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Gráfico sobre gasolina no mundo ignora peso da alta de preços no Brasil

28.out.2021 - Gráfico distorce peso do preço da gasolina no bolso dos brasileiros ao fazer comparação sem levar em conta poder de compra - Arte/UOL sobre Reprodução/Facebook Victório Galli
28.out.2021 - Gráfico distorce peso do preço da gasolina no bolso dos brasileiros ao fazer comparação sem levar em conta poder de compra Imagem: Arte/UOL sobre Reprodução/Facebook Victório Galli

Lucas Borges Teixeira

Do UOL, em São Paulo

29/10/2021 04h00

Um gráfico que circula nas redes sociais faz uma comparação inadequada entre os preços da gasolina em diferentes países para alegar que o combustível não estaria tão caro no Brasil. A publicação usa valores em reais sem levar em conta o quanto a gasolina pesa no bolso dos motoristas de cada lugar.

O post utiliza dados do Global Petrol Prices, site que compila preços de combustíveis pelo mundo, tendo como referência o dia 22 de outubro. Naquele dia, Hong Kong tinha a gasolina mais cara do mundo (R$ 14,40/litro) e países europeus, como Alemanha, França e Holanda, estavam com preços acima de R$ 10/litro. O Brasil aparece em 91º no ranking, com R$ 6,32/litro, abaixo da média mundial de R$ 6,75/litro.

Para o economista André Braz, coordenador do IPC (Índice de Preços do Consumidor) do FGV IBRE, o gráfico tira "uma conclusão simplista".

"Pegue os EUA. A gasolina daqui, se convertida, está a US$ 1,13. Mas eu preciso ganhar em dólar para que isso faça sentido", explica.

O economista Fernando Nogueira da Costa, professor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), diz que uma comparação internacional de preços precisa ser feita por meio da paridade do poder de compra.

"A pobreza atinge hoje 30% da população brasileira, que recebe menos de US$ 5,50 [pouco mais de R$ 30] por dia ou menos de um salário mínimo por mês. A maioria dela não consegue pagar um tanque de 50 litros de gasolina, mais de R$ 300, por mês", afirma.

Com o último aumento da gasolina, o brasileiro gasta, em média, R$ 318 para encher o tanque nos postos do país. O valor é R$ 86,90 (ou 38%) maior do que o registrado em janeiro de 2021. Este cálculo leva em conta os preços médios da gasolina comum, levantados pela ANP (Agência Nacional do Petróleo).

Gasolina pesa menos no bolso de europeus

Uma outra forma de desmontar a distorção da comparação feita pelo gráfico é fazer o cálculo de quantos litros de gasolina podem ser comprados em cada país com o salário mínimo local.

No Brasil, com o salário mínimo de R$ 1.100, é possível comprar 174 litros de gasolina, usando como base o valor do gráfico que circula nas redes (R$ 6,32 por litro). Com o preço médio do litro medido pela ANP, a R$ 6,361, esta conta fica em 172 litros. O site Global Petrol Prices também mostrava o valor de R$ 6,361 até ontem (28).

Já no Reino Unido, o litro estava em 1,428 libra (cerca de R$ 11), segundo o Global Petrol Prices, tendo como referência os preços de segunda (25). No entanto, o salário mínimo britânico é de 8,91 por hora. Em quatro semanas, com uma jornada de 40 horas semanais, este trabalhador ganharia 1.425 libras (cerca de R$ 11.000) — o bastante para comprar 997 litros de gasolina.

Na Alemanha, o salário mínimo é de 9,60 euros por hora. Considerando quatro semanas com 40 horas trabalhadas, um trabalhador receberia 1.520 euros (cerca de R$ 10.000). Com o litro da gasolina a 1,679 euro, um trabalhador com 40 horas semanais consegue comprar 905 litros de gasolina.

Na Holanda, o salário mínimo mensal de 1.701 euros (cerca de R$ 11.000) permite a compra de 865 litros de gasolina a 1,965 euro o litro.

A comparação distorcida foi compartilhada nas redes ao longo da última semana por perfis de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), entre eles a deputada federal Bia Kicis (PSL-DF).

Ontem, em live nas redes sociais, o próprio presidente citou a colocação do Brasil no ranking internacional do litro da gasolina para minimizar o avanço do preço do combustível por aqui.

Por que o preço da gasolina vem subindo tanto

O aumento da demanda por combustíveis e a menor oferta têm, de fato, empurrado os preços dos combustíveis para cima em todo o mundo, mas também há fatores específicos do Brasil que têm levado às altas de preços por aqui.

Um dos motivos é a política de reajustes da Petrobras. Desde 2016 a empresa considera o preço do petróleo no mercado internacional, em dólar, para calcular o valor cobrado pelos combustíveis nas refinarias brasileiras. Na prática, isso significa que a desvalorização do real frente à moeda americana faz os preços subirem — o dólar subiu 25% desde março do ano passado, encarecendo tudo o que tem preço definido no mercado internacional.

A gasolina vendida nos postos tem 27% de etanol, que também teve aumento de preço. Nesse caso, a alta foi provocada principalmente por condições climáticas, como seca e geadas, que diminuíram a produção de cana-de-açúcar, usada para a fabricação do etanol.

Segundo a Petrobras, considerando o preço médio levantado pela ANP na última semana, o valor pago pelos motoristas por litro de gasolina tem a seguinte composição:

  • R$ 2,18 - valor pago à Petrobras
  • R$ 1,72 - ICMS, um imposto estadual
  • R$ 1,10 - preço do etanol que é misturado à gasolina
  • R$ 0,69 - tributos federais
  • R$ 0,68 - distribuição e revenda

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