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Leonardo Sakamoto

Desemprego de 14,1 milhões e fim do auxílio emergencial ameaçam Bolsonaro

Fila para pagamento do auxílio emergencial em agência da Caixa - NE10
Fila para pagamento do auxílio emergencial em agência da Caixa Imagem: NE10

Colunista do UOL

29/12/2020 09h45

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Enquanto o IBGE divulgava, nesta terça (29), que o desemprego atingiu 14,3% no trimestre encerrado em outubro, com 14,1 milhões procurando serviço sem sucesso, a Caixa começava a realizar o último depósito do auxílio emergencial.

A partir de agora, a grande maioria dos 67,9 milhões que receberam ao menos uma parcela do benefício - que começou com R$ 600 e, depois, foi prorrogado a R$ 300 - está por sua própria sorte. Desse total, 14,2 milhões voltam a receber o Bolsa Família - em média de R$ 192 mensais. Enquanto isso, cresce o número de internações e de mortes por covid-19.

O benefício, vale lembrar, foi criado para atender trabalhadores informais pobres e desempregados em geral que ficaram sem possibilidade de gerar renda em meio à necessidade de isolamento social para conter as mortes causadas pelo coronavírus. E se o Congresso Nacional não tivesse rejeitado a proposta original do governo Bolsonaro, o valor pago teria sido de R$ 200.

A recuperação de vagas com carteira assinada tem sido rápida, como previsto, levando o governo Jair Bolsonaro a festejar. Contudo, há um exército de trabalhadores informais que estão saindo da quarentena, procurando serviço e não encontram.

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua, desta terça, mostrou que a população ocupada subiu 2,8% (2,3 milhões de pessoas) diante do trimestre anterior, mas caiu 10,4% (9,8 milhões) em comparação ao mesmo trimestre de 2019. Isso dá uma perspectiva do tamanho do desafio que temos pela frente. Há um Brasil que está retomando e outro que segue de fora da festa.

Essa massa de informais desempregados ainda sofre com a alta da inflação, que atingiu especialmente as camadas mais pobres, por conta do peso dos alimentos na composição do seu índice. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostram que famílias com renda menor que R$ 1.650,50/mês tiveram inflação acumulada em 12 meses de 5,8%. E entre famílias com renda maior que R$ 16.509,66, o indicador está em 2,69%. Já o IGP-M, que serve como referência para o reajuste de aluguel, subiu quase 25%.

Com o fim do auxílio emergencial, a inflação vai ceder graças a uma terrível equação: pessoas comprarão menos comida porque terão menos dinheiro, deixando de pressionar os índices. Como disse aqui ontem, o problema é que desempregados não serão absorvidos e trabalhadores informais não se tornarão formais no curto espaço de tempo. O tempo das planilhas é diferente do tempo das pessoas, que está mais ligado ao tempo da fome e do despejo.

O governo federal nunca teve um programa para fomentar a geração de postos de trabalho de qualidade. Aposta, como sempre, em reformas estruturais, que não se traduzem em impactos de curto prazo, e insiste na retirada de proteções e garantias trabalhistas, como forma de aumentar o número de contratados.

Não é à toa que Jair Bolsonaro incentivou que todos mantivessem a "normalidade", voltando ao serviço mesmo nos piores momentos da pandemia. Como tem mais gente sem trabalho do que morta pela covid, o presidente acredita que pesa mais 14,1 milhões de desempregados do que 191 mil óbitos.

A tragédia é que, ao empurrar o trabalhador para fora das quarentenas, ele estendeu a primeira onda do coronavírus até que ela se conectou à segunda. Não tivemos tempo de respiro, de vida normal, como na Europa. E isso matou gente e ceifou mais empregos.

A pergunta que tenho feito aqui nas últimas semanas, segue de pé: uma grande parte dos 67,9 milhões que receberam o auxílio emergencial ficará agradecida a Bolsonaro o suficiente até outubro de 2022 ou a percepção de que seu governo não tem um plano para geração de empregos junto com a deterioração da qualidade de vida vão levar embora os ganhos de popularidade trazidos pelo auxílio? Independente da resposta, o tamanho da encrenca que se desenha no horizonte é suficientemente grande para o presidente tentar distrair a população debochando da tortura e atacando a imprensa.