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Leonardo Sakamoto

Bolsonaro e Pazuello travam batalha pelo bem-estar do coronavírus

Brasil per

Colunista do UOL

09/12/2020 09h13

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Jair Bolsonaro fez tudo o que estava a seu alcance para fugir de sua responsabilidade ao longo dos últimos nove meses de pandemia. Não seria agora, no momento de definição do plano de vacinação, que demanda complexa articulação nacional, que ele assumiria o papel de presidente da República. Enquanto isso, a covid se prepara para voltar a matar mais de mil por dia. E, ao que tudo indica, pode ir além.

Sentindo-se bem em meio ao caos, preferiu entrar como aliado do vírus nessa guerra. Menosprezou e negou a gravidade da situação, estimulou as pessoas a ignorarem a doença, ofereceu remédios que não funcionavam, atacou prefeitos e governadores que implementavam as quarentenas, criticou a obrigatoriedade da imunização.

Com isso, excitou a parcela de terraplanistas biológicos que o seguem até para dentro do abismo - e pegariam em armas para defende-lo. E adotou uma lógica cínica e violenta: se todos voltassem ao trabalho, o impacto na economia não atrapalharia a sua reeleição. A vida das pessoas? Foda-se.

Além dos 178 mil mortos, resultado dessa estratégia homicida, o comportamento egoísta de Bolsonaro ajudou a prolongar desnecessariamente a pandemia. Pior: os 14,1 milhões de desempregados decorrentes disso não têm perspectivas porque o governo também não conta com plano para geração de empregos.

O máximo que temos é o ministro da Economia, Paulo Guedes, repetindo que é necessário "flexibilizar" as proteções trabalhistas para ajudar os mais vulneráveis na crise, como disse nesta terça (8). Ou seja, tirar proteção de trabalhador pobre para proteger trabalhador ainda mais pobre.

Bolsonaro não agiu como chefe da nação, mas como um candidato à reeleição. Enquanto o Brasil travou uma batalha pela sobrevivência de pessoas e de empregos, ele se preocupou com a sua sobrevivência eleitoral e em afastar a família de processos e os amigos da cadeia.

Agora, trava uma batalha com João Doria, que quer começar a imunização em São Paulo no dia 25 de janeiro, enquanto o governo federal quer começar a distribuir a vacina em fevereiro ou março.

Nessa briga entre os dois, prelúdio da eleição de 2022, não há santos. Por mais que tenha tomado atitudes corretas durante a crise, o governador paulista segurou o endurecimento da quarentena para o dia seguinte da reeleição de seu aliado, Bruno Covas, apesar do crescimento de casos. E soltou um cronograma de vacinação sem que os resultados da terceira fase dos testes da Coronavac tenham sido divulgados, ou seja, sem que exista uma vacina.

A diferença na politicagem eleitoreira de ambos é que, ao menos, Doria quer agilizar o processo, o que salvaria vidas, enquanto Bolsonaro vai posterga-lo com sua falta de prioridade - o que só mata mais gente. No meio disso, o ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, dança como um fantoche, enquanto o capitão puxa as cordinhas da confusão.

Com discursos de vacina para lá, vacina para cá, a população, que está exausta de isolamento e distanciamento, passou a acreditar que tudo deve acabar em breve e a flexibilizar as restrições sociais por conta própria. Mas não, não vai. Na melhor das hipóteses, com base no que promete o governo, a imunização termina no final do ano que vem. Até lá, infelizmente, muita gente.

Na esteira da polêmica, bolsonaristas-raiz defendem ir às ruas pelo direito a celebrar o Natal - sim, a falta de empatia bate de frente com a ideia central de solidariedade presente no Novo Testamento. Talvez seja indício de que seguem o Messias errado.

Não deixa de ser irônico que, na maior guerra de nossa história, que já acumula mais de 178 mil óbitos, tenhamos um capitão como presidente e um general como ministro da Saúde. E, mesmo assim, o governo esteja tão mal de planejamento e estratégia que chegou à suprema humilhação de descontextualizar números de mortos e infectados do Ministério da Saúde para fingir que está "vencendo" - o que levou a veículos de comunicação, entre eles o UOL, a organizar sua própria contagem.

O primeiro-ministro Boris Johnson, começou negacionista, contraiu a doença e passou a agir de forma responsável. O Reino Unido iniciou, nesta terça, a sua vacinação. Por aqui, temos um presidente que começou negacionista, contraiu a doença e continua descobrindo novas formas de irresponsabilidade sanitária.

Há um momento em que personagens da história foram chamados a decidir como seriam lembrados. Alguns assumiram para si a responsabilidade, e conduziram seu povo, sacrificando interesses pessoais em nome de algo maior. Outros, cruzaram os braços, culpando aqueles que resolveram fazer algo, atacando o mensageiro, inaugurando exposições com a roupa que usaram quando chegaram ao poder, sabotando soluções, deixando o povo à própria sorte.

O primeiro grupo é dos grandes líderes e heróis. O segundo grupo, o dos traidores e covardes.