Andreza Matais

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Reportagem

Maia: 'Solução fácil é trocar Haddad, mas seria uma tragédia'

Ex-presidente da Câmara e atual diretor-presidente da Confederação Nacional das Instituições Financeiras, instituiçao que representa 15 entidades, entre elas a Febraban, Rodrigo Maia diz que a saída do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, do governo seria uma "tragédia" para o país.

A troca na Fazenda começou a ser especulada, como mostrou a colunista Raquel Landim, devido aos sucessivos desgastes acumulados pelo ministro nas últimas semanas, cujo ápice foi a devolução pelo Senado de medida provisória que compensava a desoneração de vários setores da economia."A solução fácil é trocar o ministro. A solução difícil é compreender que o ministro fez o correto", afirma, em entrevista à coluna.

Para Maia, o problema do governo não está na articulação política, mas no espaço dado pelo presidente Lula ao PT.

Com a experiência de quem foi o presidente mais longevo da história recente da Câmara, Maia diz que o presidente Lula ter optado por entregar todos os ministérios importantes do ponto de vista político ao PT, que tem 68 deputados entre 513, ignora a composição do Congresso.

Ele aposta que o deputado Arthur Lira (PP-AL), que reconhece como um dos presidentes mais fortes da história da Câmara, vai continuar tendo poder após o fim do mandato. A seguir a íntegra da entrevista:

O ministro Haddad está enfraquecido?

Há uma decisão política do governo (fim do teto de gastos, volta dos mínimos constitucionais de saúde e educação e aumento real do salário mínimo) que vai impactar em R$ 600 bilhões as despesas públicas em quatro anos e a capacidade do governo de tentar com o Congresso fechar essa conta pelo lado da receita está ficando cada vez mais claro que é praticamente impossível.
O setor privado está vendo que, do jeito que está, não apenas essa MP (que compensava a desoneração), mas outras medidas terão que aparecer para o governo poder cumprir a sua meta de déficit primário zero ou próximo a zero. O que se projeta para 2025 e 2026 é uma situação mais difícil que a de hoje, apesar de os dados da economia estarem positivos.

A troca do ministro está precificada?

Nós chegamos num ponto em que ou o governo vai repensar esses dois pontos (mínimos constitucionais e aumento real do mínimo) ou vai cada vez mais ser pressionado pela sociedade, pelos investidores. Está todo mundo olhando para frente e calculando que vai ficar uma situação muito difícil.

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Acho que o Haddad foi aquele que conseguiu minimamente construir um caminho para se gerar a possibilidade de uma solução. Agora, o Congresso e a sociedade não querem um aumento de carga tributária. A saída dele do governo seria muito pior, uma tragédia. Eu acho que o Haddad consegue ter uma relação de confiança com os atores econômicos, com as empresas, a indústria.

Qual a alternativa?

A solução é que a gente olhe os dados. Há um déficit da Previdência ainda, tem muitos temas que a gente deveria estar olhando. Por que a gente não investe fortemente na redução do contencioso tributário trabalhista, que encarece muito o custo das empresas no Brasil? Tem o contencioso tributário da renda. Podemos mexer na Lei do Simples e no lucro presumido. Tem empresas que faturam R$ 70 milhões e pagam 15% de imposto. O problema é que são medidas descasadas do processo eleitoral. Elas impactam no médio prazo, sempre mais longo do que a necessidade dos políticos.

Fico pensando como é que um país com 16% de capacidade de investimento não gera as condições de o setor privado gerar investimento.

Para aprovar qualquer medida é preciso ter articulação política e o ministro da área não conversa com o presidente da Câmara. Em que medida Haddad paga o preço por isso?

O governo não é só um ministro da articulação política. Foi todo mundo nomeado, ninguém foi eleito ministro. Os dois temas mais relevantes que impactam o orçamento estão dados. Esses números impactam o presidente Lula ou ele vai continuar achando que a situação do Brasil é igual à da Itália, do Japão ou dos Estados Unidos? Aí vale muito ler o artigo de Samuel Pessôa de algumas semanas atrás, em que ele mostra por que a situação do Brasil em relação a esses países não é como a que o presidente Lula descreve. Eu acho que não dá para comparar. A realidade é outra.

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Lula manter o Alexandre Padilha (ministro das Relações Institucionais) foi um erro ou um acerto?

O problema do governo na articulação não é esse. O problema é que os ministérios relevantes do ponto de vista político estão todos na mão do PT. O Palácio é todo do PT. O PT tem 68 de 513 deputados. Então, se você tirar o Padilha e colocar qualquer outro do PT, você vai ter os mesmos problemas. A decisão do presidente na formação do seu governo não converge com o que veio das urnas no parlamento. É um direito dele, mas isso, claro, gera um enfraquecimento do governo no parlamento, um menor comprometimento dos partidos que não estão no núcleo do poder. O problema está na decisão do presidente de formar um governo no qual o PT tem participação além do seu espaço no Congresso.

