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Rubens Valente

O governador pró-Bolsonaro que combate a Covid com isolamento e bloqueios

O governador eleito de Roraima pelo PSL, Antônio Denarium (com a mão espalmada), com o presidente eleito Jair Bolsonaro durante a campanha na cidade de Boa Vista - Eduardo Anizelli/ Folhapress
O governador eleito de Roraima pelo PSL, Antônio Denarium (com a mão espalmada), com o presidente eleito Jair Bolsonaro durante a campanha na cidade de Boa Vista Imagem: Eduardo Anizelli/ Folhapress

Colunista do UOL

10/04/2020 10h41Atualizada em 10/04/2020 13h05

O governador de Roraima, Antonio Denarium (PSL), 56, é um declarado apoiador do presidente Jair Bolsonaro. Considera-o "muito sério, trabalhador". Elogia as declarações do presidente sobre a crise do novo coronavírus, inclusive a que falou em retorno ao trabalho.

Na prática, porém, Denarium faz tudo o que outros Estados criticados por Bolsonaro, como São Paulo e Rio de Janeiro, também estão fazendo: ordenou fechamento do comércio, com algumas exceções e serviços essenciais, paralisou as aulas presenciais, liberou servidores para teletrabalho, proibiu visitas a hospitais e presídios, cancelou shows, bloqueou as fronteiras com Venezuela e Guiana e suspendeu viagens de ônibus intermunicipais e interestaduais.

Denarium se diz convicto de que esse conjunto de medidas ajudou a manter a epidemia ainda sob controle no seu Estado, que é o menos populoso do país, com 605 mil habitantes, mas enfrenta diversos desafios, como o fluxo de venezuelanos e, assim como em todo o país, a corrida para equipar UTIs (Unidades de Terapia Intensiva) e comprar EPIs (Equipamentos de Proteção Individual). "Fizemos um trabalho preventivo, antes que o problema se espalhasse", disse o governador.

O primeiro caso em Roraima foi notificado no dia 21 de março. Oito dias antes, Denarium já havia pedido ao governo federal o fechamento da fronteira venezuelana, o que foi efetivado no dia 21. No momento da entrevista do governador à coluna, na quinta-feira (9), eram 52 casos e uma morte, mas as unidades de terapia intensiva, segundo o governador, ainda estavam "sob controle", inclusive pela redução no número de pessoas atendidas por outras doenças. - na manhã desta sexta-feira (10), o número de mortes subiu para dois.

De 21 de março para cá, Denarium flexibilizou algumas das medidas de restrição, como autorizar restaurantes funcionarem na base da entrega em casa ou pegar e levar. Mas continuava, pelo menos até quinta-feira (9), proibida a maior parte do comércio de rua, shopping center e outros pontos de serviços considerados não essenciais. "Reconheço que a melhor forma [de controle da epidemia] é o isolamento social, mas colocamos vários segmentos em 'delivery' e 'drive thru' para não parar tudo."

O governador diz que está recebendo muita reclamação de empresários, mas se mantém firme na estratégia do isolamento. "A pressão é muito forte, principalmente do comércio varejista, que vende roupas, perfumaria, cabeleireiros, academia, restaurantes, bares, lanchonetes, cinema, shopping."

Mas Bolsonaro não reclamou com o aliado sobre o isolamento e os bloqueios? "O que foi orientado inicialmente pelo Ministério da Saúde é que todos os Estados fazem o seu próprio plano de contingência. Não tenho como controlar a sua casa, certo? Cada um está vendo a sua parte mais frágil e procurando fortalecer", disse o governador à coluna.

Denarium disse que suas medidas não estão em desacordo com a posição do presidente. "Ele está preocupado com saúde e economia. Ele tem personalidade forte, fala o que pensa, é difícil qualquer pessoa ter controle sobre ele, ele é muito autêntico. Para mim, está fazendo um excelente governo. Muitas vezes você erra e acerta. Nós somos seres humanos, a gente pode mudar de ideia, a partir do raciocínio. De repente, no início da crise eu via de um jeito, hoje vejo de outra. Os governantes da Europa viram de uma forma e à medida que foi agravando, mudaram de comportamento, e mudaram de ideia também."

Denarium disse que apoia as declarações de Bolsonaro porque também "a minha preocupação é com a falência da economia. Se o Estado não tiver dinheiro, as pessoas vão morrer por outro motivo, por coração, câncer". Mas reconhece que sua primeira linha de ataque é barrar a subida do vírus para "preservar vidas".

"Na verdade temos três ou quatro linhas de raciocínio [no país]: os que prezam a paralisação total, os que pregam a retomada e a liberação das coisas, aqueles mais conservadores - eu prezo a vida e saúde e estou pensando na economia, olho para os dois lados - e tem um grupo que quer ver a coisa estourar, arrebentar. Eu sou conservador."

