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Josias de Souza

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Em vez de presidir, Bolsonaro 'despreside' o país

Colunista do UOL

24/05/2021 09h30

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No meio científico, a terceira onda da pandemia ainda divide opiniões. Parte dos especialistas acha que ela já começou, outro grupo avalia que ela está por vir. Na política, não há nenhuma dúvida: Bolsonaro surfa há tempos a terceira onda de sua irresponsabilidade sanitária. Depois de receitar cloroquina e travar a aquisição de vacinas, o presidente dedica-se a favorecer a proliferação do vírus. Desde o início de abril, realizou 14 viagens. Seus deslocamentos se transformam em atos mal disfarçados de campanha eleitoral e atentados escancarados às normas sanitárias.

Há um quê de sadismo no comportamento de Bolsonaro. No comando de um país atormentado pela doença, em vez exercer a honrosa função de presidente da República, o capitão como que "despreside" o Brasil. Leva às fronteiras do paroxismo o prefixo 'des', que dá às palavras um sentido contrário. Bolsonaro desqualifica a ciência, desdiz as normas do Ministério da Saúde, ameaça editar um decreto para desfazer o que os Estados fazem.

Um presidente de verdade, unificaria o país, pacificando-o. Visitaria não os palanques, mas os hospitais. Renderia homenagens a médicos e enfermeiros. Confortaria as famílias dos mortos. Pregaria a vacinação. O "despresidente" Bolsonaro faz tudo ao contrário. Muitos imaginam que o inquilino do Planalto sofre de insanidade. Engano. Ele aproveita cada segundo dela.

No domingo, a insanidade de Bolsonaro foi compartilhada por Eduardo Pazuello. Depois de se notabilizar por ter feito o pior no Ministério da Saúde o melhor que pôde, o general produz constrangimentos em série. Ao participar do comício fora de época ao lado de Bolsonaro, Pazuello avacalhou o Exército, escarneceu da CPI da Covid e espremeu os próprios calos.

Para se livrar da avacalhação, o comando do Exército precisa punir Pazuello. Do contrário, transformará em peças sem nexo o Estatuto dos Militares e o Regulamento Disciplinar do próprio Exército, que proíbem a participação de militares da ativa em manifestações políticas.

Em resposta ao escárnio do general, a CPI terá de reconvocar Pazuello. Não há outra coisa a fazer senão confrontar o general com as mentiras às quais ele se acorrentou para blindar Bolsonaro. Punido pelo Exército e enquadrado pela CPI, Pazuello talvez perceba que quem tem tantos calos como ele não deveria se meter em apertos.