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Arthur Lira não se contenta com tudo, quer mais
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Arthur Lira desistiu de acompanhar Lula na viagem à China. Alega que precisa cuidar da nova regra fiscal do governo. Como a proposta ainda não chegou no Congresso, acredita-se que não quer dividir o mesmo boeing com o desafeto Renan Calheiros, também convidado para compor a comitiva presidencial. Ao recepcionar Lula, o presidente chinês Xi Jinping terá todo o direito de desconfiar que o Brasil enviou a Pequim o seu segundo time e que o verdadeiro chefe de Estado brasileiro, Arthur Lira, ficou em Brasília.
Muita gente aqui suspeita a mesma coisa. E a suspeição tende a crescer. O imperador da Câmara já não se contenta com tudo, quer mais. No início do mês, disse que Lula não dispõe de base congressual para aprovar projetos que exigem maioria simples. Muito menos emendas constitucionais, que precisam do apoio de três quintos das duas Casas do Legislativo. Esqueceu de mencionar as MPs —medidas provisórias. Lira emperra desde fevereiro a votação de 29 MPs editadas por Lula.
Medidas provisórias são atalhos que os presidentes usam para fazer valer as suas vontades. Uma MP vira lei instantaneamente. Perde a validade se não for aprovada pelos parlamentares em quatro meses. Pela Constituição, a porta de entrada das MPs no Congresso é uma comissão mista, com deputados e senadores. Na pandemia, para apressar as votações, criou-se um rito abreviado. As MPs começaram a tramitar pela Câmara.
Com os poderes vitaminados, Lira tomou gosto pela coisa. Age para manter o privilégio de escolher os relatores das MPs, ditar o ritmo de tramitação e negociar o conteúdo com o governo e com os lobbies empresariais. Rodrigo Pacheco, presidente do Senado e do Congresso, farejou o cheiro de queimado. Determinou a volta das comissões mistas. Lira avisou que nem se o Supremo Tribunal Federal mandar os líderes da Câmara indicarão representantes para as comissões.
Nessa briga entre Senado e Câmara, Lula entra com a cara. E os brasileiros com o bolso. A MP que recriou o Bolsa Família é uma das que podem caducar. Lula reuniu nesta sexta-feira o seu staff político. Decidiu ouvir os chefes do Senado e da Câmara. Conversará com Pacheco durante a viagem à China, pois ele estará no avião. Antes, tomou nota das pretensões de Lira. Mesmo diagnosticado com pneumonia, Lula recebeu no Alvorada o personagem que tem exercido o poder de fato no Brasil desde Bolsonaro.
Se Xi Jinping perguntar por que o poder de fato no Brasil não foi a Pequim, alguém terá que explicar a situação. Como eminência parda, Lira dispõe de todos os privilégios do poder com uma vantagem que nenhum presidente da República jamais teve: a de ser um poder presumido, que não precisa provar se é verdadeiro ou não, pois ninguém ousa desafiá-lo.
Na campanha, Lula disse que Bolsonaro era refém do Legislativo e que Lira agia como "imperador do Japão". Imaginou-se que, eleito, pagaria para ver. Pagou já na fase de transição de governo. Não para testar até onde vai o poderio de Lira, mas para alugar o apoio de sua força subterrânea. Nesse enredo, o papel de figurante numa comitiva com mais de 200 pessoas não faria jus a um imperador cujo poder dispensa tronos e aferições. A esse ponto chegou o Brasil. A presença na caravana do presidente da República seria um rebaixamento para Lira.
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