Moradia, consumo e direitos no cotidiano das favelas
Uma ideia injusta e equivocada ainda pesa sobre os moradores das favelas: a de que querem viver à margem, sem pagar impostos ou pelos serviços básicos de que precisam.
Os moradores de favelas são consumidores como quaisquer outros. Cada produto adquirido na mercearia da esquina, no supermercado, ou até mesmo pela internet carrega uma carga tributária embutida. Desde o pão até o gás de cozinha, tudo que consomem vem acompanhado de impostos. É uma contradição acusar de "não pagadores" pessoas que contribuem para a economia e a arrecadação do país todos os dias.
Além disso, quando o morador busca por água e energia, ele deseja pagar um serviço de qualidade e dentro das normas, como qualquer cidadão. A busca por dignidade, respeito à cidadania e ao direito à cidade é algo que toda a sociedade deveria buscar, pois esses são direitos fundamentais de todos, independentemente de onde vivem.
Regularizar para avançar
A regularização fundiária não é apenas um sonho; é um meio de transformação. Quando uma casa é regularizada, o morador ganha mais do que um endereço formal: ele ganha dignidade, segurança jurídica, e, acima de tudo, a possibilidade de transformar o imóvel em uma ferramenta de desenvolvimento.
Um título de propriedade abre portas para financiamentos bancários. Um microempreendedor que vive na favela pode usar sua casa como garantia para ampliar seu pequeno negócio. Uma família pode reformar o lar, melhorar as condições de vida, e até gerar empregos locais com pequenas reformas.
Porém, essa transformação depende de políticas públicas consistentes. É fundamental que o poder público implemente programas amplos e acessíveis de regularização, além de garantir a oferta de infraestrutura básica, como saneamento, energia e iluminação pública. Essas ações não só promovem qualidade de vida, mas também geram inclusão econômica e social para os moradores.
Outro aspecto pouco discutido é a valorização das favelas ao longo do tempo. Áreas antes ignoradas passam a ser cobiçadas pelo mercado imobiliário. Essa valorização, porém, traz consigo um novo desafio: ações judiciais que ameaçam o direito à moradia.
É irônico que, no momento em que a favela passa a ser vista como um ativo valioso, os moradores enfrentem a ameaça de remoção. O direito à moradia é fundamental e precisa ser protegido, especialmente quando ações legais em desfavor das famílias mais vulneráveis colocam em xeque décadas de luta por um teto digno.
Compreender para comunicar
Quando falamos de favelas, compreender as dinâmicas sociais locais é essencial para criar ações de comunicação efetivas. A favela não é uma massa homogênea, mas um mosaico cultural rico e diverso. A valorização da cultura local, a escuta ativa dos moradores e o empoderamento constante de criadores, produtores e articuladores locais são pilares para campanhas de impacto.
Isso não é apenas uma questão de responsabilidade social, mas de eficácia. Campanhas que envolvem e respeitam os protagonistas locais geram impacto social e comercial relevantes. Elas dialogam com a comunidade em sua linguagem, respeitando seus códigos culturais e suas formas de organização, enquanto constroem uma conexão verdadeira entre marcas, poder público e moradores.
Desafiar os estereótipos sobre as favelas é reconhecer sua potência. Elas não são um peso para a sociedade; são uma fonte de riqueza cultural, econômica e social. Por trás de cada casa, há histórias de superação, resiliência e um desejo constante de contribuir para a sociedade de maneira igualitária.
Está na hora de desconstruir narrativas ultrapassadas e enxergar a favela como o que ela é: um espaço de vida, de sonhos e de possibilidades. E isso só será possível quando colocarmos os moradores no centro das decisões, sejam elas sociais, econômicas ou de comunicação.
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