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Por que alguns imigrantes conseguem asilo na Europa e outros não?

26.ago.2015 - Sob olhares da polícia húngara, imigrantes sírios tentam pular cerca de arame farpado na fronteira entre a Sérvia e a Hungria, em Roszke - Laszlo Balogh/Reuters
26.ago.2015 - Sob olhares da polícia húngara, imigrantes sírios tentam pular cerca de arame farpado na fronteira entre a Sérvia e a Hungria, em Roszke Imagem: Laszlo Balogh/Reuters

10/09/2015 10h57

Há meses, europeus testemunham cenas caóticas de uma enxurrada de imigrantes entrando na Grécia, Itália e países da Europa Central, enquanto a União Europeia (UE) tenta organizar uma política comum de asilo comum entre seus 28 Estados membros.

Trata-se de uma questão delicada, que afeta a soberania dos países e as relações nacionais com grandes comunidades de estrangeiros, como a dos afegãos no Reino Unido e a dos argelinos na França.

Reino Unido, Irlanda e Dinamarca não aderiram à maior parte das regras de asilo da UE, mantendo suas próprias normas.

O foco agora é buscar um mecanismo para distribuir pela UE 160 mil novos imigrantes em busca de asilo - os países, contudo, mantêm divergências sobre esse processo.

Muitos serão enquadrados como refugiados - sobretudo aqueles que fugiram da Síria, Afeganistão ou outras áreas de conflito. Um refugiado é alguém em fuga da guerra ou de perseguição, com direito à proteção internacional.

Mas quantos imigrantes que não conseguem asilo são enviados de volta por países da UE? Há algum padrão europeu sobre o tema?

Checagens de identidade

Em 2015, os maiores grupos de imigrantes na Europa por nacionalidade são os sírios, seguidos pelos afegãos e imigrantes de Eritreia, Nigéria e Somália.

Guerra e violações de direitos humanos atingem todos esses países, então muitos desses candidatos a asilo se enquadram como refugiados.

Mas cada caso é diferente - alguns terão mais dificuldades do que outros para comprovar sua condição de refugiados.

Muitos não possuem passaporte nem documento de identidade, após arriscarem a vida no mar Mediterrâneo e pela região dos Balcãs e enfrentarem maus-tratos e exploração das gangues de traficantes de pessoas.

Provar a nacionalidade pode ser um processo longo - e essas decisões podem ser contestadas por governos sob pressão para expulsar imigrantes.

Muitos imigrantes oriundos da África subsaariana ou do oeste dos Balcãs fracassam em obter asilo, ao serem classificados como imigrantes movidos por razões econômicas.

Um dos incentivos aos imigrantes ilegais é que menos da metade daqueles que fracassam na obtenção de asilo são, de fato, expulsos dos países em que se encontram.

Em 2013, a UE enviou de volta apenas 39% desses imigrantes recusados, segundo o documento Agenda Europeia sobre Migração, da Comissão Europeia.

Outro obstáculo importante é que acordos sobre asilo com países de fora da UE são bastante desiguais.

Há acordos de readmissão com países como Paquistão e Bangladesh, mas nenhum acerto com China e Argélia, por exemplo.

E o acordo de Cotonou, que obriga países da África subsaariana a receber os imigrantes recusados, não conteve o enorme êxodo de imigrantes econômicos desses países.

A Comissão Europeia concorda que a região precisa oferecer mais ajuda para facilitar o retorno dessas pessoas à África.

Também há planos para estender o mandato da Frontex, a agência de fronteiras da UE, para que ela possa ajudar nesse processo de retorno.

A Líbia, acossada por conflitos e criminosos, é um problema para a UE por ser um país de passagem para imigrantes.

As nações da UE estão vinculadas ao princípio da "não-devolução", que veta o envio de pessoas para lugares em que há risco de vida. A Grécia já foi alvo de críticas por violar esse princípio.

Fluxo alemão

Em 2014, a Alemanha foi o principal destinatário de pedidos de asilo, com uma estimativa de 173,1 mil requisições. Ficou à frente dos Estados Unidos, com 121,2 mil, segundo a agência da UE para refugiados, a UNHCR. E a Alemanha espera receber até 800 mil imigrantes de fora da UE neste ano.

Em terceiro lugar veio a Turquia (87,8 mil), depois a Suécia (75,1 mil). O Reino Unido recebeu 31,3 mil novos pedidos. Hoje as principais nacionalidades daqueles que buscam asilo no Reino Unido são eritreia, paquistanesa e síria, nesta ordem.

Um pedido bem-sucedido de asilo normalmente significa receber o status de refugiado - a proteção mais ampla, que permite a um imigrante permanecer, obter trabalho e até uma nova nacionalidade.

