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Análise: Relatório coloca impeachment no leito constitucional e exclui golpe

Deputados da comissão do impeachment, durante sessão que apresentou relatório a favor do afastamento de Dilma. À esq., Rogério Rosso (PSD-DF), presidente da comissão; ao centro, Jovair Arantes (PTB-GO), relator - Pedro Ladeira/Folhapress
Deputados da comissão do impeachment, durante sessão que apresentou relatório a favor do afastamento de Dilma. À esq., Rogério Rosso (PSD-DF), presidente da comissão; ao centro, Jovair Arantes (PTB-GO), relator Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress

Guilherme Azevedo

Do UOL, em São Paulo

06/04/2016 20h08

O cientista político José Álvaro Moisés, da USP (Universidade de São Paulo), avalia o documento preparado e apresentado nesta quarta-feira (6) pelo relator da comissão especial de impeachment, deputado Jovair Arantes (PTB-GO), como uma "peça extremamente competente". O relatório conclui indicando "haver indícios mínimos" de que Dilma praticou atos que podem ser enquadrados como crimes de responsabilidade.

Segundo o estudioso, o relator "colocou o impeachment no leito constitucional e excluiu qualquer interpretação de golpe", porque seguiu estritamente o rito definido pelo STF (Supremo Tribunal Federal), fixou-se na questão das chamadas "pedaladas fiscais", objeto formal do processo contra Dilma, e remeteu a decisão à instância política superior, no caso, o Senado, sugerindo ainda a existência de "outras questões de elevada gravidade" que poderão eventualmente ser avaliadas.

Moisés acredita que os senadores, caso o processo chegue lá (precisa primeiro ser aprovado pela comissão do impeachment e depois pelo plenário da Câmara), estão forçados a avaliar outros aspectos de cunho mais político do governo Dilma, uma vez que o impeachment se trata de processo político-administrativo.

Entre esses aspectos, diz o professor, estão o recurso continuado às pedaladas por Dilma, conforme mostrado em relatório do próprio Banco Central; e a campanha presidencial de 2014 da petista, que o cientista classifica como a "mais degradante da história política do Brasil". "Precisamos juntar as coisas, não se pode separá-las", conclui.

"Importância relativa"

O cientista político Malco Camargos, da PUC-MG (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais), minimiza, contudo, o valor do relatório pró-impeachment apresentado na comissão especial. Para ele, trata-se de um fato mais "retórico", com "importância relativa".

Isso porque o avanço na comissão precisa apenas de maioria simples (33 dos 65 deputados), matemática muito diferente da necessária para aprovar o afastamento de Dilma no plenário da Câmara, quando precisará do apoio de dois terços dos deputados (342 dos 513 parlamentares da Casa).

Camargos concorda com seu colega da USP sobre a legitimidade do processo de afastamento de Dilma, uma vez que cumpre o rito. Ressalva, contudo, a alta velocidade imprimida ao processo e a liderança dele, exercida pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), alvo de denúncias de corrupção e réu em processo no STF. "Isso favorece a retórica de quem diz que o processo é golpe."

Para o cientista político, entretanto, o resultado do impeachment, seja qual for, não terá o poder de apaziguar e reconciliar as forças políticas do país. "A forma como está sendo colocado terá ao final um vencedor e um perdedor, seja o governo, seja a oposição. Por isso, o conflito vai continuar."

Entenda o processo do impeachment

UOL Notícias

O que acontece agora?

Após a apresentação do relatório em sessão da comissão do impeachment, entenda quais são os próximos passos do processo do impeachment.

- Pedido de vista

Após a leitura do relatório do deputado Jovair Arantes (PTB-GO), segue-se um período de vista coletiva de dois dias, para os membros da comissão analisarem o documento

- Discussão

Na sexta-feira (8), deve começar a discussão, que será interrompida no final de semana e retomada na segunda-feira (11). Pelo regimento da Câmara, cada um dos 65 titulares e 65 suplentes da comissão têm até 15 minutos para falar, mas os deputados negociam para encurtar essa etapa

- Votação na comissão

Os deputados da comissão votam se concordam ou não com o parecer. Isso deve acontecer a partir das 17h da segunda-feira (11)

- Votação na Câmara

Aprovado o parecer, ele será lido na próxima sessão do plenário da Câmara, possivelmente na terça-feira (12). Depois é publicado no Diário do Legislativo e, após 48 horas, o pedido de impeachment pode ser votado pelos deputados em plenário.

O plenário da Câmara fará votação nominal dos 513 deputados (o presidente da Casa, Eduardo Cunha, do PMDB-RJ, já indicou que também deve votar) sobre o pedido de impeachment. A votação deve se estender por três dias, com início no dia 15. Se tiver 342 deputados a favor, o pedido segue para análise do Senado

- Autorização ao Senado

Comissão é formada no Senado em dois dias e tem mais dez dias de prazo para emitir um parecer

- Votação no Senado

Se, por maioria simples (41 dos 81 senadores), o Senado referendar o pedido, a presidente é afastada de suas funções por 180 dias. O vice, Michel Temer (PMDB), assume interinamente

- Julgamento

Ainda no Senado, são apresentadas acusação e defesa, sob o comando do presidente do STF, Ricardo Lewandowski. Para afastar Dilma de vez, são necessários 54 votos de um total de 81 senadores

- Condenação

Se condenada, Dilma perde o mandato e fica inelegível por oito anos. Temer assume definitivamente para terminar o mandato para o qual a chapa foi eleita