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Torturador na ditadura, coronel Brilhante Ustra vai se safar outra vez?
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Previsto para a última terça-feira (20), o julgamento no STJ (Superior Tribunal de Justiça) do notório torturador coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra foi adiado para agosto, após o recesso de julho.
A quarta turma do tribunal deverá analisar recurso movido por Ângela Mendes de Almeida e Regina Maria Merlino Dias de Almeida, respectivamente viúva e irmã do jornalista Luiz Eduardo da Rocha Merlino, torturado até a morte no DOI-Codi de São Paulo, aos 23 anos, em 1971. O caso chegou à terceira e última instância em 2019 e deveria ter tido um desfecho nessa semana, conforme agenda oficial da casa, mas o tribunal não teve tempo de incluir a análise na última sessão.
Quando Merlino foi morto, o epicentro da repressão paulista era comandado por Ustra, que participava pessoalmente das sessões de choque e pancadaria, conforme relatos de dezenas de ex-presos políticos. Com base nesses testemunhos, Ustra foi o primeiro torturador condenado no Brasil, ainda em 2010, numa ação declaratória: ou seja, nada de prisão ou multa, mas sim a decisão legal de que ele pode (e deve) ser chamado de torturador. Oficialmente. É esta decisão que permite a este colunista chamá-lo de torturador sem risco de processo por calúnia ou difamação.
Mais ou menos na mesma época da sentença declaratória, viúva e irmã moveram também uma ação por danos morais contra o coronel. Elas pedem uma indenização simbólica de R$ 50 mil cada uma. Novamente, nada de prisão ou outra sanção prevista no direito penal, mas sim o pagamento de um valor à família da vítima e, mais importante, a marca emblemática da condenação.
Segundo juristas ouvidos pela Deutsche Welle Brasil em reportagem publicada no UOL, a condenação de Ustra seria não apenas um gesto de reparação histórica mas também um aceno para o futuro, "uma decisão fundamental por sinalizar que a tortura não deve ser uma prática aceita no Brasil.
Desde então, o processo claudica nas esferas jurídicas. Ustra foi condenado em primeira instância, em 2012, mas a sentença da juíza Claudia de Lima Menge foi reformada em 2018 pelo Tribunal de Justiça paulista. Por três votos a zero, os desembargadores absolveram Ustra, entendendo que o processo havia caducado após a morte do coronel-torturador, em 2015.
A jurisprudência diz outra coisa: ações por danos morais são comumente assumidas pelos herdeiros. Na impossibilidade de cobrar do réu, cobra-se do espólio, até o limite da capacidade financeira do herdeiro. É o que afirmam quatro professoras de direito da Unifesp e da FGV — Carla Osmo, Flavia Püschel, Luisa Plastino e Maria Cecília Asperti — em artigo publicado na coluna do Leonardo Sakamoto.
Espera-se de que o Judiciário não passe pano mais uma vez para os crimes — imprescritíveis e inanistiáveis — cometidos por aquele finado senhor que, entre outras perversões, foi portador do título de ídolo máximo de certo ex-presidente da República envolvido em conspirações golpistas, falsificações de documentos e tráfico de diamantes.
Ainda na última terça-feira, horas antes do adiamento da análise pelo STJ, uma novidade fez acender um sinal de alerta entre familiares de Merlino e cidadãos que acompanham o caso. Por meio de uma petição enviada ao relator, ministro Marco Buzzi, o subprocurador geral da República, Antonio Carlos Martins Soares, requereu o adiamento da sessão com base no regimento interno do STJ.
Em nome do Ministério Público Federal, Soares reivindica o direito de se manifestar na qualidade de custos legis, ou seja, como uma espécie de fiscal da lei. Tal petição teria o condão — ou o agravante — de empatar os trabalhos da quarta turma do STJ no caso por mais uma temporada, até que o subprocurador tenha "passado vistas" nos processos.
Em 2019, Martins Soares foi apontado como o preferido de Bolsonaro para assumir a Procuradoria-Geral da República após o término do mandato de Raquel Dodge. Na ocasião, setores da imprensa informaram que Soares teria sido indicado pelo senador Flávio Zero Um e seu advogado, Frederick Wassef, famoso por intimidar jornalistas. O subprocurador da República, que já teria sido investigado por forjar assinatura, nega.
Que venha agosto e, com ele, o próximo capítulo desse filme de terror que já se arrasta por 52 anos. Sinistro Ustra vai se safar outra vez?
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