Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Corrosão de Bolsonaro ganha ares de fenômeno irreversível, indica Datafolha
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Não é que a imagem esboçada pela pesquisa do Datafolha tenha revelado que a maioria dos brasileiros passou a enxergar Bolsonaro como um político igual a todos os outros. A coisa é bem pior do que isso. O Bolsonaro que aparece na mais recente sondagem do instituto é completamente diferente de si mesmo —ou do mito fabricado por ele para ludibriar o eleitorado em 2018.
A má notícia para Bolsonaro é que parte dos brasileiros que o avaliavam como um presidente regular passaram a classificá-lo como ruim ou péssimo. Sua taxa de reprovação bateu em notáveis 51%, a pior marca desde a posse. A péssima notícia para o presidente é que sua figura já não transmite à maioria dos brasileiros nada que se pareça com uma simbologia positiva.
A maioria dos entrevistados do Datafolha considera Bolsonaro incompetente (58%), desonesto (52%), pouco inteligente (57%), falso (55%), indeciso (57%), autoritário (66%) e despreparado para o exercício do cargo de presidente (62%). É uma sequência de perder o fôlego. E os votos.
Um governante que estivesse empenhado em melhorar a própria imagem teria dificuldades para estancar um desgaste tão disseminado. Um presidente como Bolsonaro, que fez opção preferencial pelo erro, dá à corrosão detectada pelo Datafolha a aparência de um fenômeno irreversível. Político que arranca a máscara do rosto de criança em plena pandemia deixa-se infectar pelo vírus da insanidade.
Depois de perder a pose e o asfalto, Bolsonaro perdeu o pouco que lhe restava de discurso. Dedica-se a fornecer matéria-prima para uma CPI que já migrou do negacionismo anticientífico para a corrupção no Ministério da Saúde. Arthur Lira e Augusto Aras podem salvar o mandato do capitão. Mas cada vez que o antiprocurador-geral e o réu que preside a Câmara precisam acionar o sistema de blindagem enferrujam um pouco mais a imagem do protegido.
Autoconvertido em ministro da reeleição, Paulo Guedes diz a Bolsonaro que a economia e o novo Bolsa Família o salvarão. Em condições normais, faria sentido. Num cenário em que se misturam mais de 530 mil mortos por Covid, desemprego nas nuvens, inflação em alta... Num cenário assim a prosperidade precisaria ser muito pujante para desfazer o mal-estar.
Os caciques do centrão, donos de aguçado instinto de sobrevivência, começam a ensaiar uma divisão. Os otimistas avaliam que o projeto de reeleição de Bolsonaro foi para as cucuias. Os pessimistas começam a suspeitar que o capitão não chegará ao segundo turno.
A ficha de Bolsonaro demora a cair. Mantém ativa a fábrica de crises do Planalto. Comporta-se como o sujeito que salta do décimo andar e, ao passar pelo sétimo pavimento, suspira: "Até aqui, tudo bem."
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