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Josias de Souza

ANÁLISE

Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.

Covaxin deve ser vista com o nariz, não com os olhos; o odor é insuportável

A7 Press/Folhapress
Imagem: A7 Press/Folhapress

Colunista do UOL

09/07/2021 09h29

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Espanta que o contrato de compra de 20 milhões de doses da vacina indiana Covaxin tenha sido apenas suspenso. Ou a transação é cancelada rapidamente ou Bolsonaro terá de mudar o lema do seu governo. Sai o "Brasil acima de tudo, Deus acima de todos." Entra o "Quanto eu levo nisso?"

Contratos como esse só existem nas ilicitocracias do tipo em que se transforma a democracia brasileira. Um regime comandado há anos por gestores que têm a suspeição como regra, o lobby como programa e a propina como sistema.

A compra da Covaxin, realizada em fevereiro, deve ser olhada com o nariz, não com os olhos. Exala um odor insuportável desde a assinatura. E fica ainda mais malcheirosa a cada nova revelação.

Havia três empresas metidas na transação: a Bharat Biotech, da Índia, fabricante de uma vacina adquirida sem o aval da Anvisa; a Precisa, do Brasil, atravessadora que atuou como intermediária do negócio a despeito de ostentar uma ficha suja no Ministério da Saúde; e a Madison Biotech, situada em Singapura, que receberia os pagamentos mesmo não tendo sido mencionada no contrato. Tudo muito acintoso.

Descobre-se agora uma quarta logomarca, a Envixia, sediada nos Emirados Árabes. Teria sido contratada pelo fabricante indiano da vacina para cuidar do registro e da comercialização do produto no Brasil. Ora, esse era, presumivelmente, o papel da brasileira Precisa Medicamentos.

Guiando-se pelo olfato, já farejaram a radioatividade moral do contrato de compra da Covaxin o Ministério Público Federal, a Polícia Federal e o Tribunal de Contas da União. O pior cego nessa história é aquele que não sente o cheiro. O Ministério da Saúde ainda mantém reservada a cifra destinada ao pagamento das vacinas indianas: R$ 1,6 bilhão. É como se o governo confundisse dinheiro público com dinheiro grátis.