Onde enterrar o autor de um atentado?
Atentados recentes confrontam Alemanha com dilema que franceses enfrentam há anos: o que fazer com corpos de terroristas? Autoridades temem que túmulos virem local de peregrinação para extremistas
O que fazer com os cadáveres de autores de atentados? Agora, a Alemanha também se vê confrontada com essa difícil questão. Mais especificamente, duas cidades bávaras enfrentam o problema: Würzburg, onde há algumas semanas um adolescente de 17 anos supostamente adepto do "Estado Islâmico" (EI) atacou passageiros de um trem com machado e faca, antes ser morto a tiros pela polícia; e Ansbach, onde pouco tempo depois um jovem de 27 anos explodiu uma bomba no próprio corpo em um festival de música, ferindo várias pessoas.
Ambos os corpos ainda não foram liberados pela promotoria. Atualmente ainda não está definido quem é responsável pelo sepultamento do autor do atentado de Würzburg. Ainda há muitas perguntas não respondidas: onde ele será enterrado? Em um cemitério muçulmano ou em um cemitério normal? De forma anônima ou não? E quem paga o custo do funeral? Em Ansbach, também existem as mesmas questões.
"Basicamente, um muçulmano deve ser enterrado segundo os preceitos muçulmanos", diz Aiman Mazyek, presidente do Conselho Central dos Muçulmanos na Alemanha, em entrevista ao jornal Süddeutsche Zeitung (SZ). Mas, do ponto de vista teológico, o funeral não precisa necessariamente de um imã.
Até agora, as comunidades islâmicas na Baviera não foram requisitadas para o funeral do homem-bomba. Mas se isso ocorrer, é possível que haja discussão. Mohamed Abu el-Qomsan, responsável pelo estado da Baviera do Conselho Central dos Muçulmanos, disse à agência de notícias DPA que o homem-bomba não deve ser enterrado em um cemitério muçulmano e nem ter funeral islâmico.
Na França, as autoridades já conhecem o problema. As comunidades islâmicas francesas se recusaram a enterrar religiosamente os dois homens que mataram um padre católico no norte do país há pouco mais de uma semana. Também após os ataques de Paris de novembro de 2015, a França discutiu acaloradamente sobre qual comunidade religiosa deveria se encarregar do enterro dos terroristas. Um dos criminosos do Bataclan foi finalmente enterrado anonimamente em sua cidade natal. Também os dois irmãos que mataram ano passado 12 integrantes da redação da revista satírica Charlie Hebdo foram enterrados anonimamente e sem cerimônia.
Enterros anônimos
A questão difícil sobre como pessoas que infringiram grande sofrimento a outras devem ser enterradas não surge na Alemanha apenas por conta dos atentados de Würzburg e Ansbach. O autor do massacre de Munique de 18 anos, David S., também deve ser enterrado. Ele matou nove pessoas em um centro comercial em meados de julho e se matou em seguida.
Psicólogos dizem que para os parentes em luto dos autores de massacres também é importante se despedir do morto com dignidade. É um ato de equilíbrio. Temendo pessoas que violam sepulturas, os túmulos geralmente não trazem o nome do morto. Assim aconteceu no caso do atirador Robert S., que matou 16 pessoas em sua escola em Erfurt, em 2002 e depois se suicidou, Ele foi enterrado em um local desconhecido. O túmulo do adolescente de 17 anos Tim K., autor do massacre da escola de Winnenden no sul da Alemanha, que matou 15 pessoas em 2009, permanece em segredo.
Santuário para fanáticos
Ao medo de possíveis ataques contra os túmulos se une uma outra preocupação: que a sepultura de autores de massacres e terroristas se tornem lugares de peregrinação para outros fanáticos, um tipo de local de adoração para potenciais imitadores que lá vão prestar homenagem a seu ídolo.
Também foi uma questão bastante controversa onde seriam enterrados os dois terroristas radicais de direita do grupo Clandestinidade Nacional-Socialista (NSU, na sigla em alemão) Uwe Böhnhardt e Uwe Mundlos. Böhnhardt supostamente foi enterrado anonimamente em uma sepultura comunitária de um cemitério da cidade de Jena - anonimamente, para que o local não seja ponto de peregrinação para radicais de direita.
A cidade de Jena teme que ocorra o mesmo que aconteceu na cidade de Wunsiedel, onde durante anos neonazistas peregrinaram para o cemitério onde esteve enterrado Rudolf Hess, um dos líderes do regime nazista. A sepultura foi desmanchada.
Aiman Mazyek, presidente do Conselho Central dos Muçulmanos, tem compreensão por comunidades que se recusem a enterrar homens-bomba. "A dignidade humana é inviolável, não importa o que a pessoa fez. Uma pessoa tem direito a um funeral", ressalta, em entrevista ao SZ.
Os agressores de Würzburg, Ansbach e Munique também receberão seu lugar de descanso eterno -- não importa o quão insuportável esta ideia possa ser para alguns dos parentes das vítimas.
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