Será que PT deu uma mãozinha a Bolsonaro para manter a polarização em 2022?
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Não será nada fácil tornar palatável a narrativa, ainda que venha a se comprovar verdadeira, de que a morte do miliciano Adriano Magalhães inscreve-se apenas numa sequência de eventos não-causados por uma certa inteligência superior — não na terra das delações premiadas e dos delatores loquazes, que levam à cadeia ex-presidentes e pesos-pesados do empresariado.
Pode-se perceber um suspiro de alívio, ainda que curto, nas hostes bolsonaristas e um ruído ainda sem direção ou eixo entre os esquerdistas porque Adriano foi morto numa operação da Polícia da Bahia, estado governado por Rui Costa, uma das estrelas do PT.
Ainda que o chefe miliciano estivesse acoitado no sítio de um vereador do PSL de Salvador — Gilson Batista Lima Neto, conhecido como Gilsinho da Dedé —, o que apimenta a imaginação e as especulações, o fato é que a força policial que executou a operação encontra-se sob a gestão de um governador petista.
E, assim, explica-se aquele certo alívio. Afinal, faz-se a pergunta retórica nada silenciosa: "Por que uma polícia sob o comando da administração petista iria queimar um arquivo que incomoda os Bolsonaros? Não faz sentido!" Mas aí os que levam a imaginação a longuíssimas distâncias se veem tentados a responder: "Vai ver se trata de um algum acordo."
Mas que tipo de acordo? É fato que Flávio Bolsonaro pode ser a bomba de efeito retardado a mandar para os ares a candidatura à reeleição de seu pai. Não me refiro ao caso Marielle Franco, reitero. A vereadora, parece-me, foi assassinada por milicianos num ajuste de contas dos criminosos contra forças que eram adversárias locais — quem sabe uma advertência a outros políticos que contrariam seus interesses. Sim, o deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ), aliado e amigo de Marielle, é um deles.
Flávio pode pôr tudo a perder caso se comprovem a prática da rachadinha — de que há sinais arreganhados — e uma ligação ainda mais orgânica com milicianos do que a pornografia moral explícita já evidencia. Se querem saber, é a aposta de lideranças de centro e mesmo de direita que pretendem tomar parte do eleitorado de Bolsonaro.
O presidente, note-se, já fez ele próprio esse raciocínio às portas do Alvorada, naquelas suas coletivas (des)organizadas para ofender jornalistas. Citou os nomes de João Doria e Wilson Witzel. E explicitou como entende o jogo: estes dois estariam a lhe fazer oposição porque quereriam impedir uma nova polarização entre ele, Bolsonaro, e o PT em 2022.
E aí alguns mais imaginosos resolveram pegar carona nessa formulação. Nesse caso, então, o PT estaria prestando um favor a Bolsonaro, à medida que o livra de um risco importante, de olho, também o petismo, na polarização. Nessa configuração, nem a Bolsonaro nem a petistas interessa que cresça um nome alternativo da direita ou mesmo do centro.
Se isso é verdade, e é — não interessa nem a um nem a outro que surja um novo nome —, ligar esses quereres à morte de Adriano Magalhães corresponde a elevar a imaginação a altitudes estratosféricas. Sem contar que coisas assim pediriam uma dose de planejamento e de comprometimento de figurões da vida pública com uma estratégia de risco que é avessa à natureza da própria política.
Isso não quer dizer, no entanto, que devamos nos conformar com o que aconteceu na Bahia.