Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Em eleições sangrentas, Bolsonaro terá no Telegram uma arma carregada
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O desmonte foi rápido. Em dezembro do ano passado, pesquisa PoderData apontava que, se a eleição ocorresse naquele momento, Jair Bolsonaro ganharia no primeiro turno, com ampla vantagem sobre os demais candidatos (que ainda não incluíam o ex-presidente Lula, então inelegível).
Nem um ano se passou e hoje o presidente transpira para se segurar no patamar de 26% de intenção de votos, segundo o último Datafolha.
Bolsonaro costuma desdenhar das pesquisas de opinião, sobretudo as que lhe são desfavoráveis. Mas seu calo dói quando a insatisfação atinge o universo das redes sociais, sua fortaleza.
Pesquisa da AP Exata já havia detectado que a reprovação do presidente na internet cresce em ritmo lento, mas constante. Na sexta-feira passada, segundo a consultoria, 52% dos pesquisados avaliavam o governo como "ruim" ou "péssimo".
Ontem, foi a vez da Folha publicar uma pesquisa da FGV mostrando uma queda de 50% nos compartilhamentos de mensagens das páginas de Bolsonaro no Twitter, Facebook e Instagram, além do Youtube.
Seja pelos avanços dos inquéritos que correm na Justiça contra Bolsonaro e aliados por divulgação de fake news, seja pelo transbordamento para o mundo digital da insatisfação popular com o governo, o fato é que Bolsonaro não é mais aquele nas redes.
O que não quer dizer que não continue favorito nelas.
Em número de seguidores e em todas as plataformas, o ex-capitão ainda deixa os potenciais rivais nas eleições de 2022 comendo poeira. E numa plataforma em especial esse favoritismo pode ter consequências incendiárias.
O Telegram, concorrente do WhatsApp, é hoje o aplicativo mais baixado do mundo. Fundado por russos, ele ficou conhecido como "território sem lei" por não ter servidores nem representante legal em muitos países, caso do Brasil. A quem tiver problemas com ele resta reclamar para o bispo.
Além disso, comparado ao WhatsApp, o Telegram tem uma capacidade exponencialmente maior de alcance nos disparos de mensagem em massa.
No WhatsApp, uma mensagem privada pode ser replicada para, no máximo, 256 pessoas. Já o Telegram permite compartilhamento irrestrito de conteúdo para grupos de até 200 mil pessoas.
Bolsonaro já virou garoto propaganda do aplicativo.
No dia 4 de outubro, quando problemas técnicos deixaram o WhatsApp fora do ar, ele aproveitou para convocar seus seguidores no Twitter a migrar para o Telegram. Seu canal na plataforma, inaugurado em janeiro deste ano, já tem mais de 1 milhão de seguidores (o de Lula tem pouco mais de 35 mil).
Se o Telegram é um território sem lei, Bolsonaro já se provou um atirador inconsequente.
Em julho, quando constatou o deslizamento de seus índices de popularidade, ameaçou suspender as eleições a pretexto de impedir uma fantasiosa ameaça de fraude nas urnas.
Agora, 18 pontos percentuais atrás de Lula, promete auxílios, vale gás e aumento geral e irrestrito ao funcionalismo público por meio de um rombo no "teto solar" a ser criado com o beneplácito de sua equipe econômica.
Um candidato que, para se eleger, ameaça incendiar a democracia e tocar fogo na economia hesitará em usar do terrorismo digital para evitar a derrota?
Em julho de 2014, o PSDB acusou o PT de espalhar kombis por estados do Nordeste para divulgar em megafones que o então candidato do partido à presidência, Aécio Neves, iria acabar com o Bolsa Família. Era um tiro de estilingue, mas os tucanos sentiram o baque.
Em 2022, não haverá estilingue. Bolsonaro vem com a arma carregada.
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