Leila x Dudu, VTC e vaffa do futebol à Justiça
As pessoas têm honra e essa pode ser ofendida por um "VTC", como o recomendado pelo atacante cruzeirense Dudu, ex-Palmeiras, à presidente Leila Pereira, do seu antigo clube.
Mas, é exagero levar caso banal, mal resolvido na origem, para a Justiça. E tudo diante uma retorsão imediata de Dudu, sem olvidar, num ambiente esmeraldino, a tradicional italianidade.
Nesse caso, acionar a Justiça não é coisa de palmeirense, "mi dispiace" (me desculpe).
E vou frisar que o "vaffanculo" (vai tomar no c.), como decidiu a Suprema Corte de Cassação da Itália, não tem potencial ofensivo injuriante, pelo uso popularizado e não intencional de afetar a honra. Faltou o que os penalistas italianos chamam de "animus injuriandi".
Colônia
Não vou entrar na análise esportiva em time que tem Mylly Lacombe, Juca Kfouri, PVC, Mauro Cezar, Casagrande, Alicia Klein e tantos outros craques. Vou ficar só no jurídico criminal e processual penal.
De bate-pronto, vale lembrar que Cruzeiro e Palmeiras, quando eram times de torcedores da colônia italiana, chamavam-se Palestra Itália.
Por ato presidencial de Getúlio Vargas, os dois Palestra Itália tiveram de mudar de nome, pois era tempo da Segunda Guerra e a Itália formava o time, ops,ops, as potências do Eixo, contra o time, ops, ops, as forças Aliadas.
Vargas, que havia flertado com Hitler, apoiou os Aliados.
Finda a Segunda Guerra, e para manterem-se abertos aos torcedores não "oriundi", os nomes Palmeiras e Cruzeiro foram mantidos.
Linguagem desabrida
No Palmeiras de Pellegrini (amargou a mudança do nome) Facchina, Giuliano, Frugiuele, Sandoli, Sacomani, Contoursi, Belluzzo, abriu-se para Paulo Nobre e Leila Pereira, a primeira mulher presidente.
Só que tradições foram mantidas e ainda é respirada na sede social, na alameda dos imortalizados em estátuas e na rua Palestra Itália, antiga Turiaçu do Parque Antártica, que passou a Jardim Suspenso e virou Allianz, o nosso Colosseo (Coliseu) esmeraldino.
Uma das tradições, quando tudo não passa de desabafos irrefletidos e ofensas de baixo potencial ofensivo, é o "acabar tudo em pizza". A "fratellanza" é uma característica italiana, haja vista o recente episódio da jornalista Cecilia Mesa, presa no Irã para servir de moeda de troca pelos aiatolás.
No Brasil, a fraternidade foi forte nos tempos da discriminação aos italianos, que perderam a guerra. A rica elite paulistana do café apelidou os italianos de "carcamanos", uniu, como explicava Mino Carta, o verbo da língua portuguesa "calcar" com a palavra italiana mano (mão). E carcamano eram todos os imigrantes italianos e descendentes, pois, no preconceito, discriminação e xenofobia, eram ofendidos na honra. Eram, para a elite, os que "carcavam" (calcavam era muito para uma elite rica mas ignorante com a própria língua) a mão (mano) na balança, para roubar no preço.
Atenção: sou dessa época do pós-guerra e, como tantos outros moradores do bairro proletário e italiano da Barra Funda, era também um "carcamano". Um carcamano adjetivado, ou melhor, um "carcamano judeu".
Numa colônia italiana, de imigrantes que usavam comunicação desabrida e de baixo potencial ofensivo, os termos "vaffanculo' (vai tomar no c.) e cazzo (caralh.) eram as palavras exageradamente recorrentes.
Quantas vezes ouvi, nos jogos do Palmeiras, a torcida chamar o árbitro do jogo de 'ladro do cazzo'. Ou um vaffanculo ao bandeirinha ao marcar impedimento, por exemplo, do Umberto Tozzi, depois de um lançamento primoroso do Jair Rosa Pinto, antecedido de tabelas com o meia Ney, o ponta esquerda Rodrigues e o ponta direita Liminha.
Mais ainda, tinham os "Badólios", os traidores que trocavam de time. E Pietro Badoglio era o nome do general dado como traidor de Mussolini, que virou premiê pós-fascismo e depois embaixador da Itália no Brasil.
Mas, Leila é Pereira e Dudu, registrado no cartório civil como Eduardo Pereira Rodrigues, não são "oriundi".
Presidente e tradição
Leila Pereira, pelo anunciado, sentiu-se ofendida na sua honra subjetiva, a dignidade e o decoro. Está a falar mais alto a honra ferida do que o acabar tudo isso em pizza. E pela pequenez do conflito, terminar em pizza brotinho.
Leila Pereira, que no Palmeiras deu o mau exemplo ao ignorar casos de flagrante conflito de interesse, pega-se numa picuinha.
A presidente não leva em consideração o grande craque palmeirense, de muitas conquistas, de carregar o time nas costas e da injustiça de não selecionado pela CBF.
Atenção: ao que parece, a presidente Pereira não leu a obra intitulada Brás, Bexiga e Barra Funda, do saudoso escritor e jornalista Antônio de Alcântara Machado, sobre as histórias dos imigrantes italianos daqueles bairros de concentração italiana da capital de São Paulo.
Faz parte da italianidade não se ofender por uma vaffanculo.
Até porque, vou repetir, a Suprema Corte de Cassação italiana entendeu, quanto ao xingamento, não ter, pelos costumes, a vida cotidiana moderna, nenhum potencial de injúria. Nada com "animus injuriandi".
Tá bom, a decisão da Cassação italiana não vale para o Brasil. Correto, mas a lição sim. E poderá influenciar na jurisprudência. A intenção em ofender não entra no campo da honra, depois de uma troca de farpas iniciada pela própria Leila Pereira, em evento que nada tinha com Dudu.
Vaffanculo virou vaffa, como VTC
Espera-se que Leila Pereira adquira aquela italianidade marcante. Lembre da decisão da Suprema Corte de Cassação e desista de acionar a Justiça, em ação privada e que será, caso posta, da competência do Juizado Especial de pequenas causa, ou melhor, de causas de menor potencial ofensivo.
Na Itália, os mais finos, a elite dos estados do norte que têm Juventus, Inter e Milan, usam uma forma sincopada para o vaffanculo.
Assim, o vaffanculo virou 'vaffa'. Os meridionais, torcedores do Napoli, continuam a preferir o vaffanculo.
Dudu, na escrita, preferiu, numa retorsão que até pode ser vista como desequilibrada por quem não é "oriundi" da chamada "stivalle" (originário da bota, pelo formato geográfico a invadir o Mediterrâneo e o Adriático), criou o VTC.
Num pano rápido. Pobres italianos e oriundos que, no Brasil, não podem soltar, sem dolo específico de ofender mas por mero desabafo, um "vaffa". E os palmeirenses, nem em partida contra a torcida vascaína.
3 comentários
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Joao Gilberto Candido
Um texto delicioso até para quem tem o coração rival ao alviverde do Walter Maierovitch e muito melhor escritor e versado do que os cometidos pelos pseudo - craques do esporte do UOL. E deu para perceber que neste caso, o autor dá razão ao Dudu em relação à Tia Leila...
Eugenio Reynaldo Palazzi
Vaffa!!!! kkkkkkkkkkkkkk
Eugenio Reynaldo Palazzi
Já não chega que vcs jogam e pisam na Constituição Brasileira, e agora pretendem trazer jurisprudências italianas para o convívio jurídico brasileiro. Vaffa!!!!!!!!!