Jamil Chade

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Opinião

O dia em que Le Pen tentou me convencer que não era racista

Morto nesta terça-feira, Jean-Marie Le Pen me recebeu em sua casa em 2002. Eu tentava entender quem era aquele personagem que, antes mesmo da onda de extrema direita no mundo, ganhava a simpatia de uma ala reacionária da sociedade.

Mas foi o diálogo que tivemos sobre racismo e xenofobia que demonstrou quem ele era. Depois de falar sobre política externa, sobre a situação da França e da União Europeia, perguntei a ele se era racista.

Sua resposta foi imediata: "Claro que não".

Num terno negro e sentado ao meu lado no sofá, se aproximou e sussurrou: "Tenho até uma empregada polonesa, como vou ser racista?"

Naquele momento, o grande debate na Europa Ocidental era o que fazer com o Leste Europeu e a suposta invasão que ocorreria se o bloco fosse ampliado.

Pai de Marine Le Pen, o líder da extrema direita francesa conduziu a campanha de Jean-Louis Tixier-Vignancour em 1965. Era uma tentativa de reabilitar os colaboracionistas franceses. Mas foi seu partido criado em 1972, o Front National, que serviria de plataforma para seus disparates e para as ideias neofascistas.

Ao longo dos anos, porém, sua retórica ganhou cada vez mais força. Em 1974, ele recebeu apenas 0,7% dos votos na eleição para presidente. Mas a crise dos anos 80 jogou seu grupo para dentro do Parlamento Europeu e para Assembleia Francesa.

Ele ainda participou nas eleições presidenciais de 1988, 1995 e, em 2002, recebeu 16% dos votos. Um milhão de franceses foram às ruas rejeitar aquele avanço da extrema direita.

Crimes nazistas relativizados

Le Pen ficaria conhecido ainda por sua tentativa de relativizar os crimes nazistas. Segundo ele, as câmaras de gás nos campos de concentração eram apenas "detalhes" da história. Discursou em apoio ao colaboracionista Philippe Pétain.

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Ao longo de seus anos de vida, ele questionou se Obama era realmente negro, disse que a decadência da França começou com a Declaração de Direitos Humanos e criticou a presença de muitos negros na seleção francesa que ganhou a Copa de 1998.

Segundo ele, ser homossexual não seria um crime. Mas uma "anomalia biológica".

Oficialmente, sua filha abandonou algumas de suas frases e mantras, na esperança de ganhar mais votos. Mas a extrema direita nunca deixou de tê-lo como referência.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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