos, da PUC-MG, sugere um caminho de diálogo: o reconhecimento de que todos os que hoje se acusam têm razão. "Os coxinhas estão certos quando dizem que o PT formou uma quadrilha, que se locupletou, que é apenas um projeto de poder. E os petralhas têm razão quando dizem que a Justiça é seletiva e nessa seletividade acaba sendo parcial, ferindo o princípio da independência."

Daí, diz ele, podem se unir para enfrentar o cerne de um problema que nos aflige a todos igualmente: como levar a uma nova ordem jurídica, política e eleitoral no país, em que se reveja a relação entre quem ocupa o Estado e as empresas privadas. "O debate que está nas ruas precisa ser aprimorado, e não acirrado. É sobre como criar mais dificuldades para evitar essa promiscuidade e regular melhor", sintetiza.

 

Protesto na Paulista reúne cúpulas do PSDB e do DEM

Alckmin, Serra e Aécio - Bruno Santos/Terra - Bruno Santos/Terra
Aécio Neves, Geraldo Alckmin e José Serra, durante campanha eleitoral em 2014. Cúpula tucana pode estar reunida neste domingo
Imagem: Bruno Santos/Terra

 

Os tucanos de São Paulo deverão ser as principais lideranças políticas presentes à manifestação da avenida Paulista. Confirmaram participação no ato os senadores José Serra e Aloysio Nunes Ferreira e os pré-candidatos à prefeitura de São Paulo, Andrea Matarazzo e João Doria Jr, entre outros filiados.

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), afirmou que poderá ir à Paulista na condição de "cidadão", mas não confirmou. O presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), ainda não tinha definido até a noite de sexta-feira se participará da manifestação em São Paulo, em Brasília ou em Belo Horizonte.

As principais lideranças nacionais do DEM também decidiram ir à Paulista: estarão lá Agripino Maia (RN), presidente do partido; Ronaldo Caiado (GO), líder no Senado; e Pauderney Avelino (AM), líder na Câmara dos Deputados.