Trauma social em ação no Pinheirinho poderia ter sido evitado, diz prefeito de São José dos Campos
Ainda que reconheça ser contra a ocupação de terras, o novo prefeito de São José dos Campos, Carlinhos Almeida (PT), disse em entrevista exclusiva ao UOL que o trauma social gerado na reintegração de posse do Pinheirinho, no ano passado, poderia ter sido evitado.
Segundo o petista, que venceu as eleições municipais de 2012, rompendo a hegemonia de 16 anos do PSDB na maior cidade do Vale do Paraíba, era "plenamente possível estabelecer um cronograma para que as famílias pudessem pacificamente fazer a desocupação da área". Almeida, no entanto, atribui a falha da operação à falta de diálogo.
E mesmo um ano após da reintegração, que aconteceu no dia 22 de janeiro, de acordo com o prefeito, município e Estado continuam sendo onerados pelas consequências da ação, que ganhou visibilidade nacional e internacional por causa da violência. Só neste último ano, os cofres públicos gastaram aproximadamente R$ 9,2 milhões --R$ 1,8 milhão da cidade e R$ 7,4 milhões do Estado-- para financiar o bolsa-aluguel no valor de R$ 500 para cada uma das 1.543 famílias da comunidade.
Almeida falou ainda sobre seus planos de governo na área habitacional, bem como sobre suas estratégicas para mudar a imagem da cidade após a trágica reintegração de posse. O prefeito também disse não descartar a proposta de compra do cobiçado terreno do Pinheirinho, de propriedade da massa falida da empresa Selecta. "Nós precisamos estudar aquela área, até porque é bastante extensa, valorizada e precisa cumprir sua função social."
Leia na íntegra a entrevista:
UOL: Como você avalia a reintegração de posse do Pinheirinho? O que deu errado nessa operação? E o que faria diferente?
Carlinhos Almeida: A forma como foi feita, sem o processo de diálogo e negociação, acabou gerando um trauma que não seria necessário. Era plenamente possível estabelecer a partir do diálogo um cronograma para que as pessoas pudessem fazer pacificamente a desocupação da área ou mesmo tentar a locação dessas famílias naquele local. Da forma como foi feita, além do trauma social gerado, houve e está havendo até hoje um volume de despesas significativo tanto para a prefeitura como para o governo do Estado.
UOL: Após mais de 16 anos, o PSDB perdeu a gestão do município. E o senhor, depois de três tentativas, conseguiu vencer as eleições municipais no maior colégio eleitoral do Vale do Paraíba. Ao que o senhor atribui essa vitória? O fracasso da ação no Pinheirinho teve alguma influência?
Almeida: O que determinou essa vitória foi o esgotamento de um modelo que teve aspectos positivos, aprovados pela população, mas que também revelou falhas e limitações. Não acredito que nossa vitória nessas eleições se deva a um fato específico mas, sim, a um conjunto de fatores que acabou gerando uma vontade na população de renovação. E a população percebeu que eu faria uma renovação na cidade, sem perder as coisas positivas feitas pela gestão anterior, entre elas os programas voltados para os idosos e os investimentos viários.
UOL: O tema moradia passou a ser discutido com prioridade em São José Campos após a reintegração de posse do Pinheirinho. O que a gestão atual pretende fazer para atender as famílias sem-teto do município?
Almeida: Atualmente, a demanda por moradia no município gira em torno de 20 mil famílias, além daquelas que moram em áreas de risco, que também necessitam de atendimento. Nosso plano de governo, conforme apresentado durante a campanha eleitoral, é entregar 8.000 unidades habitacionais até o final da nossa gestão. O primeiro passo em direção a essa meta já demos, que foi mudar uma diretriz que dificultava muito a aprovação de projetos do "Minha Casa, Minha Vida". Na semana passada, inclusive, assinamos um primeiro projeto com o governador do Estado de São Paulo, que viabiliza a construção de moradias na região sul de São José dos Campos, uma área bem valorizada. Agora, iniciamos a negociação com várias empresas que tenham interesse em implantar o programa do governo federal aqui na cidade.
