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Depois de vampirão, Tuiuti usa bode para fazer crítica política no Carnaval

Jack Vasconcelos, carnavalesco da Paraíso do Tuiuti - Ewerton Pereira/Divulgação
Jack Vasconcelos, carnavalesco da Paraíso do Tuiuti Imagem: Ewerton Pereira/Divulgação

Daniel Lisboa

Colaboração para o UOL, de São Paulo

09/01/2019 04h00

Colocar um Temer vampiro na avenida, no Carnaval do ano passado, fez com que a Paraíso do Tuiuti atraísse todos os olhares para si -e faturasse o segundo lugar entre as agremiações do Grupo Especial do Rio. A escola, neste ano, levará à Marquês de Sapucaí (confira aqui a programação dos desfiles do grupo especial do Rio) outro enredo político: "O Salvador da Pátria", uma grande piada que contará a história do bode Ioiô, eleito vereador em Fortaleza (CE). 

O animal recebeu votos como forma de protesto. Ou seja, é exatamente o caso de tratar, de uma maneira aparentemente leve, um tema sério: a insatisfação popular com a classe política. 

O carnavalesco Jack Vasconcelos, no entanto, deixa claro que não haverá menção explícita a nenhum político. O que aconteceria se a escola fizesse, hoje, uma crítica a Bolsonaro nos moldes daquela feita contra Michel Temer? "Seria pior, porque os simpatizantes do Bolsonaro são mais violentos. Perigosamente violentos. Claro que eu teria problemas se rolasse uma brincadeira com esse nicho da população. Qualquer artista teria. Aliás, já tiveram e terão durante algum tempo ainda", avalia. 

"Hoje, enfrentamos problemas até quando repassamos memes nas redes sociais. Tem uma galera bem raivosa que está sempre atenta para rebater tudo. E não é para isso que nós trabalhamos, não é para isso que fazemos arte."

Vasconcelos, ao menos, já estaria preparado para a reação que causaria, já que, no ano passado, revela que não estava pronto para os xingamentos, as perseguições e até as brigas familiares que o desfile da Tuiuti rendeu a ele. "Me chamavam de coisas que, para eles, são xingamentos, mas para mim não são. Viado, por exemplo. Petista, esquerdopata. Eles trocam uma palavra ou outra, mas se repetem. O pensamento é sempre o mesmo."

O enredo "Meu Deus, Meu Deus, Está Extinta a Escravidão?" causou polêmica no Carnaval passado. A Tuiuti criticou a reforma trabalhista do ex-presidente Michel Temer, levando ao desfile um vampirão com a faixa presidencial. Os manifestantes que foram às ruas pedindo o impeachment de Dilma Rousseff foram retratados como patinhos manipulados pelos poderosos. 

Tuiuti - Mauro Pimentel/AFP - Mauro Pimentel/AFP
Ex-presidente Michel Temer virou vampiro no desfile da Tuiuti
Imagem: Mauro Pimentel/AFP

"Até me senti um pouco ingênuo", diz Vasconcelos, quase um ano depois, ao refletir sobre a agressividade com a qual o desfile foi recebido. "Tive inclusive problemas com a família. Amigas da minha mãe ficaram bravas, pois estavam entre as pessoas que bateram panela contra a Dilma", conta o carnavalesco. "Acho que o desfile teve um efeito de epifania para alguns, enquanto deixou outros bravos. É como medicação, tem um efeito diferente em cada um."

A repercussão foi tamanha que, quando "Temer vampirão" voltou à avenida, no Desfile das Campeãs, sem a faixa presidencial, surgiram teorias sobre possíveis ameaças à Tuiuti. "Essa história virou folclore dentro da escola. Mas eu, pessoalmente, não soube de nada. Só vi que o vampiro estava sem a faixa na hora do desfile. Na verdade, nem perguntei por quê", diz. 

Vasconcelos acredita que, se o clima já estava conturbado no Carnaval passado, a coisa degringolou de lá para cá. "Os humores só pioraram, e o clima foi ficando mais pesado. As pessoas não estão mais acostumadas a piadas, a levar as coisas na esportiva, com leveza, que é exatamente o que faz o Carnaval."

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