Mas um candidato a refugiado também pode conseguir uma espécie de proteção auxiliar. Significa que ele não se enquadra como refugiado nos termos da convenção sobre refugiados de 1951, mas ainda precisa de proteção internacional. O Reino Unido usa o termo "proteção humanitária" nessas situações.

Dados da UE mostram uma grande variação nos resultados dos pedidos de asilo em cada país.

A Alemanha, de longe, recebe o maior número de pedidos, mas não é o país que envia de volta o maior número.

Reino Unido expulsa mais

Em 2014, o Reino Unido encabeçou a lista de deportação de imigrantes de fora da UE - 48.890, de um total de 192.445 na UE, segundo a agência de estatísticas Eurostat. O número de ordens para deixar o país foi ainda maior: 65.365.

Em seguida ficaram a Grécia (27.055 voltaram, entre 73.670 ordenados a deixar o país) e a Alemanha (21.895 entre 34.255). A França deportou apenas 19.525 pessoas, apesar de ter ordenado a saída de 86.955 imigrantes.

O total de deportados de países da UE representa menos de um terço das pessoas de fora da UE que vivem ilegalmente na região, que somaram 625.565.

Susan Fratzke, especialista do Instituto sobre Políticas de Migração (Migration Policy Institute), diz que o Reino Unido desenvolveu laços duradouros com certos países, como o Paquistão, o que facilita a deportação de imigrantes que fracassam em seus pedidos de asilo.

"Esses acordos bilaterais são realmente os mais efetivos, mais do que acertos dentro da UE", afirmou Fratzke à BBC.

A Espanha, por exemplo, mantém uma cooperação antiga com Marrocos para manter os imigrantes longe de Ceuta e Melilla - enclaves espanhóis na costa mediterrânea do país africano, cercados por enormes cercas de arame farpado. O país foi o que negou o maior número de entradas de imigrantes em 2014 - 172.185, ou 66% do total da UE.

Seguro ou não?

Dados oficiais do Reino Unido sobre remoções de imigrantes - de forma voluntária ou forçada - refletem as nacionalidades com maiores ou menores chances de obter asilo no país: 5.684 paquistaneses, por exemplo, foram removidos, ante 875 afegãos. A insurgência talebã no Afeganistão faz com que muitas partes do países sejam inseguras.

O Reino Unido também removeu 2.184 nigerianos, mas apenas 49 eritreus. "Remover" não significa sempre enviar ao país de origem - muitas vezes eles seguem para um outro país, onde podem ter se fixado previamente.

Eritreus formam um dos maiores grupos de candidatos a asilados na UE. Normalmente, como os imigrantes sírios, conseguem o status de refugiado. A UE priorizou essas duas nacionalidades para reassentamento.

A Eritreia está sob sanções internacionais, acusada de violações de direitos humanos, incluindo um duro serviço militar obrigatório que pode se estender por anos.

Em 2014, pedidos de asilo de cidadãos da Síria, Iraque, Afeganistão e Somália registraram taxa de sucesso superior a 50% na UE.

Mas o índice para candidatos de outros países afetados por conflitos e instabilidade ficou em 20%-50%, incluindo a República Democrática do Congo, Sudão, Mali, Ucrânia e Paquistão.

Para candidatos do oeste dos Balcãs (incluindo Kosovo, Sérvia e Albânia), Argélia e Geórgia, a taxa de sucesso foi inferior a 10%.

A Alemanha é um dos países que reivindicam a definição de uma lista de países "seguros" na UE, para facilitar a expulsão de imigrantes econômicos do oeste dos Balcãs. Mais de 40% dos pedidos de asilo na Alemanha são de pessoas dessa região.

Muitos desses candidatos são ciganos em fuga da pobreza no Kosovo e outras áreas. Mas autoridades ainda precisam decidir se a discriminação sofrida por esses grupos pode ser classificada como perseguição.

Disputas sobre Dublin

Uma outra complicação é a chamada Convenção de Dublin, que está suspensa na prática porque a Alemanha não está enviando os sírios de volta a outros países da UE.

Pela convenção, o país da UE onde o cidadão em busca de asilo chega primeiro tem o dever de processar seu pedido. Mas o acerto não funciona porque Grécia, Itália Hungria não conseguem lidar com o fluxo de pessoas.

Esse é outro fator que explica porque mais imigrantes não são deportados.

Segundo Fratzke, do Instituto sobre Políticas de Migração, as regras de Dublin não condizem com a realidade do fenômeno de migração. Os imigrantes têm preferências sobre onde querem viver - mesmo que essas opções não sejam motivos para o asilo.

E é fácil para essas pessoas se mudarem para outro país na zona de Schengen, de fronteiras abertas na UE. "Há pressões para que as pessoas procurem burlar as regras de Dublin, se não tiverem famílias ou falem a língua do país (em que chegam primeiro)", afirmou.