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Ernesto Araújo abre nova crise com o Congresso
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Em meio a uma pressão do Congresso por sua demissão, o chanceler Ernesto Araújo esticou a corda. Abriu nova crise com o Legislativo ao insinuar que a articulação para retirá-lo do comando do Itamaraty não tem relação com vacinas, mas com os interesses da empresa chinesa Huawei, sob ameaça de ser banida da disputa pela implantação da tecnologia 5G no Brasil.
Mencionada por Araújo em posts veiculados nas redes sociais, a senadora Kátia Abreu (PP-TO), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado, chamou o chanceler de "marginal."
"O Brasil não pode mais continuar tendo, perante o mundo, a face de um marginal", disse Kátia. "Alguém que insiste em viver à margem da boa diplomacia, à margem da verdade dos fatos, à margem do equilíbrio e à margem do respeito às instituições. Alguém que agride gratuitamente e desnecessariamente a Comissão de Relações Exteriores e o Senado Federal."
Em pleno domingo, Araújo foi às redes sociais para comentar almoço que teve com Kátia Abreu, em 4 de março. Escreveu que a conversa foi "cortês". E acrescentou: "Pouco ou nada falou de vacinas. No final, à mesa, disse: 'Ministro, se o senhor fizer um gesto em relação ao 5G, será o rei do Senado." Não fiz gesto algum."
Após insinuar que a senadora estava a serviço do lobby da companhia chinesa, Araújo anotou num segundo post: "Desconsiderei a sugestão inclusive porque o tema 5G depende do Ministério das Comunicações e do próprio presidente da República, a quem compete a decisão última na matéria."
"É uma violência resumir três horas de um encontro institucional a um tuíte que falta com a verdade", respondeu Kátia Abreu. "Em um encontro institucional, todo o conteúdo é público."
A senadora disse ter defendido junto ao chanceler a tese segunda a qual "os certames licitatórios não podem comportar vetos ou restrições políticas." No caso do leilão do 5G, disse ela, "devem prevalecer os critérios de preço e qualidade." A senadora recorda que expôs seu ponto de vista sobre o tema em artigo intitulado "O Céu é o Limite", publicado na edição de 21 de março da Folha.
Kátia disse ter alertado Araújo sobre os "prejuízos que um veto à China na questão do 5G poderia acarretar às nossas exportações, especialmente do agronegócio, que vem salvando o país há décadas." Declarou que falou também sobre meio ambiente. Disse a Araújo que "a questão do desmatamento na Amazônia deve ser profundamente explicada ao mundo, para evitar mais danos comerciais ao Brasil."
Araújo mirou em Kátia e acertou no Legislativo. Presidente do Senado e do Congresso Nacional, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) foi às redes sociais. "A tentativa do ministro Ernesto Araújo de desqualificar a competente senadora Kátia Abreu atinge todo o Senado Federal. E justamente em um momento que estamos buscando unir, somar, pacificar as relações entre os Poderes", escreveu Pacheco. "Essa constante desagregação é um grande desserviço ao país."
Presidente nacional do PP, o senador Ciro Nogueira foi às redes sociais para lamentar que Araújo borrife gasolina numa fogueira que deveria ajudar a apagar: "No momento em que há um grande esforço para a pacificação e o entendimento, lamento muito que justamente o responsável por nossa diplomacia venha criar mais um contencioso político para as instituições", escreveu Nogueira. "O Brasil e o povo brasileiro não merecem isso."
Sem meias palavras, Kátia Abreu defendeu a demissão do chanceler: "Temos de livrar a diplomacia do Brasil de seu desvio marginal." Para a senadora, se um chanceler age dessa forma marginal com a presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado da República de seu próprio país, com explícita compulsão belicosa, isso prova definitivamente que ele está à margem de qualquer possibilidade de liderar a diplomacia brasileira."
Ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) solidarizou-se com Kátia Abreu. E ecoou a pregação pela saída de Araújo: "De fato este ministro já deveria ter saído. É um irresponsável."
Nesta semana, a pressão para que Bolsonaro demita o chanceler aumentará. O coro inclui as vozes do deputado Arthur Lira e do senador Rodrigo Pacheco, presidentes da Câmara e do Senado.
O agravamento da pandemia arrastou Araújo para o centro da crise sanitária. Boa parte do Legislativo responsabiliza o governo Bolsonaro pela escassez de vacinas. Por pressão do centrão, o presidente teve de demitir o general Eduardo Pazuello, substituído no Ministério da Saúde pelo cardiologista Marcelo Queiroga. Agora, Bolsonaro é espremido para se livrar do chanceler.
Disseminou-se pelo Legislativo a convicção de que a diplomacia de Araújo tem pés de barro. Com uma retórica envenenada pela ideologia e pelas idiossincrasias de Bolsonaro, Araújo produziu atritos que dificultam obtenção de vacinas.
O chanceler se indispôs, por exemplo, com a China, fornecedora de vacinas e do insumo para a produção dos únicos imunizantes à disposição dos brasileiros: a CoronaVac, fornecida pelo Butantan, e a de Oxford, distribuída pela Fiocruz.
O Brasil ambiciona também obter um excedente de vacinas que os Estados Unidos compraram e não devem usar. Os defensores da demissão de Araújo alegam que a devoção do chanceler brasileiro a Donald Trump o descredencia para dialogar com a administração Joe Biden. Na semana passada, ao tentar se explicar numa sessão do Senado, Araújo ouviu de vários senadores o conselho de que deixe o cargo.
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