Carlos Madeiro

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Trabalhador negro denuncia que foi despido, algemado e torturado em fazenda

O trabalhador rural negro Deleon Rodrigues, 37, denunciou à polícia que foi despedido, algemado e trancado em um cômodo escuro para ser espancado por seguranças da fazenda Santa Colomba, no município de Cocos (a 778 km ao sul de Salvador), na última quarta-feira (11).

Deleon é morador do território quilombola de Tijuaçu, em Senhor do Bonfim (a 941 km de Cocos), e estava trabalhando na produção de tabaco do grupo. Em um vídeo, colegas dele mostram que o quilombola foi encontrado algemado, com hematomas e apenas de cueca após a agressão.

A coluna pediu por email um posicionamento da fazenda sobre a acusação, mas não obteve resposta até a publicação deste texto.

A Polícia Civil afirmou que o caso está sendo apurado na 1ª Delegacia Territorial como tortura. "A vítima foi ouvida e foram expedidas as guias de exames periciais. O caso será investigado pela unidade territorial de Cocos e acompanhado pelo Departamento de Proteção à Mulher, Cidadania e Pessoas Vulneráveis."

O que ocorreu, segundo o trabalhador rural

Na quarta-feira à tarde, ele afirma que voltava da cidade para a fazenda junto com outros trabalhadores que foram para receber o pagamento em um ônibus.

Na volta, segundo Deleon, o veículo foi parado na guarita da fazenda, e todos os trabalhadores foram revistados. Ele afirma que o que teria irritado os seguranças foi o fato dele levar consigo uma pequena garrafa com cachaça.

Nós sempre paramos na guarita para o pessoal vigiar nossas bolsas. Eu vinha trazendo um potinho de plástico descartável de pinga. Eu me alterei um pouco com o que ocorreu porque, logo que começou, me algemaram e depois me levaram para um quarto, que eu achava que era um túnel. Fiquei lá 20 minutos preso. O jeito foi quebrar a porta.
Deleon Rodrigues, trabalhador rural

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Trabalhador rural negro mostra marca de agressão
Trabalhador rural negro mostra marca de agressão Imagem: Arquivo pessoal

O trabalhador conta que dentro do local teve as roupas arrancadas. No cômodo escuro, foi espancado nas costas com algum objeto rígido —que não soube identificar precisamente.

Indignados, outros colegas trabalhadores viram o estado que Deleon saiu e começaram a filmar a condição que ele estava: apenas de cueca e ainda com os braços para trás presos pelas algemas.

"O que eles fizeram, fazem com qualquer um", diz um dos trabalhadores no momento em que Deleon é filmado apenas de cueca com algemas. No vídeo, Deleon ainda conta chorando que pediu várias vezes socorro de dentro do cômodo.

Marcas nas costas do trabalhador rural espancado em Cocos (BA)
Marcas nas costas do trabalhador rural espancado em Cocos (BA) Imagem: Arquivo pessoal

Exame comprova marcas de agressão

A violência deixou marcas no seu corpo, como mostram fotos e o exame feito na UPA da cidade.

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O advogado da vítima, David Mendes, enviou nesta segunda-feira à coluna o boletim de ocorrência feito contra a fazenda. Ele relata que as algemas só foram retiradas quando ele conseguiu fugir do recinto.

Ele afirma que a polícia aceitou, para registro inicial, o prontuário médico da unidade de saúde e emitiu uma guia de perícia para que faça um exame de corpo de delito na quarta-feira.

Foi mais uma manifestação de racismo estrutural. Na Bahia, isso acontece de forma sistêmica, com violações de direitos e omissão dos poderes públicos.
David Mendes, advogado

Além da apuração policial, o advogado explica que vai entrar com duas ações judiciais: uma pelo pagamento dos direitos trabalhistas e dano moral pela agressão e tortura; e outra com pedido de indenização por danos morais coletivos.

A gente entende que esse fato, e a repercussão que ele teve, nos remete ao Brasil escravocrata, o que ofender de maneira notória a honra e a dignidade todo povo negro.
David Mendes

Marca de algemas em trabalhador rural agredido em fazenda em Cocos (BA)
Marca de algemas em trabalhador rural agredido em fazenda em Cocos (BA) Imagem: Arquivoi pessoal
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Revolta

A agressão a Deleon também revoltou o movimento negro na Bahia. Além da agressão em si, outro fato simbólico por ele ser de Senhor do Bomfim: é o município com mais quilombolas no Brasil.

Foi uma tortura muito grande. Ali está o racismo escancarado: retiraram a roupa dele e o açoitaram do mesmo jeito que fazia na época da escravidão. Nosso povo está sempre viajando para trabalhar por falta de oportunidades aqui, e é assim que tratam nosso povo. O caso dele não é isolado
Valmir dos santos, líder do quilombo Tijuaçu e coordenador-executivo da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos)

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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