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Leonardo Sakamoto

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Granada de Jefferson entra na longa lista das agressões à PF sob Bolsonaro

Visão do interior de viatura da PF após tiros disparados pelo ex-deputado Roberto Jefferson - Reprodução/Redes sociais
Visão do interior de viatura da PF após tiros disparados pelo ex-deputado Roberto Jefferson Imagem: Reprodução/Redes sociais

Colunista do UOL

25/10/2022 02h00

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O atentado do aliado de Jair Bolsonaro, Roberto Jefferson, a agentes da Polícia Federal, neste domingo (23), foi apenas mais um capítulo de uma longa lista de agressões às quais o atual governo sujeitou a instituição e seus trabalhadores - que viram sua independência ser reduzida em nome das necessidades de amigos e familiares do presidente.

Deve ser humilhante para policiais federais ver um aliado do presidente tendo tratamento VIP em sua prisão mesmo após disparar mais de 50 tiros de fuzil e lançar três granadas contra uma equipe que cumpria uma ordem do STF. O vídeo com Jefferson menosprezando, durante conversa amistosa com o negociador da PF, os policiais que foram feridos foi a cereja do bolo.

Um delegado chegou ao hospital com estilhaços no crânio e uma agente, que perdeu bastante sangue, foi atingida na bacia, na testa, na perna e nos braços. O presidente ainda mandou o ministro da Justiça dar uma mãozinha ao aliado no Rio, mas assessores conseguiram convencê-lo a ordenar a Anderson Torres não ir até a casa de Jefferson para não piorar a situação.

Vamos a alguns exemplos:

1) 'Mão peluda' do presidente na Polícia Federal

Em 24 de abril de 2020, o então ministro da Justiça Sergio Moro se demitiu acusando o presidente de ter interferido na PF, trocando o diretor-geral para tentar mudar o comando da instituição no Rio a fim de proteger aliados e familiares.

O vídeo da reunião ministerial em que ele explicitou isso foi revelado no mês seguinte: "Eu não vou esperar foder a minha família toda, de sacanagem, ou amigos meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence a estrutura nossa. Vai trocar! Se não puder trocar, troca o chefe dele! Não pode trocar o chefe dele? Troca o ministro! E ponto final! Não estamos aqui pra brincadeira", disse Jair em um dos trechos.

Bolsonaro mudou mais a chefia da Polícia Federal do que Lula, Dilma e Temer juntos. Lembrando que eles perfazem 16 anos e Jair, quatro. O atual diretor-geral, Márcio Nunes de Oliveira, é o quinto no cargo. Antes dele, passaram pela cadeira Paulo Gustavo Maiurino, Rolando Alexandre de Souza, Maurício Valeixo e Rogério Galloro.

2) Acusações de remoção de policiais que cumpriam o seu dever

Não foram poucas as vezes que o governo Bolsonaro foi acusado de retirar delegados federais de suas funções porque estes estariam atrapalhando seus interesses ou os de seus aliados. Por exemplo, o delegado Alexandre Saraiva investigou o então ministro Ricardo Salles por envolvimento em crimes ambientais e, na sequência, foi exonerado da Superintendência da PF no Amazonas.

A delegada Silvia Fonseca, que comandava o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional, ligado ao Ministério da Justiça, foi exonerada, em novembro de 2021, após dar prosseguimento ao processo de extradição do blogueiro Allan dos Santos.

No mês seguinte, foi a vez da exoneração da delegada Dominique de Castro de suas funções junto à Interpol. Ela foi responsável pela ordem de prisão de Allan dos Santos no exterior. O blogueiro bolsonarista havia sido alvo de pedido de preventiva emitido pelo Supremo Tribunal Federal. O "pecado" de ambas foi cumprir uma decisão do ministro Alexandre de Moraes, visto por Bolsonaro como seu carrasco.

Hugo Correia, que chefiava a Superintendência da PF no Distrito Federal, onde corre um inquérito contra Jair Renan, filho do presidente, foi exonerado em outubro do ano passado.

3) Promessas foram feitas aos policiais, mas não cumpridas

Em meio às investigações por conta da sua responsabilidade no fracasso da gestão da pandemia de covid-19, Jair Bolsonaro prometeu, em dezembro passado, que R$ 1,7 bilhão do orçamento seria direcionado à reestruturação e recomposição das carreiras das forças de segurança da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Polícia Penal Federal.

A promessa, que visava a fazer média com os policiais, levou a outras categorias a pleitearem aumentos. Com o caos instalado, o presidente voltou atrás para evitar um efeito cascata. As associações que representam os policiais reclamaram.

"O não cumprimento do compromisso firmado publicamente pelo presidente da República Jair Bolsonaro é a representação máxima do que esse governo significou para a segurança pública e seus servidores: descaso, desprestígio e desvalorização", disse comunicado assinado pelas associações que representam delegados e peritos em julho deste ano.

Recentemente, os policiais voltaram a chiar quando Bolsonaro vetou o artigo da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2023 que garantiria a reestruturação e recomposição das carreiras. "Traidor" e "mentiroso" foram os termos mais suaves que a coluna ouviu de delegados da PF sobre isso.

O governo também prometeu que policiais federais teriam o mesmo tratamento que os militares na Reforma da Previdência, o que acabou não acontecendo. Pressionado, o governo editou decreto para equalizar parte dos direitos, mas representantes da categoria reclamam que tudo ainda está incerto.

Isso sem contar que este governo não terá dado um reajuste salarial aos servidores por quatro anos, diminuindo o poder de compra dos policiais em meio a um quadro de inflação galopante. Agora, Bolsonaro promete que dará um reajuste... se ganhar a eleição.

4) Bolsonaro pressiona PF para que diga que facada foi um complô

Após cuidadosa investigação, a PF apontou que Adélio Bispo de Oliveira agiu sozinho ao dar uma facada no então candidato Jair Bolsonaro, em setembro de 2018. O presidente criticou várias vezes a instituição por não trazer a identidade de um mandante, nem uma trama política por trás do atentado - o que seria útil para a sua narrativa mentirosa de que a esquerda tentou mata-lo.

Indignado pelos inquéritos apontarem para a ação de um lobo solitário, ele pressionou Valeixo e Moro, cobrando mais investigações sobre seu caso. Sobre uma reunião sobre isso entre eles, em junho de 2019, disse o porta-voz da Presidência, Otávio Rêgo Barros na época: "o presidente entende que a PF tem total capacidade de, aprofundando as investigações, deliberar o mais rápido possível conclusões efetivas do caso".

Adélio foi considerado inimputável por transtorno mental pela 3ª Vara da Justiça Federal em Juiz de Fora, mas está preso para "tratamento psiquiátrico" por tempo indeterminado. A PF já fez novas investigações, mas nada achou de novo. Bolsonaro continua pressionando a instituição para que diga outra coisa.