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"Fla-Flu político" provoca demissão de professora, e alunos protestam no PR

Vinícius Segalla

Do UOL, em São Paulo

22/03/2016 19h19

Na semana passada, uma professora de um colégio de Curitiba criticou em suas redes sociais uma manifestação pró-impeachment feita por alguns estudantes em sua escola. Na sequência, foi hostilizada por pais de alunos nas redes sociais, que a chamaram de comunista para baixo e pediram sua demissão. A escola, por sua vez, se recusou a demitir a profissional, mas tal foi a pressão que a própria professora resolveu demitir-se. Daí, foi a vez dos próprios alunos protestarem, com cartazes contendo frases como "Opinar não é doutrinar". Quer dizer, uma parte dos alunos protestou em favor da professora. Outra parte fez protestos contra a professora, contra a presidente Dilma Rousseff, contra o PT e contra o ex-presidente Lula. A escola, então, temendo o pior, resolveu, nesta terça-feira, acabar com a polêmica: suspendeu por tempo indeterminado todo e qualquer novo protesto contra ou a favor da professora demissionária e tudo isso que está aí.

É este o resumo de um dos mais marcantes episódios recentes relacionados à polarização que vive o país, polarização esta que há meses transbordou dos ambientes políticos para as ruas, para os condomínios e para as escolas.

Postagem de professora que deu início a ciclo de protestos em colégio de Curitiba - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
Postagem de professora que deu início a ciclo de protestos em colégio de Curitiba
Imagem: Reprodução/Facebook

O caso relatado acima aconteceu no Colégio Jesuíta Medianeira. Tudo começou quando, na semana passada, alguns alunos foram à escola vestindo preto, como forma de protesto contra o governo federal e favorável ao processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. A professora de História dos Movimentos Sociais, que leciona no 9º ano e que pediu para não ter seu nome revelado, não gostou do que viu, e resolveu se expressar nas redes sociais. Junto com o texto abaixo, ela postou uma foto da década de 1930, com crianças italianas vestindo o fardamento negro do Partido Nacional Fascista, então no poder:

"Hoje, vi crianças numa escola, vestindo preto e pedindo golpe. Desprezando a democracia e exalando ódio. Parece que não conseguimos escapar do que Marx profetizou quando disse que a História se repete, primeiro como tragédia, depois como farsa…"

A reação foi imediata: dezenas de pais de alunos do Medianeira foram para as redes sociais. Em um grupo do Facebook de pais do colégio (que era aberto ao público, mas que foi fechado), começaram a pipocar mensagens como as seguintes:

"Comunista descarada!"

"SE EU PEGAR ALGUM TEXTO COMUNISTA no caderno do meu filho eu vou RASGAR e devolver rasgado. E vou convidar o professor a me convencer. O COMUNISMO SÓ DEU CERTO NA CABEÇA DELES………..Argentina caiu, Venezuela caiu, e por aí vai. MAS ISSO É CULPA DA COORDENAÇÃO DE ENSINO EM DEIXAR QUE ISSO ACONTEÇA."

"À diretoria do colégio deve tomar uma providência. Sou totalmente contra a ideologia de esquerda… Não aceito em hipótese alguma que professores fiquem doutrinando minha filha… Se minha filha aparecer em casa com alguma ideia esquerdista, vai dar confusão…"

Essas foram as mensagens na página dos pais de alunos. Nas páginas da professora, as mensagens, que já foram apagadas, foram como as de baixo:

"Porca vermelha, se afaste do meu filho"

"Petista vagabunda, vai dar aula em Cuba ou no raio que o parta"

"Comunista burra, o comunismo acabou, devia voltar para a escola como aluna"
 
Devido à perseguição, a docente excluiu suas páginas em todas as redes sociais de que participava.

Durante toda a semana passada foram crescendo os protestos contra e a favor da professora. Ela passou a ficar com medo. Pediu demissão. "Não aceitamos a demissão, a professora é referência nesta escola, está conosco há dez anos e é um de nossos melhores quadros. Ainda temos esperança de fazê-la mudar de ideia", informou a assessoria de comunicação do Medianeira.
 
