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Delegada espera concluir em 10 dias inquérito sobre morte de adolescente guarani-kaiowá no MS

Alex Rodrigues

Da Agência Brasil, em Brasília

20/02/2013 18h25

Responsável por apurar as circunstâncias da morte de um adolescente indígena no último sábado (16), em Caarapó (MS), a delegada de polícia Magali Leite Cordeiro espera concluir o inquérito policial em no máximo dez dias. Oficialmente, o prazo para a conclusão das investigações é 30 dias, prorrogáveis por mais 30 dias.

Segundo a delegada, embora seja um “crime de grande repercussão”, a Polícia Civil assumiu a investigação por se tratar de um crime comum, doloso (com intenção de matar) ocorrido no interior de uma propriedade particular. Caso as investigações apontem para a possibilidade de o assassinato ser resultante de um conflito por terras entre índios e fazendeiros, a Polícia Federal (PF) poderá ser acionada. Esta manhã, a polícia apreendeu uma espingarda calibre 22 na sede da fazenda. A legalidade da arma ainda está sendo apurada.
 
Ontem (19), o fazendeiro Orlandino Carneiro Gonçalves, de 61 anos, confessou ser o autor dos disparos que mataram o adolescente Denílson Barbosa. Dono da Fazenda Sardinha, vizinha à Aldeia Guarani-Kaiowá Tey´ikue, onde Denílson vivia, Gonçalves se apresentou espontaneamente à polícia e foi solto após prestar depoimento e assumir a autoria do crime. Segundo o delegado regional, Antônio Carlos Videira, a hipótese de a Polícia Civil pedir a prisão preventiva ou temporária do fazendeiro ainda não foi descartada.
 
Além de Gonçalves, também foram ouvidos um funcionário da fazenda e um arrendatário de parte da propriedade. A delegada disse à Agência Brasil que outras testemunhas foram convocadas para prestar depoimentos. Entre elas, os policiais militares que atenderam à ocorrência e índios que moram na aldeia. Neste momento, a delegada está ouvindo o pai e os dois jovens que estavam com Barbosa quando ele foi morto.
 
Por causa do crime, o ambiente é tenso na aldeia, agravada pela “situação de vulnerabilidade” em que vive os índios. Apesar de acompanhada por alguns líderes indígenas e um representante da Fundação Nacional do Índio (Funai), a delegada foi recebida com desconfiança. “Minha grande dificuldade é conscientizá-los de que eles são as vítimas e que eu estou lá para fazer meu trabalho, que é apurar as circunstâncias do crime e apontar os autores. Para isso, tenho que ouvir as várias versões. Devido à situação de vulnerabilidade, eles não conseguem confiar em ninguém”, disse a policial.
 
Mas, para o antropólogo e líder guarani-kaiowá Tonico Benites, tudo não passou de um mal-entendido, embora os índios de fato cobrem que a PF acompanhe a investigação. “Até ontem não estava claro quem ia investigar o caso. Não há nada contra a Polícia Civil, embora a comunidade queira também a presença de representantes da Polícia Federal. O importante é que tudo seja apurado com rigor e rapidez”, declarou Benites à Agência Brasil.
 
Em seu depoimento, o fazendeiro disse ainda que não tinha a intenção de atingir o adolescente. Segundo a delegada, Gonçalves sustenta que estava sozinho em casa quando, por volta das 20 horas, ouviu os cachorros latindo e correndo na direção de um açude usado como criadouro de peixes, no interior da fazenda. O fazendeiro disse que foi até o local, viu vultos e atirou na direção deles. Ao chegar perto se deparou com um corpo caído. Foi quando se deu conta de que havia baleado uma pessoa.
 
O adolescente, segundo o fazendeiro, ainda estava vivo. Gonçalves garante ter colocado Barbosa na caçamba de sua caminhonete com a intenção de levá-lo ao hospital de Caarapó. Ao chegar próximo ao acesso à estrada para a cidade, contudo, avistou uma aglomeração que imaginou ser de índios à procura do jovem. Com medo de ser agredido, retornou e deixou o jovem ferido à margem da estrada, supostamente no mesmo local onde o corpo foi encontrado na manhã seguinte. A Agência Brasil tentou falar com a advogada de Gonçalves, mas não conseguiu localizá-la.
 
A versão do irmão de Barbosa, de 11 anos, e do cunhado, de 20 anos, é diferente. Segundo eles, os três saíram para pescar no final da tarde de sábado (16) e planejavam ir a um córrego cuja nascente fica no interior da terra indígena que cruza algumas fazendas. Eles disseram que ao entrar na fazenda, separada da aldeia por uma estrada, e se aproximar do criadouro, foram abordados por três homens armados, que dispararam. Na fuga, Barbosa ficou preso em uma cerca de arame farpado, foi alcançado pelos pistoleiros e agredido.
 
O coordenador substituto do escritório da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Dourados, Vander Aparecido Nishijima, esteve ontem (19) na reserva e ouviu a mesma versão dos dois jovens, que chegaram a identificar os três homens pelos apelidos, um deles conhecido como Paraguaio.
 
Segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), desde a criação do território indígena, em 1924, os índios são obrigados a pescar fora de suas terras, porque que não há peixes nas nascentes dos córregos existentes no interior da reserva. Segundo o Cimi, isso tem provocado problemas e causado conflitos recorrentes. Cerca de 5 mil índios vivem na Terra Indígena de Caarapó, que mede cerca de 3,5 mil hectares (1 hectare corresponde a 10 mil metros quadrados, aproximadamente as medidas oficiais de um campo de futebol).