Josias de Souza

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Opinião

É imoral a pressão do PT por um Zanin terrivelmente companheiro

Ao presentear o conservador Cristiano Zanin com uma poltrona no Supremo Tribunal Federal, Lula subverteu a lógica que recomenda a quem tem calos evitar os apertos. O Partido dos Trabalhadores avalizou, com aplausos efusivos e silêncios constrangedores, a escolha de um criminalista por serviços prestados. Agora, o partido de Lula grita em documento oficial contra os votos de Zanin. É como se exigisse que o ministro agradeça a Lula com a toga, mantendo-se como mero prestador de serviços. A pressão oscila entre a inutilidade e a imoralidade.

Em qualquer outro momento, a gritaria partidária seria apenas inútil, pois não reverterá os votos em que Zanin pisou em todas as calosidades do PT ao inaugurar o seu lawfare invertido. Consiste em usar a lei para perpetuar injustiças mesmo admitindo que elas são inquestionáveis em casos como o preconceito odioso contra a comunidade LGBTQ, a violência policial contra indígenas e o encarceramento ilegal de dependentes de drogas ou acusados de furtos de valor insignificante.

A barulheira petista torna-se imoral quando é despejada sobre a conjuntura no instante em que Zanin leva aos refletores o seu voto no julgamento sobre o marco temporal para a demarcação das terras indígenas. Por uma dessas ironias supremas, o PT adota a filosofia bolsonarista ao pressionar Zanin para que se converta numa toga terrivelmente companheira. Ao rejeitar a hipótese de que o ministro seja dependente apenas da Constituição e da sua consciência jurídica, ainda que enviesada, o PT exige fidelidade ao partido, à ideologia e a Lula.

A essa altura, o voto de Zanin no julgamento sobre o marco temporal chama menos atenção do que a percepção de que esquerda e direita no fundo querem as mesmas coisas: uma maioria de magistrados leais, uma Procuradoria-Geral da República que denuncie crimes alheios e um Supremo que prenda os outros, soltando os seus.

Na mesma resolução em que espinafrou as posições de Zanin, o PT lançou o projeto Lula-2026. Será divertido contabilizar os aplausos dos petistas no instante em que Lula, de volta ao palanque, usar o conservadorismo de Zanin para reivindicar o voto do pedaço do eleitorado que ainda devota algum apreço por Bolsonaro. Lula enxerga mais longe do que seu partido.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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