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Por que Cunha não foi preso antes? Moro explica, especialistas comentam

Veja a trajetória política do ex-deputado federal Eduardo Cunha

UOL Notícias

Flávio Costa e Gabriela Fujita

Do UOL, em São Paulo

19/10/2016 18h08

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu em junho a prisão preventiva de Eduardo Cunha ao STF (Supremo Tribunal Federal). Por que só agora, quatro meses depois, ele foi detido?

O próprio juiz federal que decretou a prisão de Cunha, Sergio Moro, explica: na época, mesmo afastado Cunha ainda era deputado federal, e a Constituição determina que um parlamentar só pode ser preso em casos de “flagrante delito de crime inafiançável”.

“Apesar de existirem causas para a preventiva, naquele momento, o então parlamentar estava protegido pelo estatuto normativo especial do parlamentar federal, que proíbe a prisão cautelar do parlamentar federal salvo em casos de flagrante delito por crime inafiançável”, escreve Moro no despacho de prisão preventiva de Cunha.

Na prática, Moro defendeu o ministro Teori Zavascki, responsável pelos processos da Lava Jato que tramitam no STF. Ao ter seu mandato cassado pela Câmara em setembro, Cunha perdeu a proteção parlamentar e seus processos foram transferidos para a primeira instância: a 13ª Vara Federal de Curitiba, cujo juiz titular é Moro.

“Tendo Eduardo Cosentino da Cunha perdido o mandato parlamentar, não mais vigora a vedação do  art. 53, §2º da Constituição Federal de 1988, motivo pelo qual não mais existem as amarras que impediram a tomada da decisão mais adequada pela instância superior", afirma Moro.

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Especialistas concordam com Moro

Especialistas em direito penal ouvidos pelo UOL concordam com as justificativas apresentadas pelo juiz federal. 

"Se o ministro Teori tivesse decidido pela prisão de Cunha há quatro meses, ele estaria infringindo a Constituição, pois não havia uma situação de flagrante que justificasse a detenção de alguém que ainda era deputado federal", afirma o advogado criminalista Leonardo Pantaleão.

"A partir do momento em que perde o mandato, Cunha perde a proteção constitucional e se torna um cidadão comum, digamos assim. Todos indícios apresentados nos autos do processo de que Cunha estava obstruindo a Justiça continuam válidos para a prisão preventiva", explica Pantaleão.

Para o jurista Luiz Flávio Gomes, a prisão do então senador Delcídio do Amaral, ocorrido em novembro de 2015, é exemplar em comparação com o caso de Cunha. Acusado de obstruir as investigações da Operação Lava Jato. Delcídio foi gravado em uma conversa oferecendo mesada de R$ 50 mil para que o ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró não fechasse acordo de delação premiada. 

"Naquele momento, Teori determinou a prisão do então senador Delcídio porque se caracterizou uma situação de flagrante delito. Não era a mesma situação de Cunha", explica Gomes.

Rapidez na primeira instância

O chefe do departamento de direito penal da PUC-SP, Christiano Jorge Santos, aponta outro aspecto da prisão preventiva do ex-deputado federal: processos judiciais em primeira instância costumam ter decisões mais rápidas do que aqueles que tramitam no STF, órgão de cúpula do Judiciário brasileiro.

"Não é uma impressão, é uma constatação objetiva: existe uma diferença de ritmos quando o processo está em Brasília, no Supremo Tribunal Federal, e quando vai para uma vara especializada da Justiça Federal, como a do juiz Sergio Moro, em Curitiba", afirma Santos.

Para Santos, um juiz de primeiro grau, como Sergio Moro, tem uma participação mais direta nos processos que preside."No Supremo, como estão sobrecarregados de processos e recursos, é expedida uma carta de ordem passando para juízes em outras cidades fazerem a instrução do processo. Só com isso o ritmo fica mais lento, e existe a dispersão de provas."

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Outro lado

Um dos advogados do deputado cassado, o criminalista Ticiano Figueiredo disse considerar "surpreendente" a decretação da prisão preventiva, uma vez que, segundo ele, o mesmo pedido tramitou por seis meses no Supremo Tribunal Federal sem que fosse aceito.

"O Supremo passou seis meses com o pedido de prisão para decidir em relação a Eduardo Cunha e não prendeu porque não entendeu que não havia nenhum dos requisitos necessários. Aí, surpreendentemente, [o juiz Sergio] Moro, com uma semana que o processo está na mão dele, decreta prisão sem qualquer fato novo", disse.

"Vamos nos encontrar e avaliar o que será feito. Ele estava em Brasília para, entre outras coisas, conversar com seus advogados sobre sua estratégia de defesa", afirmou o defensor, que nega, no momento, que haja intenção de fazer acordo de delação premiada.

O ex-presidente da Câmara fez um post em sua página no Facebook na qual diz que a decisão da prisão é "absurda" e que seus advogados "tomarão as medidas cabíveis". Essa foi a primeira vez que o ex-deputado se pronunciou após a prisão.