Josias de Souza

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Opinião

Divergências pontuais de Fux favorecem Supremo, não réus

Bolsonaro e os sete cúmplices colocados no banco dos réus nesta semana animaram-se com as divergências pontuais expostas pelo ministro Luiz Fux nas sessões da Primeira Turma do Supremo. A defesa de Bolsonaro chegou a vislumbrar "luz no fim do túnel". Refinando-se o olhar, percebe-se que a perspectiva de trinca na unanimidade da turma que cuida da tentativa de golpe favorece a Suprema Corte, não os réus.

Fux pôs em dúvida a delação de Mauro Cid. Depois, avisou que pretende rever a pena de 14 anos de prisão proposta por Alexandre de Moraes para Débora Rodrigues dos Santos. Por isso suspendeu o julgamento da cabeleireira que escreveu com batom a frase "perdeu, mané" na estátua da Justiça no fatídico 8 de janeiro. A despeito das divergências, Fux compôs a unanimidade que transformou em ação penal a denúncia da Procuradoria contra o "núcleo crucial" da organização criminosa do golpe.

Ao ecoar Moraes, Fux enalteceu a qualidade do voto ácido do colega. "Não deixou pedra sobre pedra", declarou. Lembrou ter sofrido, ele próprio, os efeitos da atmosfera antidemocrática quando presidia o Supremo, em setembro de 2021, e caminhoneiros ameaçaram invadir o tribunal. Declarou ter a "esperança de que o país continuará a viver um Estado Democrático de Direito". Não são palavras de quem deseja inocentar culpados.

As divergências favorecem o Supremo porque qualificam o julgamento. Fux não foi o único a colocar em dúvida a qualidade da delação de Mauro Cid. Cármen Lúcia e Cristiano Zanin fizeram o mesmo. Ficou entendido que não está descartada nem mesmo a anulação do acordo de colaboração. Nessa hipótese, o prejuízo seria do delator. Pela lei, ainda que a premiação do colaborador seja cancelada ou reduzida, as provas obtidas a partir da colaboração permanecem válidas.

O debate sobre a dosimetria das penas também revela-se essencial. Pilhados tentando explodir um caminhão-tanque perto do aeroporto de Brasília na véspera do Natal de 2022, dois golpistas saídos do acampamento que pedia intervenção militar na frente do QG do Exército foram julgados pela Justiça Federal. Um pegou cinco anos de cadeia. Outro, nove anos. Bem menos do que os 14 anos que Moraes quer impor à cabeleireira Débora.

A sociedade torce o nariz para o que não entende. Para evitar que oportunistas transformem golpistas em mártires, convém que a força do direito, bem calibrada, supere a presunção do magistrado de que dispõe do direito da força.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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