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Rubens Valente

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Opinião: Decisão de Fachin mostra que PowerPoint virou contra o feiticeiro

Deltan Dallagnol com Powerpoint projetado em seu rosto - Vagner Rosário/Veja.com
Deltan Dallagnol com Powerpoint projetado em seu rosto Imagem: Vagner Rosário/Veja.com

Colunista do UOL

08/03/2021 17h29

A decisão do ministro do STF Edson Fachin de anular todas as decisões tomadas pelo ex-juiz federal Sergio Moro nos processos que envolvem o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Operação Lava Jato tem um dado irônico. Ao acolher os argumentos da defesa de Lula, o ministro usou de forma reversa o arquivo em PowerPoint apresentado de forma espetaculosa pelo procurador da República Deltan Dallagnol em 2016.

Embora não cite o arquivo apresentado por Deltan, o ministro aborda o conteúdo do raciocínio da força-tarefa do Paraná nas páginas 30 e 31 da decisão de 46 páginas.

A lógica de Fachin foi a seguinte: se Lula era responsável, como disse o MPF (Ministério Publico Federal), por vários esquemas e não apenas por supostas benesses obtidas a partir de desvios da Petrobras, então a 13ª Vara Federal não era a competente para processar e julgar o caso. Se a denúncia tratasse apenas da Petrobras, sugere o ministro, quem sabe o caso poderia permanecer em Curitiba.

Fachin escreveu que, de acordo com a denúncia da força-tarefa da Lava Jato, Lula seria o responsável por uma "extensa gama de órgãos públicos em que era possível o alcance dos objetivos políticos e financeiros espúrios". É a versão escrita do PowerPoint que ligava diversas circunstâncias e suspeitas ao nome de Lula.

Segundo os procuradores, conforme trecho da denúncia reproduzido por Fachin, "os esquemas revelados no 'Mensalão' e na 'Operação Lava Jato' envolveram, dentre outros, crimes de corrupção praticados no alto escalão da Administração Pública Federal. Observou-se, nesses dois casos, a criação de uma estrutura que direcionava benefícios aos que estavam no poder e aos seus partidos. Assim, uma nota comum dessas engrenagens delituosas foi o seu funcionamento em benefício de LULA, não só pelas vantagens financeiras que recebeu, mas também pela governabilidade conquistada e pelo fortalecimento de seu partido".

Os procuradores disseram ainda: "Ambos os esquemas eram simultaneamente de governo e partidários. LULA era a pessoa mais importante no Governo e no partido, em benefício do qual fluíram vantagens centrais dos crimes. Contudo, não se trata apenas de corrupção identificada no 'Mensalão' e na Petrobras, pois, como se indicará, brevemente, a seguir, ao longo de todos os anos em que LULA ocupou o mais alto cargo do Poder Executivo federal, diversos outros casos de corrupção semelhantes foram verificados".

No arquivo de PowerPoint, os itens "Mensalão" e "pessoas próximas do Mensalão" apareciam vinculados ao ex-presidente, muito embora a Lava Jato tratasse de desvios na Petrobras.

Para Fachin, a própria argumentação do MPF mostra que o órgão, na época em que fez a denúncia contra o ex-presidente, "já tinha ciência da extensão alcançada pelas condutas que lhe foram atribuídas, as quais abarcaram não só a Petrobras S/A, mas outros órgãos públicos, sociedades de economia mista e empresas públicas no âmbito das quais, com semelhante modus operandi, foram celebradas contratações revestidas de ilicitudes, em benefício espúrio de agentes públicos, agremiações partidárias e empreiteiras".

O ministro do STF foi além. Ao analisar as denúncias do MPF contra Lula, ele explicou que elas foram "estruturadas da mesma forma", ou seja, atribuindo a Lula "o papel de figura central do grupo criminoso organizado, com ampla atuação nos diversos órgãos pelos quais se espalharam a prática de ilicitudes, sendo a Petrobras S/A apenas um deles".

A ironia é essa: no afã de apresentar Lula como um grande vilão com superpoderes, e se afastando do objeto da investigação da Lava Jato em si, os procuradores acabaram criando as próprias justificativas pelas quais Fachin exterminou as decisões de Moro.