'Renda cidadã'

Denarium afirma ter tomado várias medidas para tentar manter a economia aquecida, de forma a amenizar o impacto. "Lançamos um pacote econômico, Roraima foi o único estado que anunciou a antecipação do 13º salário. Será no dia 20 de abril. E a folha de pagamento vai ser paga dentro do mês. Vamos colocar na economia em torno de R$ 65 milhões, mais R$ 130 milhões no final do mês. Com isso vai entrar mais grana na economia, gera mais consumo", diz o governador.

Ele já tem certeza do desabamento da receita do Estado e, com isso, as dificuldades para manter o próprio sistema de saúde. "Neste mês de março já tivemos uma redução de em torno de 40% das notas fiscais eletrônicas. Para o mês de abril vai ser o maior impacto, estimamos 40% de redução de ICMS em abril. No FPE (Fundo de Participação dos Estados), enviado pela União, já tivemos uma redução de R$ 17 milhões em relação a março de 2019."

Ao mesmo tempo, os gastos com a Saúde explodiram. "Os valores constitucionais repassados para a Saúde representam 12% do Orçamento do Estado. No mês passado, repassamos 16% para a saúde." Os leitos de UTI, segundo o governador, passaram de 41 para 55 no Estado. O governo comprou kits de testes para Covid-19 e EPIs.

Denarium disse que também tomou medidas para famílias mais pobres e trabalhadores mais vulneráveis. "Pagaremos uma renda mensal renda cidadã para 3 mil famílias. Cadastraremos por um período permanente, com valor R$ 200,00 por mês. E outro cadastro para as pessoas receberem R$ 300,00 por mês em caráter provisório. Vamos adquirir mais 50 mil cestas básicas para fazer as doações. Para micro e pequenas empresas de ambulantes, camelôs, vamos ver uma ajuda financeira de R$ 600 por mês", disse Denarium.

Refugiados

O governador disse que uma dos pontos de maior preocupação no Estado é a população de refugiados da Venezuela que se instalaram em Roraima, cerca de 100 mil pessoas, aproximadamente um sexto da população do Estado. Além disso, há 6 mil ou 7 mil que atualmente vivem em instalações das Forças Armadas na capital, Boa Vista, dentro da chamada "Operação Acolhida", e nos abrigos mantidos pelo governo estadual em diversos pontos. São nove em Boa Vista e dois em Pacaraima.

"Grande parte dos venezuelanos que entram, a maioria, vai embora porque tem alguma condição financeira e consegue se deslocar para o centro-sul do Brasil. Mas aqueles mais desassistidos, os indígenas, pobres, crianças, adolescentes, idosos e aqueles sem formação profissional, acabam ficando em Roraima. E aqui não temos emprego para todos. Eles vivem na linha da pobreza, inclusive alguns prédios públicos que não estavam sendo utilizados acabaram ocupados por venezuelanos ilegalmente", disse Denarium.

Os venezuelanos acabam indo morar em habitações coletivas, com muitas pessoas num mesmo espaço, o que facilita um desastre durante a pandemia da Covid-19. "Em uma casa para cinco pessoas, tem até 15 pessoas. Nos abrigos, as tendas são separadas, mas ficam uma ao lado da outra. O banheiro é comunitário, o restaurante é comunitário. Um entra e outro sai. O risco de contágio nos abrigos é muito grande."

Trabalhando em conjunto com o governo estadual, as Forças Armadas estão criando em Boa Vista uma chamada "Área de Proteção e Cuidados", que deverá entrar em operação no final de semana com 1,2 mil leitos, sendo 200 de UTIs, disse o governador. Essa área seria destinada ao atendimento da população de Roraima, incluindo os indígenas que possam ser trazidos em caráter de urgência das aldeias pela Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena), do Ministério da Saúde, e os venezuelanos.

A ideia é que primeiro os pacientes, quanto estiverem com sintomas, se dirijam ao HGR (Hospital Geral de Roraima), onde passam pelos testes da Covid-19. Se estiverem com deficiência respiratória ou o se o teste para a doença der positivo, seguirão para a nova "Área de Proteção".

"O grande problema dos venezuelanos que eles vêm e não tem estrutura financeira. Grande parte chega desnutrida. Todo venezuelano que chega a Roraima é desnutrido. Perderam 11 kg de peso corporal em média. Vivem uma crise humanitária, passando fome mesmo. Não tem emprego, trabalho e comida. Eles são mais vulneráveis à doença."

A ideia do governador é manter ao máximo a estratégia do isolamento social. Ele elogia tanto Bolsonaro quanto Mandetta e pede união. "Estamos alinhados com o ministro [da Saúde] Mandetta, estamos trabalhando direitinho. Bolsonaro está correto, positivo, não é hora de politicagem, é hora de harmonia. É momento de união, não de briga. Em uma guerra, não tem vencedores, só tem mortos, feridos e mutilados. Todos saem perdendo. Temos que superar e minimizar os danos."