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Jamil Chade

REPORTAGEM

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Zelensky diz a Amorim que só plano ucraniano para paz vai parar russos

Celso Amorim e Andrij Melnyk, vice-chanceler da Ucrânia, em Kiev - Reprodução/Twitter/Andrij Melnyk
Celso Amorim e Andrij Melnyk, vice-chanceler da Ucrânia, em Kiev Imagem: Reprodução/Twitter/Andrij Melnyk

Colunista do UOL

11/05/2023 04h33Atualizada em 11/05/2023 13h04

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Em reunião com o assessor especial para política externa do Brasil, Celso Amorim, o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, afirmou que apenas o plano de paz proposto por Kiev pode colocar um fim ao conflito militar contra a Rússia. Nas redes sociais, o ucraniano comentou na manhã de hoje o encontro que manteve com o enviado do governo Lula no dia anterior.

"Encontrei o assessor especial de assuntos internacionais da presidência do Brasil, Celso Amorim", escreveu. "Enfatizei que o único plano capaz de parar a agressão russa na Ucrânia é a Fórmula de Paz Ucraniana", disse. "Falamos sobre a possibilidade de realizar uma cúpula Ucrânia-América Latina. Espero continuar o diálogo com o presidente Lula e recebê-lo na Ucrânia", completou Zelensky.

O plano ucraniano é rejeitado pelos russos e é visto com desconfiança por chineses e outros atores internacionais. Em março, quando Lula e Zelensky conversaram pelo telefone, o ucraniano pediu o apoio do brasileiro ao projeto. Mas Lula deixou claro que nenhum acordo de paz é assinado a partir de projetos unilaterais.

Pelo plano de Kiev, qualquer cessar-fogo apenas deve ser negociado com a retirada completa das tropas russas de seu território.

Sobre o convite para que o presidente brasileiro visite a capital ucraniana, Lula já havia sinalizado que o momento já chegaria em seu mandato para que a viagem se justificasse, não dando qualquer espaço no momento para o encontro. No Planalto, o fato de Zelensky ter citado em seu post o convite a Lula foi interpretado como pressão vinda de Kiev.

Durante a reunião em Kiev nesta semana, a Ucrânia ainda anunciou que voltará a ter um embaixador no Brasil, mas o país é cético sobre a vontade política do russo Vladimir Putin de restabelecer canais de diálogo para tentar encontrar uma saída pacífica para a guerra.

Esses foram alguns dos principais resultados da conversa mantida entre o assessor especial para política externa do Brasil Celso Amorim e o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. O encontro foi relatado com exclusividade ao UOL.

Ontem, o assessor especial da presidência viajou para Kiev, num gesto claro para tentar demonstrar que o Brasil quer manter o diálogo com com todas as partes envolvidas no conflito. O brasileiro é uma das raras personalidades políticas que esteve tanto com Putin como com Zelensky, em suas respectivas capitais.

Durante a visita, Amorim entregou uma carta de Lula, na qual o brasileiro insiste em colocar o Brasil à disposição para buscar um caminho para frear o conflito armado que ameaça a segurança internacional.

A viagem ocorre num momento em que o governo brasileiro vinha sendo pressionado por parceiros Ocidentais diante de comentários de Lula de que americanos e europeus teriam responsabilidade pela prolongação da guerra, além de suas sugestões de que Kiev terá de abrir mão de certas reivindicações. Nos últimos dias, Lula tem adotado um discurso mais alinhado com os europeus, ainda que mantenha a perspectiva de que apenas uma saída diplomática pode encerrar a crise.

Nas conversas nesta semana, os ucranianos destacaram que a proposta brasileira era bem-vinda. Mas se mostraram céticos sobre a real disposição do governo Putin em um engajamento real para encontrar uma saída. Ao embaixador Amorim, os ucranianos alertaram que o Kremlin não teria um interesse pela paz e que não negociariam em boa-fé.

Amorim havia escutado um argumento semelhante da parte de Putin, quando esteve em Moscou em abril. Os russos alegaram que eram os ucranianos quem não queriam a paz.

Numa apresentação feita à delegação brasileira, os ucranianos ainda citaram a necessidade de Kiev por munições e armamentos. Mas não fizeram um pedido específico ao Brasil. O governo Lula já havia rejeitado o envio de armas.

Durante a apresentação, Kiev ainda destacou como a guerra estava tendo um impacto ambiental e humanitário, numa tentativa de se aproximar a temas que fazem parte da agenda internacional do Brasil.

Nova relação e mea culpa

Durante o encontro, Amorim ainda comunicou ao presidente ucraniano que o governo brasileiro estava dando o sinal verde para o nome proposto por Kiev para o envio de um novo embaixador ao Brasil. Os ucranianos estavam sem embaixador no país desde 2021 e a relação entre os dois países era feita apenas por um encarregado de negócios. Em termos diplomáticos, isso era um sinal de um distanciamento.

Agora, quem ocupará a embaixada ucraniana em Brasília será Andrij Melnyk, o atual vice-ministro de Relações Exteriores. Nas redes sociais, ele destacou a importância do Brasil e indicou que o país poderia ter "um papel importante para parar a agressão russa". Antes de sua função em Kiev, Melnyk havia sido embaixador da Ucrânia na Alemanha, um dos cargos de maior prestígio na diplomacia de Kiev,

Entre os temas destacados, Kiev quer voltar a manter uma cooperação com o Brasil em temas como armamento e retomar a relação com a América Latina, abandonada pelos ucranianos nos últimos anos.

Durante a reunião, Kiev fez uma espécie de mea culpa, admitindo que sua diplomacia abandonou a relação com os países latino-americanos.

Kiev ainda destacou como o Brasil foi o único país latino-americano que manteve sua embaixada na capital ucraniana - depois de um breve período transferida para o oeste do país. Os ucranianos também elogiaram o voto do Brasil na Assembleia Geral da ONU, apoiando uma resolução europeia que condenava a agressão russa.

Para chegar até a capital ucraniana, a delegação brasileira foi obrigada a viajar em um trem por doze horas, entre a fronteira da Polônia e Kiev. Segundo a delegação, a cidade dá ares de normalidade, apesar da forte segurança nas proximidades dos prédios do governo.

A missão apenas ocorreu graças a uma coordenação estreita entre o Itamaraty e o Palácio do Planalto, na organização da logística, com diplomatas brasileiros sediados em Kiev tendo ido até a fronteira entre Ucrânia e Polônia para receber a delegação.