PMs contaram que tiveram de ocultar provas no caso Amarildo, diz promotora
A promotora Carmen Eliza de Carvalho, do MP (Ministério Público), afirmou em entrevista ao programa "Bom Dia Rio", da Rede Globo, que o major Edson dos Santos, comandante da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) da Rocinha, na zona sul do Rio de Janeiro, por ocasião do desaparecimento do assistente de pedreiro Amarildo de Souza, 43, realizou reuniões com os policiais que estavam no local no dia da morte para combinar os depoimentos e pediu a alguns deles que apagassem as provas. Carmen é um dos responsáveis pela denúncia de mais 15 PMs da UPP, acusados de participar da tortura de Amarildo.
Segundo o inquérito da Polícia Civil e a denúncia do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), o morador da favela da Rocinha foi torturado e morto por PMs da UPP da comunidade, no último dia 14 de julho. O corpo de Amarildo ainda não foi encontrado.
De acordo com uma das policiais militares que depôs ao Gaeco, foi feita uma reunião com a presença de um advogado, na qual os PMs fizeram uma espécie de pré-depoimento. “O tom era esse de orientação. Entenda-se determinação”, afirmou a promotora. “É como se fosse uma lavagem cerebral.”
A policial Thais Rodrigues Gusmão, uma das denunciadas, contou em depoimento que o major a mandou ir até o Parque Ecológico da Rocinha, que fica ao lado da UPP, para apagar as luzes da área. A PM contou que viu mais três colegas à paisana no local.
A soldado, que é acusada de tortura e ocultação de cadáver, apontou o tenente Luis Felipe de Medeiros, então subcomandante da UPP, como um dos envolvidos no crime. Medeiros e Santos são acusados de tortura, ocultação de cadáver, formação de quadrilha e fraude processual.
De acordo com outro PM, no mesmo horário algo que se assemelhava a um corpo foi retirado por um vão no telhado da UPP. O MP informou que está investigando a possível participação de policiais militares do Bope (Batalhão de Operações Especiais), a tropa de elite da PM, na ocultação do cadáver do ajudante de pedreiro.
Carmen contou ao "Bom Dia Rio" que as policiais demoraram para contar o que aconteceu na noite da morte de Amarildo porque tinham medo de sofrer represálias. “O sentimento era uniforme delas. 'Se estão fazendo isso com aquela pessoa, se a gente for fazer alguma coisa, o que vão fazer com a gente? Porque lá fora temos vários homens armados, todos superiores hierárquicos’”, afirmou a promotora. “No final elas desabaram. Choraram mesmo. E todas falaram a mesma coisa: ‘Hoje, depois de muitos meses, eu vou conseguir dormir.’”
Ao todo, 25 policiais da UPP da Rocinha foram denunciados por tortura seguida de morte, 17 por ocultação de cadáver, 13 por formação de quadrilha e quatro por fraude processual. Entre os denunciados, 13 estão presos --entre eles o major Edson Santos, ex-comandante da UPP, e o tenente Luiz Felipe de Medeiros, ex-subcomandante da unidade--, e 12 vão responder em liberdade.
Para a Polícia Civil, Amarildo foi torturado e morto depois de ter sido levado por policiais para a sede da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) na comunidade, um dia depois de a PM realizar a operação Paz Armada, que investiga o tráfico de drogas na Rocinha.
BLOG DO MÁRIO MAGALHÃES
"A coragem que tempera o inquérito do caso Amarildo é inversamente proporcional ao destaque diminuto que as conclusões policiais receberam nos meios de comunicação: parece que se trata apenas de mais uma peça produzida pela Polícia Civil do Rio de Janeiro"
De acordo com o delegado Rivaldo Barbosa, que coordenou a investigação, as pessoas que se disseram vítimas de tortura de policiais da UPP da Rocinha foram ouvidas de março a julho deste ano para revelar detalhes do esquema do tráfico de drogas no local.
Todas as 22 testemunhas que narraram mecanismos de tortura apontam homens comandados pelo major Edson Santos (ex-comandante da UPP) como agressores. Pela linha de investigação da polícia, Amarildo seria a 23ª vítima do grupo - e a única que foi morta.
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