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Camilo Vannuchi

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

O que pedir na virada do ano? Confira 7 sugestões

Colunista do UOL

29/12/2022 04h00

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O "não" a gente já tem. Então bora pedir. Vale mentalizar os pedidos enquanto pula sete ondas ou come doze uvas (guardando as sementes na carteira até o Réveillon de 2024). Faça uma lista, coloque no papel. Balbucie cada um deles como se fosse uma oração enquanto come lentilha ou escolhe a calcinha certa (ou a cueca) para a hora da virada: vermelho-paixão, amarelo-dinheiro, verde-esperança. Não faltam superstições para entrar o Ano-Novo com o pé direito (ou a pá virada). Por via das dúvidas, é prudente colocar todas em prática. Nunca se sabe qual vai vingar. O que não pode, em hipótese alguma, é deixar de fazer os pedidos para 2023. Seguem algumas sugestões.

1. Paz

Pode não ser original, e de fato não é, mas está para nascer um pedido de Ano-Novo tão popular. Neste ano, a obsessão ficou ainda maior. Foi tanto discurso de ódio e tanta violência gratuita (até nas igrejas!) que qualquer pequena redução no nível de agressividade da galera já será motivo de celebração.

Eleição polarizada coisíssima nenhuma! Não há simetria que possa justificar o absurdo dos assassinatos de Marcelo Arruda, em Foz do Iguaçu (PR), e de Bendito Cardoso dos Santos, em Confresa (MT), entre outros. Não há simetria que possa justificar um ex-deputado federal sair de casa atirando contra policiais federais que vieram para cumprir um mandado de busca e apreensão. Não há simetria capaz de passar pano para uma deputada que saca a arma e aponta para um homem negro, apoiador do candidato adversário, perseguindo-o pelas ruas do Jardim Paulista.

Para buscar a paz, não adianta ficar só esperando. É preciso correr atrás. Uma boa pedida é começar o ano pressionando a patriotada a largar mão de ser besta. Atenção, famílias, vaquinhas de presépio, cidadãos de bem, todos vocês: Desocupar as portas dos quartéis, desobstruir estradas, renunciar a qualquer hipótese de atentado, entregar as armas. Sentido!

2. Saúde

Pública, gratuita e de qualidade! E que não sejamos condenados a testemunhar a volta da pólio, da rubéola e da difteria, redivivas por causa da baixa cobertura vacinal. E que não nos faltem médicos nem oxigênio. E que venham mais vacinas para imunizar crianças de 6 meses a 2 anos contra o coronavírus. E que nenhum paciente seja chamado de maricas ou, comprometidas as funções respiratórias em razão de uma política de Estado genocida, seja acusado de fazer mimimi e ridicularizado por um presidente da República cretino. E que todos assistam ao filme "Quando falta o ar", de Ana Petta e Helena Petta, quando entrar em cartaz, em fevereiro.

3. Muito dinheiro no bolso

No bolso de quem precisa, e não no bolso de quem tem demais! Para isso, é preciso gerar emprego e retomar a política de valorização do salário-mínimo. Também é preciso pressionar parlamentares e sociedade civil por uma reforma tributária justa, solidária e sustentável. Um bom começo seria atualizar a tabela do imposto de renda, ampliando a faixa de isenção e tornando mais progressiva a tributação da renda e do patrimônio. É inaceitável que uma pessoa que recebe R$ 5.000 por mês seja taxada com a alíquota máxima do IR, a mesma que incide sobre quem ganha R$ 50.000 ou R$ 100.000.

A mesma coisa em relação ao grande patrimônio. Como comparação, o conjunto das 5 milhões de propriedades rurais existentes no Brasil recolheu, em 2021, cerca de R$ 2,4 bilhões em ITR, o imposto territorial rural, o que representou apenas 0,13% do total da receita arrecadada pela União: cinco vezes menos que os R$ 13,2 bilhões recolhidos de IPTU, o imposto predial e territorial urbano, apenas na cidade de São Paulo. Chega a ser um insulto saber que o Brasil é campeão mundial em exportação de soja e carne e que as gigantes do setor contribuam tão pouco com o Tesouro.

