Conselho reage a procurador que chamou pandemia de "velhacaria globalista"
O CNPG (Conselho Nacional de Procuradores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União) pediu à Corregedoria Nacional do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) que faça uma apuração sobre a conduta do procurador de Justiça do Estado de Minas Gerais Márcio Luís Chila Freyesleben.
O procurador é presidente de uma organização não governamental denominada "Associação Nacional de Membros do Ministério Público Pró-Sociedade" e publicou diversos textos na internet e postagens em redes sociais chamando a pandemia da Covid-19 de uma "velhacaria globalista", atacando recomendações internacionais no combate à pandemia e qualificando o Ministério Público de "piada de mau gosto", "quinta-coluna do globalismo" e "cão de guarda da Nova Ordem Mundial".
O CNPG, formado pelos procuradores-gerais de Justiça nos Estados e na União, é presidido pelo procurador-geral de Justiça de Mato Grosso do Sul, Paulo Cezar dos Passos, que assinou o documento encaminhado nesta quarta-feira (8) ao corregedor nacional no CNMP, Rinaldo Reis Lima.
Passos pede que o CNMP "examine a conduta" de Freyesleben, "especialmente suas manifestações públicas em redes sociais e em veículos de imprensa, determinando-se as providências disciplinares adequadas para a situação, por violação de deveres funcionais". Além disso, pede que o CNMP determine, em caráter urgente, "com o propósito de resguardar a dignidade e integridade da imagem do Ministério Público brasileiro", que a expressão "Ministério Público" deixe de ser utilizada no nome da associação presidida pelo procurador.
Em março, o procurador de Minas escreveu em diversas postagens em sua página no Twitter: "A cada pandemia um punhado de normas sanitárias, econômicas, migratórias etc são expedidas. Os organismos internacionais são fortalecidos e as soberanias reduzidas. Pandemias são estratégias para que assimilemos a perda de liberdade de maneira dócil e servil. Testemunhamos a mais bem-sucedida obra de engenharia social. Mas não é preciso pânico; é só um experimento. A ação derradeira está por vir. Sessões suspensas, jogos suspensos, feiras livres suspensas, aniversários suspensos, apertos de mão suspensos... Motivo: cagaço. Se temessem o inferno como temem as doenças, o mundo estaria salvo".
"Como é possível constatar", diz a petição do CNPG, "o entendimento do procurador de Justiça é contrário às medidas tomadas em âmbito internacional, nacional e estadual sobre o tema, sendo também contrário à atuação do Ministério Público".
O Conselho afirmou ainda que o procurador "ignora estudos médicos, dados e estatísticas vastamente produzidos acerca do tema".
Em outras publicações, o procurador afirma que o Ministério Público é "um agente ativista em atuação no país". Além disso, a associação do procurador ajuizou uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal) para questionar uma recomendação do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), divulgada em 17 de março, que fazia "uma padronização de ações passíveis de serem tomadas pelos entes do poder judiciário, a fim de se combater a propagação do coronavírus no sistema prisional".
Entre as principais diretrizes estavam "a recomendação de redução do ingresso de pessoas no sistema prisional e socioeducativo; transferência de pessoas presas em razão de dívida alimentícia para o regime de prisão domiciliar; aplicação preferencial de medidas socioeducativas em meio aberto, dentre outras".
Após fazer um histórico resumido da propagação da doença até a decisão da OMS de declarar uma pandemia, em março, o Conselho explica que "o Ministério Público brasileiro agiu rapidamente, promovendo resoluções e regras de urgência para minimizar os efeitos de uma possível propagação da doença. Em todos os quadrantes do Ministério Público brasileiro foram tomadas medidas para assegurar a possibilidade de trabalho remoto para membros, servidores e estagiários, com suspensão de eventos e reuniões, bem como restrição de acesso às instalações físicas nos locais de trabalho, entre outras medidas".
Em novembro de 2016, o CNMP editou uma recomendação geral sobre o uso das redes sociais pelos membros do Ministério Público. O CNPG menciona, entre outros pontos, que as manifestações dos membros do MP "não podem comprometer a imagem do Ministério Público e dos seus órgãos". Os membros do MP, nas redes sociais, devem agir com "cautela e discrição" e evitar publicações "que possam comprometer os ideais defendidos pela Instituição", diz a recomendação do CNMP.
"O presidente da Associação Ministério Público Pró-Sociedade, o procurador de Justiça Márcio Luís Chila, se vale da referida associação para atingir a atuação legal e legítima de membros ministeriais", diz o Conselho na petição.
"Um procurador de Justiça deve procurar se abster de expressar comentários agressivos e politicamente ideologizados sobre temas de risco à saúde pública. É certo que a manifestação de pensamento e a liberdade de expressão e de consciência são direitos fundamentais. No caso, porém, a discussão carrega outro componente, consistente no fato de que a pessoa responsável pelas críticas, o procurador de Justiça Márcio Luís Chila, também é uma figura pública, pois se trata de um membro do Ministério Público", afirma a petição.
'Nota de repúdio'
Na noite desta quinta-feira (9), a associação presidida por Freyesleben divulgou uma "nota de repúdio". "A pergunta que deve ser feita é: a proibição de liberdade de expressão é apenas imposta a quem não segue ideologias? Apenas contra quem defende a soberania nacional? Apenas contra quem acredita que a sociedade é a verdadeira titular do Poder? Apenas contra quem repudia a bandidolatria? Aliás, praticamente todas as associações de membros do MP têm 'Ministério Público' em seu nome: pelo óbvio motivo de reunir membros do MP", diz a nota da entidade.
A entidade diz que "o 'Coletivo Transforma MP', o 'Ministério Público Democrático', a 'Associação dos Juízes pela Democracia' constantemente fazem manifestações públicas opinando sobre questões públicas e sobre processos e casos concretos". Segue defendendo "o nosso presidente, Márcio Chila". A entidade indaga: "Tem ele menos direito à liberdade de expressão que as associações e 'coletivo' citados? Por que se escolhe ele para ser atacado e nunca os membros das entidades supracitadas?"
"Enfim, repudiamos a representação lançada contra a Associação MP Pró-Sociedade e seu presidente e a denunciamos como mais uma tentativa de censura, de tentar calar as vozes que não concordam com avanços totalitários e que exercem o contraditório que era negado pela espiral do silêncio", diz a nota.
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