Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Supremo começa a julgar o 8 de janeiro com refletores da história apagados
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O 8 de janeiro faz aniversário de 100 dias nesta terça-feira, 18 de abril de 2023. Para marcar a data, o Supremo Tribunal Federal levou à apreciação dos seus ministros as primeiras 100 denúncias formuladas contra os 1.390 encrencados na intentona bolsonarista. Não se trata apenas de mais um julgamento. A Corte começa a escrever uma página da história brasileira. Em vez de julgar diante das câmeras da TV Justiça, no plenário mais destroçado no quebra-quebra da versão brasiliense do Capitólio, o Supremo optou por empurrar o novo verbete das futuras enciclopédias para o ambiente virtual. Uma pena.
Ali, no plenário eletrônico, os ministros votam por escrito. Sonega-se à plateia o embate entre defesa e acusação. Eventuais divergências entre as togas são diluídas no cristal líquido dos computadores. É um mau começo. A votação foi aberta, no início da madrugada, com o voto do relator Alexandre de Moraes. Ele se posicionou a favor da aceitação de todas as denúncias. Advogados dos acusados chiam em coro contra a suposta superficialidade das acusações. Queixam-se da falta de individualização das imputações. Alegam que o Supremo não é o foro adequado para o julgamento. São questões que mereceriam a fricção de uma transmissão ao vivo.
O Supremo alega que paralisaria suas atividades se levasse o 8 de janeiro para o plenário presencial. O que há de mais importante do que imunizar o sistema democrático brasileiro com uma dose cavalar de exposição ao dossiê criminal da tentativa de um golpe? Por que não transferir para o plenário virtual as outras causas? O regimento do Supremo prevê que um julgamento virtual será transferido para o plenário presencial desde que algum ministro solicite. Espera-se que surja um magistrado com noção da dimensão histórica do momento.
A apreciação das denúncias é apenas o primeiro passo do julgamento. Das primeiras 100 peças acusatórias do Ministério Público, 50 referem-se a insufladores do golpismo. Outras 50 tratam de executores da quebradeira. Todos paisanos. Têm prioridade porque continuam presos. Lamenta-se a ausência nesta fase inicial de um lote de financiadores e idealizadores dos atos golpistas. É lastimável também a inexistência de militares entre os denunciados. Só na semana passada os suspeitos das Forças Armadas começaram a ser interrogados pela Polícia Federal. A provável aceitação das denúncias, transformam os acusados em réus. Passarão a responder a ações penais. Entra-se, então, na fase do contraditório. Só depois serão julgadas as culpas e definidas as penas.
Na definição de James Joyce, o autor de Ulisses, a história é um pesadelo do qual estamos tentando acordar. No caso do 8 de janeiro, o pesadelo foi potencializado pela tentativa de Bolsonaro de transformar a história numa lenda, só que muito mais mentirosa. É uma pena que, no instante em que começa a recontar os fatos, agora supostamente iluminados pela investigação da Polícia Federal, o Supremo fuja dos refletores. Não se muda o curso da história apagando os holofotes, ou criando uma atmosfera de lusco-fusco num ambiente onde deveria haver iluminação feérica.
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