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Josias de Souza

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Desistência de Doria dá à sucessão presidencial a aparência de jogo jogado

Colunista do UOL

31/03/2022 09h39

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Estive com João Doria dias atrás, no escritório da representação do governo de São Paulo, em Brasília. Falou sobre a corrida presidencial com um otimismo que contrastava com o nanismo que exibe nas pesquisas. Estimava que as articulações da chamada terceira via se arrastariam até junho. Só então, dizia ele, seria possível saber quais candidatos teriam fôlego para se manter na disputa. Admitia que uma taxa de rejeição rodando na casa dos 30% era um obstáculo relevante. Mas evocava eleições passadas, municipal e estadual, para sustentar que chegaria às urnas como candidato competitivo. Era um personagem muito distante do ex-candidato retratado pela Folha nesta quinta-feira. A notícia de que Doria permanece no governo de São Paulo desce ao enredo da eleição como uma evidência prematura de que a sucessão de 2022 ganhou uma aparência de jogo jogado com seis meses de antecedência.

Trafegavam pela chamada terceira via entre sete e oito candidatos. Os nomes foram ficando pelo caminho sem que os eleitores tivessem a oportunidade de saber quais eram as suas ideias e o que cada um defendia além da tese do nem-nem. Beneficiado pela precariedade dos candidatos alternativos, Bolsonaro ganhou fôlego no Datafolha mais recente, oscilando para o alto. Somando-se a taxa de intenção de votos do atual presidente com as do favorito Lula, chega-se a 69%.

Contra esse pano de fundo, personagens como Doria, Simone Tebet e Sergio Moro precisariam roubar votos de Bolsonaro para se manter vivos na disputa. Ciro Gomes, mais à esquerda, teria de escalar sobre o eleitorado de Lula. Nada é impossível numa eleição. Mas esses movimentos não parecem prováveis. A missão de Doria revelou-se ainda mais intrincada. Ele ganhou as prévias do PSDB, mas não levou o partido. Enfrentava a concorrência do correligionário Eduardo Leite, que saíra derrotado das primárias do partido.

A confirmação da desistência do governador de São Paulo deixará os grão-tucanos que conspiram a favor da substituição de sua candidatura pela de Eduardo Leite em situação constrangedora. Já não terão João Doria para chutar. E precisarão lidar com a inanição do seu próprio candidato. Leite amealha no Datafolha 1% das intenções de voto.

Num ponto, a sucessão de 2022 vai ficando parecida com a de 2018. A diferença é que os sinais foram invertidos. Empurrado para o triunfo pelo antipetismo que vigorou na sucessão passada, Bolsonaro infectou a conjuntura com um sentimento novo: o antibolsonarismo. Entretanto, embora esteja submetido a um intenso bombardeio, Bolsonaro na segunda colocação. A oscilação mais recente, para o alto, bloqueando a ascensão de nomes alternativos. Ao jogar a toalha, Doria potencializa o sentimento de que a polarização tornou-se incontornável.

- Atualização feita às 16h30 desta quinta-feira (31/03): Doria renunciou à renúncia. Anunciou que deixa o governo paulista. E manteve a candidatura presidencial. Resta saber se será levado a sério.