Wálter Maierovitch

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Opinião

Moraes viola garantia de juiz natural ao tragar caso das joias de Bolsonaro

Na rapinagem das joias e dos relógios engendrada por Bolsonaro e executada as vendas pelo seu súcubo em função de ajudante de ordens, Mauro Cid, não existia intenção golpista.

Os indicativos apontam para condutas criminosas voltadas à obtenção de lucro ilegal e imoral. Crimes comuns contra o patrimônio.
Bolsonaro, e basta atentar para a sua vida antes da mencionada rapinagem, é um argentário de fácil identificação.

Ou melhor, Bolsonaro sempre busca o dinheiro e a riqueza, a qualquer custo. Numa relação criminal de custo-benefício, Bolsonaro sempre irá, para lucrar sem causa justa, assumir o risco de ser preso e acabar na cadeia. É um argentário que, nas suas horas de recreação, saía para garimpo de ouro.

Numa linguagem futebolística usada quando se torce contra o rival, Bolsonaro seria um argentário desde criancinha.

Diante disso tudo, não há, nem com artes de procusto e leguleios, conexão ou continência alguma da apropriação indébita, referente aos relógios e joias, com o inquérito das milícias digitais.

Atenção. Nada, absolutamente nada, está a justificar a competência do ministro Alexandre de Moraes para o caso. E o STF, até para não ser apontado como uma Corte judiciária de exceção, deveria, por iniciativa da sua presidência, buscar uma solução. A lembrar, a portaria desse imbróglio nasceu de ato da presidência do STF, ao tempo do ministro Dias Tóffoli.

Por outro lado, nenhuma razão existe para tramitar em segredo de justiça a rapinagem. O interesse público da transparência deveria prevalecer. Até porque as vítimas são também os cidadãos, com os bens em nome da União.

Moraes e Torquemada

"Se o juiz não tem cuidado, a voz do direito vira esvanecente e longínqua como a voz inatingível dos sonhos." O autor desse alerta, Piero Calamandrei, foi jurista, jornalista e um dos pais da Constituição italiana pós fascista.

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O STF, em especial o ministro Alexandre de Moraes, tarda em dar-se conta desse fundamental alerta de Calamandrei, morto em setembro de 1956.

Bolsonaro, como todos sabem, foi um péssimo militar e tirado do serviço ativo.

No entanto, Bolsonaro parece ter apreendido nos manuais castrenses como disfarçar-se em combate. Levou essa lição para a vida política. Colocar-se em panos de vítima de perseguição é o disfarce mais usado por Bolsonaro, associado ao caradurismo da mentira deslavada.

O ministro Moraes, e já tratei inúmeras vezes neste espaço e em participações no UOL News, não dá a mínima bola ao princípio constitucional do juiz natural.

Moraes faz tabula rasa, finge esquecimento, ao princípio do juiz natural. E o chamado juiz natural, conhecido também por juiz constitucional, restou elevado à condição de garantia constitucional, por cláusula pétrea.

Quando se viola o princípio do juiz natural, como está a fazer Moraes com o aval em teratológica portaria do ministro Dias Tóffoli, abrem-se as portas para acusados e suspeitos, a incluir o farsante de nome Jair Bolsonaro, queixarem-se da presença de juiz ad-hoc.

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Ou seja, daquele destacado para certos e determinados atos, sem lei a estabelecer essa competência.

Mais tecnicamente, cai-se no campo do juízo de exceção. E exceção significa o emprego do arbítrio. Bolsonaro, no disfarce de vítima da Justiça, agarra-se ao juízo de exceção. E, pelo que afirmou, pode usar a alegada perseguição para fugir do país.

Volto a repetir. No caso dos crimes continuados de peculato, relativos às joias e aos relógios (e tem um valioso relógio da prestigiosa marca Patek Philippe ainda não devolvido por Bolsonaro), o juízo competente é o de primeiro grau de jurisdição. Não é o STF o competente jurisdicional para dizer do direito a ser aplicado.

Bolsonaro perdeu o foro por prerrogativa de função, apelidado popularmente de foro privilegiado, pelo término do mandato presidencial.

O privilégio de foro foi criado para proteger a função e não a pessoa. Finda a função, acaba o foro, ainda que, no caso Bolsonaro, a rapinagem das joias e relógios tenham se consumado quando ele era presidente da República.

O STF, em tempo de golpismos e ataques institucionais urdidos por Bolsonaro "et caeterva", sentiu-se desarmado.

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Aí, criou-se por portaria da presidência da Corte, um instrumento de autodefesa, que alguns ministros preferem chamar de autocontenção. Autocontenção ao bolsonarismo voltado a rasgar a Constituição e aniquilar o estado de Direito.

Em outras palavras e basta ter olhos de ver, os ministros não sentiam suficientes e eficazes os remédios constitucionais e legais à disposição.

Daí, por contorcionismo de Dias Tóffoli, com a sua portaria posteriormente aprovado pela maioria dos ministros, colocou-se o ministro Alexandre Morais na linha de frente. Na verdade, uma espécie redivida do inquisidor Tomas de Torquemada, dada a competência (atribuição) ilimitada e abusiva.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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