Leonardo Sakamoto

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Reportagem

Clima bombou rios no Sul, e isso vai piorar nos próximos anos, diz estudo

As vazões médias dos rios na região Sul do país vêm subindo há décadas por conta das mudanças climáticas associadas ao aquecimento do planeta e vão continuar muito acima do observado no início do século passado, segundo pesquisa. O que deveria servir de alerta para políticas de prevenção, mitigação e adaptação do poder público.

A falta de preparo para tempestades bombadas pelas mudança do clima já matou mais de 70 pessoas no Rio Grande do Sul, deixando mais de 100 desaparecidos. A capital Porto Alegre já enfrenta a pior inundação de sua história com a cheia do rio Guaíba.

O pesquisador Sérgio Cortizo, que trabalha no governo federal com mudanças climáticas desde 2009, analisou 90 anos de dados do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico) sobre a vazão dos rios brasileiros desde 1930. Com base em uma análise exaustiva, o estudo aponta que a mudança no regime hídrico vai se agravar nos próximos 20 anos mesmo se o mundo fosse capaz de zerar a emissão de gases de efeito estufa, pois a temperatura média do planeta continuaria subindo devido à alta concentração atual deles na atmosfera.

No artigo científico "Impacto observado das mudanças climáticas nos rios brasileiros", ele aponta que "as tendências já observadas de variação das vazões médias nas últimas décadas vão prosseguir pelos próximos 20 anos, independentemente das futuras emissões globais destes gases".

Enquanto a vazão dos rios da Região Sul aumentou consideravelmente e está provocando desastres como o registrado nesta semana em Porto Alegre, a região Nordeste ficou mais seca nas últimas décadas devido às mudanças climáticas. Há sério risco de o rio São Francisco tornar-se intermitente até 2040.

De 1930 até 2020, houve evolução de vazão em sete bacias hidrográficas da região Sul, incluindo a do rio Taquari - uma das espinhas dorsais das enchentes que vem assolando o Rio Grande do Sul. E, vale ressaltar, que o levantamento de Cortizo não incluiu dados das fortes chuvas que levaram a tragédias envolvendo esse curso d'água em 2023 e 2024, pois os dados do ONS ainda não estavam disponíveis à época do estudo.

A realidade é consistente com as análises técnicas de Cortizo. E o custo disso é alto: desastres naturais afetaram 37,3 milhões de brasileiros em 2023, deixando 126 mil desabrigados, 718 mil desalojados e 258 mortos. Os dados são do Sistema Integrado de Informações sobre Desastres do Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional. A Confederação Nacional dos Municípios publicou estimativa que os desastres como as chuvas no Rio Grande do Sul custaram mais de R$ 105 bilhões ao Brasil no ano passado.

A pesquisa aponta que o país não ouviu os sinais dados pela ciência e, se continuar ignorando, os danos humanos e materiais serão bem maiores do que aqueles registrados agora na tragédia do Rio Grande do Sul.

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.