UOL: As famílias do Pinheirinho terão prioridades durante a entrega dessas unidades habitacionais?
Almeida: De acordo com os critérios do "Minha Casa, Minha Vida", a destinação prioritária das vagas é permitida apenas para moradores de área de risco. Portanto, os conjuntos habitacionais recém-assinados atenderão essas famílias e também àquelas que aguardam na fila cadastral do município. Mas, muitas dessas pessoas também estavam no Pinheirinho e, eventualmente, poderão ser atendidas.
Em relação ao atendimento dos moradores do Pinheirinho, existe um projeto em discussão entre a Caixa Econômica Federal, o governo do Estado e governo federal na modalidade "Minha Casa Minha Vida – Entidades", que você pode destinar as unidades para um grupo fechado. Nós temos apenas essa iniciativa para buscar uma solução e o atendimento para essa demanda específica.
UOL: Além de tentar acabar com o deficit de moradia, em quais outras frentes o senhor pretende "atacar" para ajudar o pessoal do Pinheirinho? Muita gente vivia do que plantava lá, ou de algum tipo de cooperativa que tinha lá, hoje essas pessoas não têm sequer emprego. A sua gestão pensa especificamente nos desabrigados de lá, como por exemplo, oferecer cursos de capacitação para estas pessoas? Ou o que existem são apenas os programas gerais da prefeitura?
Almeida: Todos eles podem se inscrever nos cursos de capacitação que normalmente a prefeitura oferece. E, por serem de baixa renda, certamente terão prioridade no atendimento. Nossa ideia é integrá-los aos programas que a cidade oferece, até porque são cidadãos do município.
Área é desocupada pela PM
em São José dos Campos (SP)
UOL: A reintegração de posse do Pinheirinho ficou conhecida como uma tragédia e marcou a cidade de São José dos Campos. Como mudar essa imagem?
Almeida: Realmente foi um fato que traumatizou, mas a minha perspectiva é olhar para frente. Ter uma política educacional que atenda toda a cidade e todos os tipos de demandas sociais dos moradores. O fato é que São José não tinha nenhum contrato do "Minha Casa, Minha Vida" assinado. O primeiro foi assinado na semana passada, já em minha gestão. Temos que olhar para frente e ter um política habitacional no município para atender a população de baixa renda.
UOL: Com a reintegração de posse no Pinheirinho, houve um superaquecimento no setor imobiliário e o valor dos aluguéis na cidade subiram. Muitos dos moradores dizem que o bolsa-aluguel não é suficiente. Há perspectiva de aumento do valor?
Almeida: Ainda que com a parceria da Prefeitura de São José dos Campos, o projeto é uma iniciativa do governo do Estado, e depende dele um possível aumento dos recursos. Mas, ao que eu sei, não há nada neste sentido em discussão.
UOL: A Prefeitura de São José dos Campos pretende comprar o terreno do Pinheirinho, que até fevereiro de 2012, tinha uma dívida com o município na ordem de R$ 14,6 milhões?
Almeida: Não há nenhum estudo nesse sentido porque é uma área muito valorizada e o zoneamento não permite a construção de moradias no local. Nossas prioridades de áreas para habitação estão em outras regiões da cidade. Precisamos estudar aquela área, até porque é bastante extensa, valorizada e precisa cumprir sua função social, seja com empreendimentos industriais ou comerciais. Se for utilizada para a construção de moradias, será preciso a alteração do zoneamento da área. No momento, no entanto, não tem nenhum projeto nesse sentido.
UOL: Durante a reintegração de posse, um homem foi baleado. E a própria prefeitura na época reconheceu que a bala que o feriu partiu de um policial da GCM. O que o senhor pretende fazer com o caso, que ainda segue na justiça?
Almeida: Entendo que não cabe à prefeitura fazer o acompanhamento desses casos. O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) tem acompanhado os processos relacionados à reintegração de posse do Pinheirinho, assim como o governo do Estado, que têm competência para apurar todos os casos de irregularidades. A Segurança Pública de São Paulo tem todas as condições de avaliar e tomar as devidas providências.
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