Ainda na semana passada, a escola divulgou uma nota oficial direcionada aos pais de alunos, que, em seu ponto central, dizia:
 
"Como colégio jesuíta de educação básica, os acontecimentos do tempo presente são conteúdo em nossas salas de aula, dialogando com as práticas de currículo. Os princípios do cuidado à pessoa, do diálogo, da livre expressão de ideias, do respeito aos direitos humanos, do estado constitucional democrático, da cidadania, dentre outros, não são objeto de negociação, configurando-se como prerrogativas da formação de pessoas conscientes e inseridas no tempo e espaço em que vivem."
 
"É fundamental que nossos educandos e educandas, professores e professoras, pais e mães, sintam-se seguros, possam manifestar seus pensamentos, convivam em meio à diversidade de opiniões e de posicionamentos políticos. São pressupostos para a formação de pessoas reflexivas com sentido de história, de tempo e de espaço, do local e do global, do racional e afetivo. Por isso, são construções e não algo dado naturalmente."
 
Já nesta segunda-feira, os alunos vestiram branco e pediram, com cartazes e gritos, que a professora permaneça na escola. Já um grupo de pais favorável à professora também se manifestou por meio de nota, dizendo que "nós, pais e mães de alunos do Colégio Medianeira apoiamos a continuidade de seu projeto político-pedagógico, que é pautado, entre outros princípios, na busca do diálogo, da livre expressão de ideias, do respeito aos direitos humanos e do estado democrático."

Protesto a favor da professora

UOL Notícias
 
Os pais que hostilizaram a professora pelas redes sociais, por sua vez, não quiseram falar com a reportagem.
 
Finalmente, nesta terça-feira, temendo pela segurança de alunos e funcionários, o colégio decidiu proibir os protestos e manifestações políticas dentro do ambiente escolar. "É a falência, a violência venceu, tivemos que fazer o que nunca queríamos ter feito, que é inibir os alunos de expressar suas opiniões políticas", lamentou um funcionário da escola que não quis se revelar.
 
Veja, abaixo, a nota da escola proibindo as manifestações.
 
"Prezadas Famílias,
 
Como apresentado à comunidade no último dia 18 de março, o Colégio Medianeira manifesta sua abertura ao diálogo e à construção do conhecimento por meio do debate e do questionamento, fundamentos básicos na busca de uma educação de qualidade e integral. Ressaltamos que em todo espaço democrático, é dever e direito de todos ouvir e serem ouvidos.

Nesse sentido, o Colégio Medianeira repudia toda e qualquer incitação ao ódio, difamação e injúria, violência física ou verbal – que é crime previsto em lei – e reitera o papel da instituição como mediadora na interação entre alunos, educadores e famílias no afã de edificar uma sociedade mais justa e igualitária.

Após as manifestações dos alunos nas últimas semanas, no ambiente do Colégio Medianeira, que permitiu democraticamente os lados se expressarem, foi decidido pela Direção a suspensão temporária de novos movimentos dentro do Colégio. A decisão tem como objetivo garantir a segurança e a harmonia necessárias a todos os educandos, assegurando os encaminhamentos pedagógicos das atividades escolares na perspectiva do debate, da construção de pontes e de um sadio clima de aprendizagem.

O Colégio Medianeira repudia a coação e hostilidade que possam vitimizar os educadores desta instituição de ensino. Reafirmamos nosso compromisso com a liberdade de expressão e a livre manifestação do pensamento os quais fazem parte do modus operandi de uma instituição da Rede Jesuíta de Educação.

Por fim, o Colégio Medianeira espera que o atual momento, político e social, possa ser visto e compreendido como um marco histórico na democracia brasileira. Agradecemos todas as manifestações realizadas por entender que elas nos ensinam a sermos mais tolerantes, críticos e ao mesmo tempo compromissados com a causa comum: o exercício da cidadania.

Direção do Colégio Medianeira"