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Leonardo Sakamoto

REPORTAGEM

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Toffoli beneficia Aras ao dificultar enquadramento do MP em prevaricação

O procurador-geral da República, Augusto Aras - Marcelo Camargo/ABr
O procurador-geral da República, Augusto Aras Imagem: Marcelo Camargo/ABr

Colunista do UOL

23/02/2022 10h56

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O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, afastou, nesta terça (22), o enquadramento como crime de prevaricação da atuação de juízes, desembargadores, ministros, promotores e procuradores que sustentem posição minoritária e discordante de outros atores jurídicos, políticos e sociais no exercício de suas funções, desde que amparados pela interpretação de lei.

A decisão foi tomada pelo ministro um dia depois do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) apresentar à corte um novo pedido para que o procurador-geral da República, Augusto Aras, seja investigado por prevaricação.

Na última semana, Aras defendeu o arquivamento de duas ações envolvendo Jair Bolsonaro (PL): um inquérito sobre o vazamento de informação sigilosa, em que a Polícia Federal viu indícios de crime, e outro sobre a suspeita de prevaricação do presidente em relação às irregularidades na compra da vacina Covaxin. Neste caso, a PF apresentou relatório isentando-o.

Parlamentares também criticam o procurador-geral pela demora na análise do relatório final da CPI da Covid, que imputa a Jair Bolsonaro uma série de crimes cometidos no âmbito do combate à pandemia.

Antes disso, os senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Fabiano Contarato (Rede-ES) já haviam apresentado um pedido para que Aras fosse investigado por prevaricação em agosto de 2021. A razão seria uma omissão diante de ataques de Bolsonaro ao sistema eleitoral e do descumprimento da lei na pandemia. A notícia-crime foi arquivada pelo ministro Alexandre de Moraes.

No mesmo mês, um grupo de subprocuradores-gerais da República aposentados, entre eles Cláudio Fontelles, enviou ao Conselho Superior do Ministério Público outro pedido de investigação contra Aras por suspeitas de prevaricação diante de supostos crimes cometidos por Bolsonaro na pandemia e no seu uso da máquina pública para ajudar aliados e familiares.

O procurador-geral da República tem se defendido dessas acusações afirmando que cumpre com seu papel constitucional e que tem garantia de independência funcional.

Decisão de Toffoli vai ser analisada pelo plenário do STF

A decisão liminar de agora, concedida em meio à ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 881, ainda será levada para análise do plenário do Supremo Tribunal Federal.

Toffoli, em sua decisão, afirmou que a Constituição Federal garante autonomia e independência e que o artigo 319 do Código Penal não pode ser usado para enquadrar seus membros no exercício de suas funções.

O artigo considera como crime "retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal". A Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp), autora da ação, defende que magistrados e membros do MP não podem ser punidos por sua interpretação da lei.

"É imperativo que se afaste qualquer interpretação do artigo 319 que venha a enquadrar as posições jurídicas dos membros do Poder Judiciário e do Ministério Público - ainda que "defendam orientação minoritária, em discordância com outros membros ou atores sociais e políticos" - em mera "satisfação de interesse ou sentimento pessoal".

A grande questão continua sendo, contudo, comprovar o "interesse ou sentimento pessoal".

O ministro ressaltou que isso significa impunidade. "Isso não quer dizer que não poderá haver responsabilização penal de magistrados e de membros do Ministério Público em face de sua atuação ao agir com dolo ou fraude sobre os limites éticos e jurídicos de suas funções, ocasionando injustos gravames a terceiros e obtendo vantagem indevida para si ou para outrem", disse em sua decisão.