Outro tabu é a taxação das grandes fortunas, prevista na Constituição Federal de 1988. Bilionários, rentistas e grandes acumuladores conseguiram, com ajuda de setores da mídia, convencer a maior parte da população de que uma medida neste sentido causaria a fuga de divisas - como se fosse possível, por exemplo, colocar latifúndios e mansões num avião rumo a algum paraíso fiscal, e como se não houvesse meios de tributar remessas vultosas, bem como a compra de grandes valores em bitcoins, com a intenção de desestimular e impedir essas alternativas.

Finalmente, é preciso reduzir o peso da tributação sobre o consumo no conjunto da carga tributária nacional. Impostos sobre o consumo são excessivamente altos e muito injustos. Sabe aquela máxima segundo a qual quem tem mais deve pagar mais e quem tem menos deve pagar menos? Ela não existe no consumo de bens e serviços. Quem compra um micro-ondas, por exemplo, desembolsa 26% de IPI, o que representa cerca de R$ 125 num produto que é vendido por R$ 500. Esse valor é o mesmo para quem ganha R$ 1.300 por mês e para quem recebe mais de R$ 31.000. Ou seja: pesa muito mais no bolso de quem tem menos.

4. Mais amor, por favor

Qualquer maneira de amor vale a pena. Case. Descase. Trepe. Dê vexame. Saia do armário - ou dê uma rapidinha dentro dele. Distribua coraçõezinhos em todas as 318 postagens que ela publicou no Instagram em 2022. Transforme o crush em mozão. Invista. Declare-se. Ouse. Sem medo de ser feliz. Vale tudo, principalmente dançar homem com homem e mulher com mulher. Vale imbrochável ou meia bomba. Com tesão de 20. Com tensão de 50. Contusão de 80. Urubu, águia ou condor. Com Oscar ou Valdemar. Janja já e Lula lá. Por cima ou por baixo. Presencial ou virtual. Só não vale ser escroto, machista, homofóbico. Não é não. E não existe pintar um clima com menina de 14 anos. Talquei?

5. Mesa farta

São 33 milhões de brasileiros com fome e 61 milhões sem garantia de que terão alimento amanhã. São 33 milhões de brasileiros com fome e 61 milhões sem garantia de que terão alimento amanhã. São 33 milhões de brasileiros com fome e 61 milhões sem garantia de que terão alimento amanhã. São 33 milhões de brasileiros com fome e 61 milhões sem garantia de que terão alimento amanhã. São 33 milhões de brasileiros com fome e 61 milhões sem garantia de que terão alimento amanhã.

6. Maior dedicação à família

Lembre-se: qualquer família. Um homem e uma mulher: família. Um homem, uma mulher e cinco crianças: família. Um homem, uma mulher e dois gatos: família. Um homem e uma criança: família. Duas mulheres e duas crianças: família. Duas mulheres e uma criança: família. Duas mulheres: família. Dois homens e nenhum segredo: família. Dois homens e uma Harley-Davidson: família. Dois homens, um gim-tônica e uma faixa pedindo intervenção militar já: família. Zero-um, Zero-dois, Zero-três e Zero-quatro: família (dizem que a mais protegida por um pai na face da Terra).

7. Viagens

Que venham muitas e que elas sejam incríveis! Se já tem presidente da República declarando publicamente que vai inaugurar o gravíssimo precedente de não transmitir a faixa para o sucessor - um postulado da nossa democracia - a fim de picar a mula para os Estados Unidos, eventualmente para se safar de uma possível prisão cautelar, por que raios você também não pode viajar para onde der na telha, na hora que bem entender? Recomenda-se que, entres os destinos programados para 2023, você não deixe de incluir uma breve jornada para dentro de si.

PS: Se ainda sobrar energia para mais algum pedido, cogite se juntar a mim na torcida pela quebra dos sigilos de 100 anos, pela volta da Comissão Especial Sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, por uma nova regulação dos meios de comunicação e das big techs e para que os aeroportos voltem a ficar com cara de rodoviária.