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Armas e soldados do tráfico estão no subúrbio, e UPPs precisam ir para lá, diz especialista

Veículo incendiado em Botafogo, na zona sul do Rio, no quinto consecutivo dia de ataques - Apu Gomes/ Folhapress
Veículo incendiado em Botafogo, na zona sul do Rio, no quinto consecutivo dia de ataques Imagem: Apu Gomes/ Folhapress

Guilherme Balza

Do UOL Notícias <BR> Em São Paulo

25/11/2010 10h00Atualizada em 25/11/2010 12h29

O governo de Sérgio Cabral (PMDB) adotou uma nova política de segurança no Rio de Janeiro com a intensificação de invasões armadas a morros e a implantação de UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) em favelas consideradas mais problemáticas. Na avaliação do governador, a onda de ataques que a capital fluminense enfrenta nesta semana é uma resposta do tráfico para o aumento da repressão.

Das 12 UPPs que já foram implantadas, quatro estão na zona sul, uma no centro, cinco na zona norte (em bairros perto do centro ou do Maracanã) e uma em Jacarepaguá, na zona oeste. Nenhuma unidade foi implantada em bairros do subúrbio nem nas áreas mais afetadas pela onda de violência (veja mapa abaixo com as áreas onde houve ataques).

Para a antropóloga Alba Zaluar, da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), o governo terá que iniciar a ocupação das áreas suburbanas para enfraquecer o tráfico e impedir ataques como os dessa semana.

“Os soldados (do tráfico) e as armas estão se concentrando no subúrbio. Eles (a polícia e o governo) vão ter que ocupar essas áreas também. E quando forem fazer isso, entrar no Complexo do Alemão, Maré, Juramento, Manguinhos, Rocinha, vai ser muito difícil. Nesses lugares há muita arma, muito soldado, muitas saídas”, diz Zaluar.

Já para o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL), que ganhou destaque ao combater as milícias e a atuar na defesa dos direitos humanos, as UPPs não integram um projeto de segurança pública estratégica de combate ao crime.

“As UPPs não são feitas para os moradores, e sim para proteger áreas específicas. O mapa das unidades é revelador: elas percorrem todo o caminho das favelas na zona sul (área nobre do Rio) ou estão em morros que ficam áreas estratégicas, como a zona portuária, o Maracanã ou Jacarepaguá, onde há especulação imobiliária. É um projeto para defender as regiões onde está o capital”, afirma o parlamentar.

Na avaliação do deputado, as UPPs também não cumprem o papel de polícia comunitária. “Eu concordo com o princípio de policiamento comunitário, mas a gente tem visto que as UPPs não são isso. O controle de tudo, da vida do morador, das escolhas das atividades culturais, é feito pela polícia. Há, inclusive, toque de recolher”, complementa.

O subsecretário de Planejamento de Integração Operacional da SSP, Roberto Sá, afirma que as UPPs começaram a ser instaladas em favelas localizadas em regiões nobres e centrais porque são as regiões que atingem a “economia, a imagem e os trabalhadores do Rio de Janeiro” e defende uma estratégia de ocupação em blocos regionais.

“Um projeto ousado como esse tinha que começar em algum lugar. Não estamos privilegiando ninguém. Se eu escolho a Tijuca, por exemplo, preciso de UPPs em todas as favelas da região. Não posso estar em uma e deixar as outras livres”, afirmou.

Sá nega que haja toque de recolher e diz que a maioria da população das áreas com o UPP defende as ocupações. O subsecretário disse ainda que a intenção da secretaria é montar UPPs no subúrbio, mas não revelou, por questões de segurança, em quais comunidades e regiões as unidades serão instaladas.

Ataques eram previsíveis

O deputado --o segundo mais votado no RJ nas eleições deste ano-- diz que os ataques eram previsíveis e que é preciso mudar o foco da atuação da polícia fluminense.

“Esses ataques eram algo previsível, natural. O sufocamento do tráfico e a consequente diminuição da lucratividade na venda de drogas iria gerar esse tipo de coisa. O governo deveria estar preparado e investido no setor de inteligência. Era preciso uma ação prévia, não reativa. Agora, tem que desenvolver melhor um sistema de estudo do crime”, diz.

Dentre as ações necessárias para enfrentar o crime com eficácia, Freixo destaca uma ação de combate ao tráfico nos portos do Rio e medidas para acabar com a corrupção policial.

“Qual a ação que a polícia do RJ fez com a Polícia Federal e a Marinha para que os portos fossem melhor monitorados? Nenhuma. Qual foi o nível de investimento nas corregedorias e ouvidorias para livrar as polícias dos setores corruptos? Nenhum. Não são essas medidas que vão resolver o problema agora, mas precisam ser tomadas futuramente”, afirma.

Já Zaluar diz que é necessário repensar o caráter militar da polícia do Rio. “Essa militarização da polícia, com estrutura e hierarquização semelhante à do Exército, não está ajudando o trabalho investigativo”, diz.

A antropóloga defende mais participação do governo federal no combate à entrada de drogas no país e ao contrabando de drogas e armas. “A ajuda federal já deveria ter chegado há três décadas, e as Forças Armadas também. Muita arma e droga passaram por aeroportos, portos e estradas. Há muita arma de fogo no Rio”, afirma Zaluar.

Já o subsecretário disse que a reação do tráfico era esperada, mas não da maneira como está sendo feita. “Sendo bem sincero, é óbvio que esperávamos esse tipo de reação, mas não dava para imaginar que seria assim, louca, insana, irresponsável, covarde. Mas não há informação nenhuma no mundo que indique onde isso (os ataques) vai acontecer”.

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  • Fonte: Relatório divulgado pela PMERJ