Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Com cloroquina em baixa, Bolsonaro lança spray
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Houve um tempo em que os carnavais eram animados à base de lança-perfume. Vinham em frascos de metal e de vidro. A grande dúvida do folião era se levaria seu suprimento de animação num recipiente parecido com uma granada ou numa ampola de vidro, que permitia saber quando a munição estava acabando. Neste Carnaval de 2021, cancelado pelo vírus, Jair Bolsonaro desfilou nas redes sociais uma fantasia nova: um spray nasal capaz de deter a Covid.
O Rio de Janeiro informou que terá de interromper a vacinação na Quarta-Feira de Cinzas. Acabou a vacina. No mesmo dia, governadores se reunirão com o general Eduardo Pazuello, suposto ministro da Saúde, para cobrar um cronograma de distribuição de novas doses de vacina. A escassez é nacional. Simultaneamente, o ministro Ricardo Lewandowski determinou a realização de diligências que rebaixam a cloroquina do patamar de elixir milagroso para a condição de caso de polícia.
Num país normal, o presidente estaria em Brasília discutindo com sua equipe formas de atenuar a crise sanitária que mata os brasileiros e sufoca a atividade econômica. Mas no Brasil carnavalizado de Bolsonaro, o presidente desfila de moto aquática, promovendo aglomerações virais nas praias catarinenses. Numa hora vaga, Bolsonaro plugou-se no Twitter para borrifar sua nova idiossincrasia na cara dos brasileiros.
"EXO-CD24 é um spray nasal desenvolvido pelo Centro Médico de Ichilov, em Israel, com eficácia próxima de 100%, em casos graves, contra a Covid", anotou Bolsonaro. "Brevemente será enviado à Anvisa o pedido de análise para uso emergencial do medicamento."
O spray que encantou Bolsonaro foi desenvolvido para o tratamento de câncer no ovário. Foi testado em 30 pacientes com Covid. Diz-se que ajudou na recuperação. Mas a ensaio clínico é incipiente, o número de cobaias é ínfimo, não houve acompanhamento pós-hospitalar, os resultados não foram publicados. Quer dizer: não há comprovação científica do efeito do spray no combate ao coronavírus.
Ao anunciar que a Anvisa logo receberá um pedido de uso emergencial do spray, Bolsonaro desperta nos brasileiros mais velhos —esses que aguardam na fila da vacina— uma certa nostalgia do lança-perfume. Travava-se uma guerra diferente nos Carnavais de outrora. Os alvos principais eram as costas nuas das odaliscas. Quando necessário, disparavam-se jatos de lança-perfume nos olhos do inimigo.
Além de provocar calafrio nas meninas e de embaçar a vista dos adversários, o lança-perfume dava um barato. Cheirava-se o éter perfumado para combater a inibição. Hoje, sem vacinas, Bolsonaro inaugura o segundo ano de pandemia trocando a cloroquina pelo spray israelense. O lança-perfume animava. O spray Covid desespera.
É como se o presidente adotasse o modelo Zé Keti de administração da pandemia. Se a Anvisa entra na dança e libera o spray israelense, "este ano não vai ser igual àquele que passou". Resta saber até quando haverá "mil palhaços no salão."
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