Qual o principal obstáculo para o Haddad hoje? O governo ou o PT?

Boa parte do PT acredita que a expansão de gasto público não necessariamente pode ser um problema. Eles acreditam que através do estado você transforma a vida das pessoas, enquanto que os liberais acreditam que quanto menos custo mais há orçamento livre para que as pessoas tomem suas decisões. É um debate ideológico, eu respeito, agora o que eu estou dizendo é que a situação do Brasil de hoje é diferente. O espaço para a política de aumento de carga tributária não existe.

A solução fácil é trocar o ministro. A solução difícil é compreender que o ministro fez o correto e, como ministro, teve que aceitar a decisão do governo de acabar com o teto de gastos e dar aumento real do salário mínimo, só que tudo isso gera um impacto total nas contas públicas e aí o Brasil está pagando o preço.

O governo e o PT têm feito fortes críticas à política de juros do BC...

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No governo Dilma o Banco Central reduziu a Selic sem muita base técnica e os juros futuros subiram. Então, a artificialidade não vai gerar bons resultados. O governo está disposto a bancar uma solução que garanta o superávit que ele mesmo propôs ou vai reafirmar a política de expansão dos gastos? Essa é uma decisão que precisa ser tomada porque as duas coisas não conversam.

Esse volume de despesa não tem como ser coberto, por mais que o Haddad tenha feito todo o esforço possível. Não tem como chegar naquilo que foi projetado. O que vai prevalecer? O Brasil precisa decidir mais com base em dados do que em experiência pessoal. Não pode ser "eu fui numa comunidade e vi uma situação e tomo uma decisão..."

Haddad está isolado no seu discurso?

Acho que tem que fortalecer o Haddad, de forma nenhuma trocar, mudar, enfraquecer, isolar. Reafirmar o que o Haddad tem defendido e ver de que forma se tem coragem de enfrentar o problema. Neste momento, essas políticas que aumentam despesa estão gerando mais problemas que soluções. O governo vai ter coragem de mudar isso ou vai dizer que a ampliação do gasto público é a solução para a economia brasileira?

A opção pelo segundo caminho...

Eu vejo o governo Dilma. Ela ampliou essa política de gasto público e o Brasil viveu dois anos de profunda recessão e não gerou resultados para a população mais pobre. Tem duas variáveis que impactam fortemente as despesas. Será que o governo está disposto a avaliar isso ou vai reavaliar a projeção de superávit primário?

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O presidente da CNA, João Martins, disse que não quer conversar com o presidente da República e falou em "desgoverno". O Rubens Ometto (Cosan) disse que onerar o setor produtivo não dá. O setor produtivo está perdendo a paciência?

Criticar uma decisão de um governo é um direito nosso. É a minha concepção de democracia. Agora, o presidente de uma confederação não é pessoa física. Representa um segmento. Se negar a dialogar não é bom para o setor.

Lula disse que os empresários e o Senado que agora encontrem uma solução para a MP (que compensava a desoneração da folha e foi devolvida)?

Temos R$ 600 bilhões de despesa criada pelo governo. O presidente Lula está incomodado, mas ele vai ter que decidir. A questão fiscal contamina o debate de qualquer outra área do governo. Não dá para transferir responsabilidade.

O senhor foi presidente da Câmara por dois mandatos e meio (Maia assumiu pela primeira vez com a renúncia de Eduardo Cunha). Entende que o Arthur Lira vai conseguir manter o poder que tem hoje quando o mandato dele acabar?

Há sempre a expectativa de fazendo o sucessor você mantém uma fatia maior de poder no Congresso. Arthur é um presidente muito forte e sempre será um ator muito relevante.

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O senhor o reconhece como um dos presidentes mais fortes que a Câmara já teve?

O resultado da eleição dele (Lira foi reeleito para comandar a Câmara no biênio 2023-2024 com 464 votos de 513) e a participação do Congresso no orçamento da República mostram isso.

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, é o nome hoje para enfrentar Lula em 2026?

O enfraquecimento da popularidade do governo de alguma forma antecipa projeções de cenários futuros para 2026. E é óbvio que num cenário polarizado qualquer nome que não tenha a rejeição do Bolsonaro será fortíssimo. Com essa perda de popularidade do presidente Lula, é natural que esse tema apareça. O (Roberto) Campos Neto como ministro é um tema completamente desnecessário nesse momento. Ele é um dos maiores presidentes que o BC já teve. Mas, no momento, o tema ainda é muito cedo.

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